Filho de Tancredo Gonçalves da Silveira e Natalíbia Augusta da Silveira, Artur Gonçalves da Silveira nasceu em João Pinheiro, a 17 de setembro de 1929. Casado com Berenice Gonçalves de Souza Silveira, desde 1954, tem dois filhos: Dra. Lênia Mara de Souza Silveira Borges (Médica) casada com o Dr. Francisco Eustáquio Porto Borges (Médico Veterinário) e Ricardo de Souza Silveira (estudante de Engenharia Elétrica). Tem uma netinha. Veio para Patos com oito anos de idade e fez, o curso primário, segundo ele, na “Faculdade de D. Madalena e dois anos do curso ginasial (um aqui, outro em Peçanha). Começou sua luta muito cedo, como engraxate aliás, “como era o início de todo menino de família de menores posses naquela época”, diz ele. No início de 1945, conseguiu um emprego no Departamento de Correios e Telégrafos e no final do mesmo ano, ingressou no antigo Banco da Lavoura de Minas Gerais, onde trabalhou até 1950. Saindo do banco no final daquele ano, foi cuidar da fazenda de seu pai, lá ficando até 1953, quando voltou para a cidade adquirindo a torrefação de Café Cristal, no dia 3 de maio de 1953.
Como foi o início da torrefação de café em Patos?
Tenho quase certeza que quem primeiro torrou café aqui em Patos foi o pai de vocês, Sr. João Pacheco Filho. Vocês não sabem disto. Depois, em 1946 ou 47 o Sr. Geraldo Ferreira da Silva começou a torrar café, já com o nome de “Café Cristal”, ali na Rua Olegário Maciel, onde hoje está o prédio da Casa das Representações, secção de máquinas de escritório. Posteriormente, já mais desenvolvida, a torrefação foi transferida para a Rua José de Santana, 1127, esquina com Rua Joaquim das Chagas, na antiga descida para o Cemitério. E foi lá, que comecei em 3 de maio de 1953.
O que era o “Café Cristal”, naquela época?
Não adquiri o imóvel, mas apenas as máquinas e a patente. Quando o recebi vendíamos 15 sacos de 60 quilos de café por mês.
Quais as máquinas que compunham a torrefação?
Para a época, as máquinas eram muito boas. Havia um torrador que torrava 40 quilos de café por hora. Para vocês terem uma idéia, o que temos aqui hoje, torra 1.440 quilos por hora.
Quando você se transferiu aqui para a Rua Olegário Maciel com Padre Brito?
Em 1954, transferimos para este local, para um pequeno barracão de 50 metros quadrados e aos poucos, de acordo com as possibilidades, fomos ampliando até chegarmos às atuais instalações.
E hoje, como é o maquinário?
O torrador que possuímos atualmente, é o que há de melhor; é a última palavra no assunto, sendo, todo automático. Hoje, várias torrefações brasileiras possuem máquinas semelhantes a esta, mas a nossa foi a quarta a entrar no Brasil, em 1972. Atualmente esta máquina já é fabricada no Brasil e inclusive, possuímos também uma delas.
Qual a melhor época do “Café Cristal”?
Chegamos a vender 2.200 sacos de 60 quilos por mês, constituindo-nos na quarta torrefação do Estado de Minas. Depois com a alta do café e a saída do IBC, com o baixo poder aquisitivo de nosso povo, as vendas foram caindo, não só aqui, como em todo o Brasil, com excessão das capitais.
Atualmente, quantos sacos de café, vocês estão torrando por mês?
Cerca de 600.
Você possui também uma torrefação em Paracatu?
Adquirimos lá uma indústria muito pequena – o Café “Catu” – que compramos e transformamos em uma industriazinha até respeitável, torrando aproximadamente 80 sacos de café por mês, mas como a administração estava se tornando muito difícil, acabamos de vendê-la.
Qual é a região de consumo do “Café Cristal”
Mais para o norte de Patos, indo até Unaí, Brasilândia, Bonfinópolis e até São Gotardo, ao sul. É exatamente a região de influência de Patos, depois de Brasília, inclusive Paracatu, onde o Café Cristal é o “dono da praça”, apesar do Café Catu.
Quantas pessoas o Café Cristal emprega?
Dezesseis.
Fale-nos, por favor, de uma homenagem que você recebeu há alguns anos, como grande contribuinte do ICM?
Não foi totalmente isto. A Associação Comercial homenageia um empresário de destaque todo ano, como faz até hoje e eu fui um dos primeiros a receber este título. Gerou muito comentário, porque no ato da entrega do título, em Belo Horizonte, eramos uns quinze homenageados. O Governador do Estado era Israel Pinheiro e o Ministro da Indústria e Comércio é que iria me entregar o troféu. Naquela época eramos o maior contribuinte de ICM em Patos e quando o Governador soube disso ele disse que não admitiria que o Ministro me fizesse a entrega, fazendo-o ele mesmo.
Atualmente, o Café Cristal ainda é um grande contribuinte de ICM?
Diretamente não é, porque foi feita uma modificação nas leis que regulam o café, que para o comerciante é diferido, isto é, o comerciante não paga ICM na hora. Agora, nos pagamos o ICM na fonte, isto é, de onde compramos o café. Cada caminhão de café corresponde a aproximadamente 700 mil cruzeiros de ICM que são recolhidos no município de origem e aqui, compramos relativamente pouco. Acredito que no momento o que recolhemos, referentes à diferença é entre 400 e 800 mil cruzeiros por mês. Agora, o que considero importante, é o dinheiro que trazemos de outros municípios para cá, como fruto de nossa venda do café empacotado feita lá e que corresponde mais ou menos a 65% do total da referida venda.
Você tem uma atuação muito grande no setor da indústria do café fora daqui?
Existe a Associação Brasileira da Indústria de Torrefação e Moagem de Café, com sede no Rio de Janeiro e eu faço parte de sua diretoria. Faço também parte da diretoria de nosso Sindicato, em Minas Gerais, pois todos os estados têm seus sindicatos. A Associação Brasileira é muito poderosa. Nos departamentos do governo que tratam da regulamentação do negócio de café há dois representantes nossos.
A produção de café do município de Patos já é significante?
Já. A produção já é bastante grande; acontece que em janeiro, fevereiro, toda a produção já foi vendida e somente em maio ou junho é que novamente existe café. A produção de Patos deve ser no momento, superior a 30 mil sacos.
Você tem em vista algum plano novo para o “Café Cristal”?
Não, porque o negócio caiu muito em virtude do alto preço do café e do poder aquisitivo baixo, de nosso povo, que diminuiu muito o consumo. Não é porque já estejamos velho no ramo que estejamos desanimados, é que o negócio hoje, é muito vago.
Falta alguma coisa, alguma máquina ou aparelho em sua indústria?
Tudo o que as grandes indústrias do Brasil têm, nós temos. Falta-nos apenas o vácuo puro, que considero desnecessário pois é uma máquina que empacota café com validade para seis meses, enquanto que o nosso sistema dá uma validade para 45 dias e a nossa entrega é feita de dois em dois dias. Nosso café nunca passa de dez dias no armazém. Além disso há o problema que ninguém compra café para guardar. Geralmente, as donas de casa o compram semanalmente.
Vamos voltar ao início do Café Cristal: como era o sistema de entrega de café naquela época?
Eu entregava café de porta em porta, montado em uma bicicleta, com um caixotinho adaptado na garupeira.
Além do Café Cristal, você tem alguma outra atividade?
Tenho uma pequena fazenda com 200 e poucos hectares produzindo cerca de 7 mil litros de leite por mês. A fazenda fica a seis quilômetros do Café Cristal, à direita do Aeroporto, na antiga estrada para Catiara.
Você está desenvolvendo algum projeto na fazenda?
Sim, estamos instalando uma pequena usina, cujo principal objetivo é a produção de ração para o gado leiteiro. Vamos produzir “pinga” também e o subproduto será o álcool hidratado. É coisa muito pequena e estamos fazendo inclusive, para incentivar os nossos produtores, que não acreditam nestas coisas. O negócio é muito bom. Uma usina que produza até 5 mil litros por dia de álcool não precisa nem ser registrada no Conselho Nacional de Petróleo, mas apenas no IAA (Instituto do Açúcar e do Álcool). Assim, a produção de uma pequena usina é facilmente comercializada.
Sua usina terá que produção diária?
Como eu disse, é coisinha pequenininha. Talvez iremos produzir mil litros por dia.
Quando você pretende iniciar esta produção?
Nós teremos cana para inaugurar, daqui a uns três meses, mas para funcionar mesmo, só teremos cana daqui a um ano.
A usina já está instalada?
Não. A infra-estrutura está toda pronta. As máquinas deverão ser instaladas ainda daqui a um mês.
Qual o capital necessário para instalação e funcionamento de uma usina desse porte?
O maquinário deve ficar em 5 milhões de cruzeiros. A infra-estrutura, que consta de um barracão, caixa d’água, rede de energia elétrica e outras coisas, consome uns 2 milhões e talvez 3 milhões, sejam suficientes para a plantação da cana que a abastecerá.
Qual o período de produção da usina?
É de abril a outubro, porque de maio a setembro, a cana não produz açúcar aqui em nossa região.
A comercialização do álcool produzido é fácil?
Muito. Posso vendê-lo para a própria Petrobrás, ou para fábricas de bebidas, ou produzir cachaça, o que pretendemos fazer.
Você desistiu da idéia daquele adubo líquido, com o qual você começou a trabalhar algum tempo atrás inclusive com instalações no Distrito Industrial?
Os técnicos fundadores da firma que são o Dr. Maurício de Barros funcionário de dois ministros em Brasília e o Dr. Paulo Campos, que mora em Goiânia, estão aguardando o registro no Ministério, para que este adubo possa ser vendido e financiado, o que deve acontecer muito breve.
Já está comprovada a eficiência deste adubo e de onde vocês têm informações?
Do Ministério da Agricultura, da EMBRAPA, das Escolas da Agricultura de Lavras e Piracicaba.
Você é sócio da firma?
Juridicamente não. Sou apenas administrador. Sou sócio particularmente.
Qual tem sido a contribuição do Café Cristal, à comunidade, em outros setores?
Há mais de dez anos temos fornecido os boletins escolares para todas as escolas da região. Fazíamos antes 100 mil boletins, mas agora fomos obrigados a reduzir para 60 mil. Não resta dúvida que fazemos com isto uma propaganda, mas nossa primeira intenção foi ajudar a comunidade.
Qual tem sido sua participação no movimento comunitário de Patos?
Eu sou uma pessoa totalmente sem expressão neste ponto. Sou bastante assíduo às reuniões da Associação Comercial e lá tenho procurado lutar pela união dos comerciantes, para o fortalecimento daquela Associação. Durante muitos anos, fui membro do Lions Clube. Fui Presidente do Conselho Municipal do Bem Estar do Menor (COMBEM) durante 3 anos e naquela época, foi fundado o Conselho Patense de Defesa da Comunidade e como tal, fui também um dos fundadores daquele Conselho.
Voltando à torrefação de café. Qual tem sido sua atuação neste meio?
Olha, neste setor, sou mais conhecido fora daqui. Temos um congresso anual e eu nunca perdi um deles; é por isto, que faço parte daquela Associação. Todo torrefador do Brasil me conhece e brinca comigo com a mesma gozação dos amigos aqui de Patos, chamando-me de “cidadão”.
Por falar em cidadão, você tem o título de “Cidadão Patense”?
Eu não o mereço, mas se quiserem dar também, eu não quero, porque eu não concordo com o modo como isto é feito, inflacionado como é, e já falei nisto com muitos vereadores. Acho que seria isto até um desaforo para mim, pois mudei para aqui com oito anos. João Pinheiro pertencia a Patos. Vivo aqui há quase cinqüenta anos, por isto eu sou patense e até muito mais que muito vereador. Nestas mesmas condições, muitas pessoas receberam este título, pessoas que merecem muito mais do que isto¹.
O que você acha do título de “Cidadão Patense”?
É uma grande honraria, porém está muito inflacionado. Não é título para se dar para o Dr. Moacir Viana, para o Sr. Antônio Dias e outros que são muito mais patenses do que muitos que nasceram aqui. Acho que deveria haver todo ano uma homenagem através da qual se concedesse o título de “Cidadão Destaque do Ano”, em cada setor, título este concedido pela Prefeitura ou pela Câmara dos Vereadores, por exemplo e este título seria dado tanto a quem nasceu aqui ou não, desde que seja realmente patense.
Você já enfrentou algum problema, com afirmações de que há mistura de alguma coisa no café?
Antigamente, eu enfrentei uma barreira muito grande: diziam que misturavamos milho, misturavamos isto e aquilo, casca de café e até sangue de boi. Muita gente mistura casca de café, realmente. Existe café com 50% de casca. Uma porcentagem muito pequena mistura milho. É o chamado “café milhorado”. Há uma tecnologia especial para “torrar” o milho, que eu não conheço.
Atualmente existe em Patos, mais alguma torrefação de café?
Não. Quando houve o incentivo do IBC, criaram-se outras, que não sobreviveram.
Você tem dados referentes ao consumo do Café Cristal, na região?
Em Paracatu e Unaí mais de 50%. Em Presidente Olegário, 80%.
Como você vê a industrialização para Patos?
Acho muito difícil. Hoje uma grande indústria numa cidade pequena, longe dos grandes centros consumidores é muito difícil. Talvez pudessemos aproveitar alguns subprodutos de nossa produção agro-pecuária, mas não é nada fácil. Patos já foi grande produtor e exportador de móveis. Hoje a madeira que está sendo usada aqui, vem de Rondônia e do Pará. Agora, fala-se muito em indústria aqui, como se isto fôsse da competência do Prefeito e quem fala nisto se esquece de que há necessidade de se formarem grupos para isto.
Como você vê Patos, neste início de uma nova Administração Municipal?
O “seu” Arlindo é um cidadão fabuloso, cem por cento. Competente, esforçado, mas coitado não pode fazer nada, pois não tem dinheiro. Já ouvi dizer que a Prefeitura tem grande excesso de empregados e se ele for colocá-los na rua, ele vai sacrificar inúmeras pessoas. Acho que a situação da Prefeitura é quase insustentável. O Prefeito terá que no mínimo, aumentar muito o imposto urbano, para conseguir alguma coisa. Ele terá que fazer um recapeamento total do asfalto e cobrar do povo, para melhorar o aspecto da cidade, porque asfalto não é coisa para durar a vida inteira e quem quiser ter asfalto bom, tem que pagar. Esta é uma realidade à qual não podemos fugir. Outro dia, eu brinquei com ele e disse: “Você ‘perdeu’ a política, agora aguente”. Porque entendo que quem foi eleito perdeu.
Você têm alguma coisa mais a dizer?
Eu tenho só que agradecer demais esta atenção de vocês, que é conseqüência da nossa amizade de muitos anos, desde o tempo de seu pai, que foi um de meus grandes amigos.
Finalmente, no dia 3 de maio, quando o Café Cristal completa 30 anos sob sua direção, você pretende fazer alguma coisa?
Nós vamos torrar café, né?
* Fonte e fotos: Entrevista de Dirceu Deocleciano Pacheco e João Marcos Pacheco publicada na coluna “Os Que Fazem Nossa Terra” da edição n.º 66 da revista A Debulha de 31 de março de 1983, do arquivo do Laboratório de História do Unipam.
* 1: Apesar desta opinião radicalmente contrária, Artur Gonçalves da Silveira recebeu o título de Cidadão Patense no ano de 1995, por indicação do Vereador Hilário Andrade de Oliveira.