Certo dia, o filho do Gorila, um garoto vivo e bastante idealizador, tanto pediu ao pai, até que conseguiu convencê-lo para pescar nas Três Marias. O Gorila, que nunca pegara numa vara de anzol e muito menos matara mosquitos na beira de rios, como um ótimo pai, resolveu atender o menino, marcando uma pescaria para o dia 21 de abril.
Lá na Casa Capivara compraram os apetrechos adequados e pela madrugada do feriado, saíram sonhando com os peixes daquela represa famosa. Procuraram um lugar que julgaram promissor para a prática do encantador desporto. O nosso conhecido açougueiro de muito bom humor foi tirando os anzóis, chumbada, linha etc. e apresentou-os ao menino dizendo:
– Pode começar, meu filho. Vamos ver o tamanho deste piaus daqui.
O pescador estreante, inteligente e vivo, olhou fixamente para o pai e perguntou com ironia:
– Cadê a isca? O que foi que o senhor trouxe, milho cozido, minhoca, massa ou carne?
O Gorila levou o maior choque com sua distração e não tendo coisa melhor a fazer saiu com esta:
– Só o brilho do anzol não atrai o bicho não?
Passados os momentos de desilusão foram caminhando pela margem do grande lago lentamente. Logo depois avistaram um pescador atirando seu molinete às águas. Era o Dr. Antônio Paulo Ximenes de Morais, que descansava a cuca durante aquele feriado, procurando desligar-se por algumas horas das queixas e aflições de seus pacientes. Com esse encontro o Gorila criou alma nova, explicando seu fracasso e pedindo qualquer isca para se pescar. O nosso médico com um ar irônico caiu em cima do distraído:
– Onde já se viu andar esta distância e não trazer iscas?
Mas como todo pescador não deixa um colega na mão, tirou milho cozido, massa de trigo e queijo de sua sacola e ofereceu gentilmente. O garoto aceitou tudo de bom grado e iniciou a pescaria. Por longo tempo as chumbadas levantavam água e ninguém apanhou nada. O menino teve uma ideia de pescador de primeira viagem. Pediu ao pai um pedaço daquela linguiça fabricada lá no seu açougue. O Gorila não entendendo o plano ousado, repreendeu:
– Ainda não tá na hora de se comer, meu filho!
O menino, porém, nada disse e cortando um pedaço da referida, iscou o anzol e atirou-o bem longe. O Dr. Ximenes, observando a manobra deu uma gargalhada gostosa, dizendo:
– Essa pra mim é nova!
Não se passaram 5 minutos e um bruto dourado abocanhou o anzol, correndo velozmente. O pescador deu um puxão forte e lançou o reluzente sobre a margem. O Gorila não resistiu e gritou de modéstia:
– Esse garotão é meu orgulho!
Foram ainda pegos mais cinco dourados com o mesmo processo. O Dr. Ximenes foi guardando o molinete e se levantando para encerrar o esporte, quando o menino todo convencido indaga:
– Já vai, doutor? Se quiser empresto-lhe um pedaço da minha isca que o peixe vem.
O conhecido médico, embora muito educado, não resistiu o abuso, respondendo:
– Não vou ficar aqui mais tempo para receber lições de um neófito, tá?… e se mandou!
* Fonte: Texto publicado na coluna Todo Pescador Mente com a observação “Esta é dedicada ao Tinel” da edição de 18 de julho de 1980 do jornal Boletim Informativo, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto: Muraljoia.com.