O Snr. Julio Bruno, além de comerciante, é um inteligente observador dos nossos problemas sociais. A ele devemos o título que encima esta coluna¹. E representa ele uma verdade? Em que sentido devemos tomar a afirmativa que nosso município é uma alteração das leis estabelecidas para assim se transformar em obra sobrenatural? Como comerciante, o autor da frase, certamente quiz dizer que o meio é um milagre de ordem economica, e, talvez, tenha aprendido com Voltaire, que milagre, na acepção primitiva do termo, quer dizer “coisa admiravel”. Sim, é coisa admiravel a nossa expansão economica, o nosso surto de progresso, a grandeza dos numeros de nossa produção. Admiravel não pelo que tenham de miraculosos, quando comparados à grandeza paulista, à exhuberância argentina ou à grandiosidade americana. Admiravel pelo herculeo esforço que representam, síntese de muita coragem, padrão de trabalho fecundo e de inteligencia creadora.
No Brasil, ha exemplos, na historia de nucleos de povoação que cresceram e se tornaram grandes, perdidos na imensidão dos sertões virgens.
Paracatú, Goias, Cuiabá, aí estão para provar o quanto pode a vontade humana. A riqueza destes pilares da nacionalidade e a sua gloria, vinham dos filões de ouro que se descobriam nos regatos revolvidos. No Brasil, porem, poucos são os exemplos de cidades e campos que cresceram, nos sertões, sem vias de transporte adequadas, e cuja riqueza provinha do cultivo da terra. Patos e a zona que a circunda é um destes poucos exemplos. E’, pois, um milagre, uma coisa admiravel. Mas, o milagre nem sempre se repete, principalmente os de ordem economica. Há forças que podem combate-lo e esconjuros que podem destrui-lo.
O nosso jornal denuncia, à opinião publica, esta força, e concita os soldados do trabalho a combate-la. Qual é ela, onde age e como se insinua para destruir a obra de que tanto nós nos vangloriamos?
Vejamos.
No Brasil, quasi todo o mundo partidario das teorias liberais em materia de economia. A lei da oferta e da procura é ainda a suprema lei que dirige as relações comerciais. O produto é mais caro quando tem maior procura, cái quando não encontra mercado. Mas o que já se não tolera, hoje, é que haja entraves a esta mesma lei.
O que não se tolera, o que os codigos punem, é o comercio deshonesto que procura criar obstaculos à circulação normal da produção. O que a lavoura e o comercio honesto de Patos não podem tolerar são as listas para forçar a baixa da mercadoria, quando as circunstancias anormais do país, abrem possibilidades para que estas listas andem de mão em mão. O que não se pode tolerar é que os açambarcadores aproveitem da ocasião para obter lucros fantasticos em prejuizo da coletividade, hoje, postulado aceito e reconhecido em todas as legislações, frutos das vicissitudes por que passou o mundo no ultimo quartel de seculo.
O que se não poderá mais permitir é que os valos cavados pelo suor dos lavradores, para se defenderem da voracidade do explorador, sejam sempre cheios pelo dinheiro dos que compram as consciencias, e estes lhe invadam a pastagem risonha e se engordem, na comparação feliz de outro comerciante patense.
Estas são as forças que querem destruir o Municipio Milagre, e as quais denunciamos à opinião publica, e principalmente à lavoura e ao comercio que tambem vive e floresce na dependência comum do que a terra lhes dá. Denunciando, conclamamos todos ao combate.
* 1: O título original é “Município Milagre”.
* Fonte: Texto publicado na edição de 12 de julho de 1942 do jornal Folha de Patos, do arquivo da Fundação Casa da Cultura do Milho, via Marialda Coury.
* Foto: Do arquivo do MuP, publicada em 08/02/2019 com o título “Rua Major Gote na Década de 1940”.