DEIXAREI SAUDADE – 56

Postado por e arquivado em 2018, DÉCADA DE 2010, FOTOS.

Houve uma época, se não me engano no finalzinho da década de 1960, era dia sim e outro também, era de manhã, de tarde e de noite, era a todo o momento e lá estava por completo a minha estrutura ouvindo esse refrão de uma música: É a volta do cipó de aroeira no lombo de quem mandou dar. Nunca entendi porque tanto se ouvia essa música dentro de mim, e porque com tanta insistência. Tinha outra que começava assim: Quanto mais eu ando mais vejo estrada. Aí o tempo passou e eu nem percebi que nunca mais ouvi essas músicas e nem o motivo que pararam de ouvi-las. Ficou o vácuo da lembrança, ou tudo não passou de um grito perdido no vácuo. E num vácuo acabei me transmutando, ou melhor dizendo, fui transmutada num vácuo, no vazio da dimensão dos meus pensamentos que antes eram alheios. Tudo passou tão célere que também nem me dei conta de que me acabei sozinha, agora insuflada pela dimensão de meus pensamentos íntimos a respeito da eternidade. Será soberba imaginar-se eterna, crer numa alma imortal isenta das quimeras humanas? Ora, vão perguntar, onde já se viu um imóvel imaginar-se eterno com as palavras perdidas no tempo subjugadas por falsas verdades?

Lá se foi o último. Esse é o refrão que atualmente domina as minhas entranhas. Antes apinhada de almas, agora… lá se foi o último, o derradeiro que, após trancar o portão, olhou-me como se eu não existisse. Sabe-se lá para onde foi, pois nunca mais o vi. Dizem que não se pode construir prédios no Bairro Sobradinho, onde fui erguida e agora desservida¹. Isso não me cheira bem, pois estou a poucos metros da Avenida Paracatu e pelas redondezas os prédios nascem que nem moscas. Leis, ora Leis, estas foram criadas para serem burladas, pelo menos por aqui é assim. E por isso, já acostumada com as ausências, sinto minha conformação manipulada por sensações de mudanças estruturais. Prefiro rir de mim mesma como a mais perfeita das idiotas do que conformar-me com a solidão. É o mesmo que blasfemar com o coração vazio, odiar a chuva, o sol, a neblina e o luar. A minha aparência é um agudo sinal de socorro. Ninguém me ouve. E de tanto não ser ouvida, passei a sentir uma vontade infinita de ir embora, de ser entulho, de ser mais nada. Minha caminhada já registrada nos anais da História de Patos de Minas está chegando ao fim, a catálise final da ausência, rumo a outra dimensão. E deixarei saudade!

* 1: Avenida Marechal Deodoro, quase esquina com Avenida Paracatu.

* Texto e foto (20/06/2018): Eitel Teixeira Dannemann.

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