TITA E O FUTURO

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TEXTO: RAFAEL GOMES DE ALMEIDA (1977)

Eu não sei bem para quem a gente está escrevendo este comentário. É bem possível que seja o meu ego a falar comigo mesmo. Se for assim, eu vou me sentir mais frustrado, pois pretendo que meu recado atinja a uma grande parte das pessoas que o lerem.

Na vida que sempre se enfrenta em nossa cidade, eu gostaria que os leitores respondessem rapidamente, à avalanche de perguntas que me vêm à cabeça: quem é a pessoa de Patos que mais frequentemente participou de nossas alegrias, levando, na sua humildade, um gosto mais feliz a quem já estava tão feliz? Se era convidada, eu não sei!

Quem é a pessoa de Patos que, mais frequentemente, conviveu com a dor de nossa gente, tentando levar um pouco de consolo nas horas mais aflitas? Nestas horas não existem convites?

Quem é a pessoa de Patos que indo nas festas, levava um bornal enorme e comia muito e levava muito para repartir as suas migalhas com outras pessoas que nem migalhas possuíam? E como a gente falava do tanto que ela comia e do tanto que ela carregava!

Pois muito bem, esta pessoa que tendo tão pouco nos deu tanto e ainda encontrou meio de dividir as suas sobras com outros que nem sobras tinham, se chama Izaura Elisa dos Santos! É, eu acho que o nome é este mesmo! Em resumo, é a TITA!

A Tita de tantas festas, de tantas dores, carregando agora no seu fim de vida a mesma cara boa de sempre. Ignorada, é verdade, mas não reclama. Na Vila Dona Inhá, assistida por suas colegas de conferência, a Tita espera que chegue a sua vez de descansar.

Eu tenho certeza de que ela será nome de rua. É possível que venham algumas flores para ornamentar o seu caixão. É certo que no dia de finados outras serão colocadas em sua memória.

Mas até quando nós iremos nos furtar de levar um pouco de carinho a quem ainda tem vida? Até quando nós iremos nos omitir quando vemos alguém sofrendo e parece não sofrer porque não reclama?

Não sei quem sofre mais: se quem comete uma injustiça ou se quem é injustiçado!

Não sei quem mais se afirma: se quem dá um prato de comida ou se quem suja o prato em que comeu!

Tudo isto eu escrevo, porque, para mim a Tita é um retrato vivo de nossa terra. Ela é hoje a cidade do amanhã, se as coisas não tomarem um outro rumo. É isto mesmo! Não pensem que é imagem de fantasia, porque é fácil de perceber.

Hoje, Patos tem fosfato para dar para o Brasil inteiro. Somos notícia no mundo. É uma festa contínua, mas nada vem de positivo para nós. O governador nos defende. O ministro não nos deixa ser atacado. Os empresários contam com nossas matérias primas para o soerguimento do Brasil.

Mas acontece que o tempo vai passar. A matéria prima vai se acabar e, de sobra, nós teremos as crateras de nossas riquezas.

Quando a cidade estiver empobrecida, talvez a gente consiga uma cidade amiga que se lembre de Patos de Minas e nossa cidade será então nome de rua, como nomes são tantas outras cidades.

É preciso que nós acordemos antes que seja tarde demais. É preciso que saibamos colocar a nossa cidade acima de nossos próprios interesses.

É preciso que reconheçamos que a Tita encontrou uma Vila Dona Inhá, mas a Vila é pequena e pode não caber os que sobrarem do futuro que nos espera. E se de todo não for possível um lugar aqui, quem sabe a gente poderá encontrar na baixada santista um recanto para curtir o nosso fim de vida.

Desculpem, mas espero que esse recado somente eu o entenda, para ter certeza de que o resto é problema meu e fruto de minha negra fantasia.

* Fonte: Texto publicado com o título “Flores Para os Vivos” na coluna Da Minha Fazenda Grande na edição de 02 de julho de 1977 do jornal Correio de Patos, do arquivo de Altamir Fernandes.

* Foto: Excerto de “Tita e seus Amigos”, publicada em 13 de junho de 2014.

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