TEXTO: EUPHRASIO JOSÉ RODRIGUES (1914)
Acabo de assistir de cima de meu mirante discussão pela imprensa havida entre Simplicio Feijão, patrocinando a causa do Revdo. Conego Getulio e o Revdo. Pe. A. Collaço. Fiquei triste e muito triste como uma campina sem flores, porque quando dous sacerdotes se desestimam, Deus chora nos céos.
Padre Collaço, disia o vosso eminente patricio José Estevam “que ao despotismo da morte, seguia-se a anarchia da dor”. Ao despotismo do artigo de Simplicio Feijão seguiu-se a anarchia da resposta fez V. Revdm. Muito bem em baptisal-o de feijoada; o artigo de Simplicio é acrimonioso, escripto por um homem habituado ao manejo da penna, tral-a sempre retinta nas côres facetas de uma veia sarcastica; isto vê-se, isto sente-se. Simplicio fez mal, quando não syndicou si V. Revdm. veio espontaneamente para este nosso charo Brazil, ou si foi forçado a procurar asylo nestas plagas, em ambos os casos, isto faz parte da vida particular de V. Revdm. com a qual Simplicio nada tem a ver, tanto mais que sou adepto da emigração, pincipalmente quando ella representa o reflexo de uma população que transborda.
Simplicio Feijão chamou V. Revdm. de ingrato, e neste ponto ainda foi infeliz, porque V. Revdm. não pode dever gratidão ao povo que doutrina, seria o mundo as avessas; o povo é que deve ser grato a V. Revdm. porque está gastando em S. Rita em pról dos que soffrem até a seiva da sua vida.
Pe. Collaço, eu sou um homem velho e rustico, pouco habituado a escrever na imprensa, não tenho a linguagem correcta e precisa de V. Revdm., permitta, porém, diser que houve de sua parte excesso de justa defesa como disem os juristas.
Examinemos agora o fundo da questão; ambos os contendores, invocam o testemunho dos velhos, a cerca das divisas das parochias¹; disse o Pe. Collaço que a divisa é o Ribeirão da Matta, e que só por vontade do Cel. Antonio Dias é o espigão.
Agora, vou explicar ao publico o que se deu: desafectos do Conego Getulio disseram ao Revd. Pe. Collaço que a divisa do districto era o Ribeirão da Matta, disseram a verdade, mas ou porque não sabiam ou machiavelicamente calaram a decisão de D. Claudio; o Pe. Collaço queixou-se ao Exmo. Bispo Diocesano, este por sua vez mandou buscar em Bello Horisonte a lei das divisas d’aquelle tempo e encontrou o Ribeirão da Matta, julga contra o direito estabelecido. O Pe. Collaço encontrando apoio no Bispo, julga que é este o direito; cabi o charivari medonho que surgiu em torno desta questão.
Não estou aqui defendendo nem accusando ninguem, simplismente aprecio os factos que se desenrolam, e procuro dar-lhes a explicação natural.
Tudo passa neste mundo, ha de passar tambem esta dissenção sacerdotal; o que não passa é o oceano das verdades eternas, como aquellas que sahiram límpidas e perfeitissimas dos labios de Christo.
O Abelhudo².
* 1: Leia “Conflito Entre Paróquias em 1913”.
* 2: Pseudônimo do Dr. Euphrasio José Rodrigues.
* Fonte: Texto publicado na coluna De Palanque da edição de 08 de fevereiro de 1914 do jornal O Commercio, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto: Naomordamaca.com, meramente ilustrativa.