TEXTO: CLOVIS ESTANISLAU (1929)
A Comarca de Patos, incontestavelmente, uma das melhores do Estado, soffreu um serio deliquio, desde a sahida do illustrado e integro Dr. Raymundo Gonçalves da Silva, removido para a Comarca de Diamantina em fins de Julho do anno passado. Com o afastamento daquelle escrupuloso magistrado, entramos no periodo perniciosissimo das perniciosas interinidades, uma das causas da anarchia em que nos debatíamos atè ha bem pouco tempo.
Em substituição ao Dr. Raymundo, foi nomeado o Dr. Heitor Nunes Coelho, que, por sua vez, entravava todo o serviço forense, não despachando os autos que lhe eram conclusos, não obstante as reiteradas reclamações das partes e dos funccionarios do fôro.
O Dr. Heitor Nunes Coelho contra quem não nos movem resentimentos e nem animosidades e que merece o nosso respeito pelos cabellos brancos que lhe esmaltam a fronte veneranda e pela bondade acolhedora, que irradia de sua personalidade enferma, obstinado em continuar occupando o logar de primeiro magistrado desta terra, apezar de seu precarissimo estado de saude conspirar sempre contra seus bons propositos, foi o unico culpado dos innumeros prejuizos das partes com a quasi completa paralisação do serviço forense, que se foi amontoando em casa daquelle juiz desrespeitador contumaz dos dispositivos legaes estabelecidos contra os inconvenientes da inercia judicante.
Exgotando todos os prazos taxados em lei e, tambem, o excesso tolerado com causa justificada, que elle nunca justificou, o Dr. Heitor, embora absolutamente impossibilitado de exercer as arduas funcções de juiz, e naturalmente mal aconselhado por amigos ursos que abusavam de sua boa fé, continuou deservindo o cargo durante muitos mezes, até que o Dr. Josè Olympio Borges, apoiado em documentos insophismaveis, endereçou ao illustrado Procurador Geral do Estado uma energica representação, em que provou, á sociedade, a impossibilidade de continuar, como Juiz de Direito, o Dr. Heitor Nunes Coelho, homem bonissimo, mas que se acha quasi inutilisado por insidiosa molestia, que, alem de depauperar-lhe as forças physicas, ainda lhe quebra o rythmo das volições, nelle, visivelmente, perturbadas.
Felizmente, as altas auctoridades do Estado, acudindo ás supplicas dos que aqui só pleiteam Justiça e, sò desejam o progresso desta terra dentro da Ordem, tomaram as providencias indispensaveis, que a gravidade da situação requeria, e removeram o obstaculo, permitindo a permuta dos cargos entre o Dr. Heitor e o Dr. Julio Ribeiro Gorgulho, nomeado para a Comarca de Januária.
E o governo do Estado, conhecedor perfeito da anarchia judiciaria em que estamos vivendo em consequencia do estado de saude do Dr. Heitor, não permitiria naquella permuta se não visse na pessoa do Dr. Gorgulho um elemento capaz de conjurar a tremenda crise que nos assoberbava.
Foi, pois, com os melhores augurios que recebemos o novo Juiz de Direito de quem aguardamos, confiantes, o restabelecimento da ordem nos serviços forenses da Comarca, sensivelmente alterada em virtude da acephalia que a vinha singularizando.
Estamos em que, o illustre magistrado, não desmentirá as nossas esperanças.
* Fonte: Texto de Clovis Estanislau publicado com o título “Anarchia Forense” na edição de 28 de julho de 1929 do jornal Gazeta de Patos, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto: Scrotos.com, meramente ilustrativa.