Talvez a maioria da população de Patos de Minas não saiba, mas a Festa do Milho de 1977 correu sério risco de não se realizar. O saudoso jornalista Oswaldo Amorim escreveu um texto a respeito, com o título acima, publicado no jornal Folha Diocesana em 24 de fevereiro do mesmo ano. Este mesmo texto está presente em seu livro Queixa ao Bispo, editado postumamente em 2002, sob coordenação de Oswaldo Guimarães Amorim Filho e Oliveira Mello:
A Festa do Milho é o nosso circo, no sentido que os antigos romanos emprestavam ao termo. Ou seja: é a nossa grande diversão. Era inevitável, portanto, que a notícia sobre o seu cancelamento este ano gerasse geral desagrado em Patos de Minas. Ou principalmente em Patos de Minas, já que ela sensibiliza também várias cidades em volta, além de muita gente de muitos pontos. Fora de Patos de Minas, sensibiliza sobretudo os patenses ausentes que transformaram a Festa num grande e alegre ponto de encontro anual.
Adiar a Festa do Milho, por tudo, é desmanchar uma alegre expectativa de uma grande multidão por uma diversão certa e cada vez melhor. É frustrar a expectativa de todos que desejam “curtir” a Festa e suas variadas atrações.
O pior é que a Festa não seria suspensa apenas este ano. A proposta do Sindicato Rural é tornar a Festa bianual. O objetivo é poupar os promotores, de quem a Festa toma grande tempo todos os anos, e, com o espaçamento, permitir “uma Festa mais arrojada”.
Sou francamente pela continuidade da Festa, por razões que exporei adiante e que expliquei outro dia pela Rádio Clube de Patos, no programa “Tempo Novo”. Mas não posso deixar de entender as razões da magnífica turma do Sindicato Rural, liderada por Pedro Maciel, e ajudada sempre, por esse locomotiva chamado Zé Ribeiro.
Em verdade, a realização da Festa representa uma carga pesada para os rapazes do Sindicato Rural. Aliás, cada vez mais pesada, pelo crescimento da Festa – cuja estrutura organizacional permanece praticamente a mesma há vários anos. Quando o bom da festa não é fazê-la, mas desfrutá-la, durante vários dias eles se dedicam com afinco à realização da Festa, com evidente prejuízo para as suas atividades particulares.
E como é sabido, ninguém tem a contrapartida de uma compensação financeira: o trabalho é inteiramente de graça. Nem mesmo o prazer de desfrutá-la eles têm, por causa das múltiplas e constantes solicitações. A única compensação, para cada um deles, é saber que a Festa é um pouco sua.
Mas a Festa não pode ser interrompida. Primeiro para não tirar a Patos de Minas e arredores a sua grande diversão. Depois, para não permitir que outras cidades passem a promovê-la nos anos vagos, roubando-nos um privilégio até agora só nosso. E aqui é bom lembrar que quando a Festa do Milho ganhou status de Festa Nacional, isto se deu em caráter móvel. Não sei se formalmente houve mudança, mas, na prática, a Festa Nacional do Milho tornou-se permanente. Promovê-la ano sim, ano não, mo parece um risco. Um risco que não podemos correr.
Por outro lado, há o problema da turma do Sindicato, que tem sido o grande sustentáculo da Festa, e cujas razões é preciso respeitar. Então a situação se complica: a Festa precisa continuar e, ao mesmo tempo, a turma do Sindicato precisa parar.
Felizmente, creio que o impasse pode ser resolvido sem prejuízos para nenhuma das partes. A saída, a meu ver, é criar um novo grupo para promover a Festa do Milho nos anos intermediários. Assim, nem morreria o cabrito nem a onça ficaria com fome. A Festa continuaria sendo realizada anualmente e, ao mesmo tempo, o Sindicato só teria a responsabilidade de promovê-la de dois em dois anos, como pleiteia, com carradas de razão.
Para facilitar as coisas, pelo menos nos primeiros tempos, nos anos intermediários, a Festa poderia ser mais simples, com a redução de alguns itens. Por exemplo: a eleição da Rainha do Milho, que passaria também a ser bianual. Em consequência, teria seu mandato espichado para dois anos e voltaria a desfilar no ano seguinte, com as Princesas e todo o séquito, nos mesmos carros alegóricos. (Se for possível desmontá-los e guardá-los para uma segunda montagem). Então, pelo menos no início, como ressalvei, teríamos uma festa de arromba num ano e, no outro, uma festa mais simples. Ou, se preferem, menos arrojada.
Mas creio que a criação de uma nova turma para promover a Festa do Milho acabará gerando uma saudável emulação, com positivos reflexos para a Festa. Festa que, para seguir melhorando, precisa mesmo apelar para a imaginação criadora de seus responsáveis. Com dois grupos promotores, isso certamente ficará mais fácil.
* Foto: Cartaz da Festa do Milho de 1977, do arquivo da Fundação Casa da Cultura do Milho.