CEMITÉRIO SANTA CRUZ: ZÉ BORRACHUDO, GALO AGULHADO E OUTROS CASOS

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DSC00793O Cemitério Municipal de Patos de Minas fica situado na Rua Ouro Preto, n.º 520, Bairro Várzea. Segundo os registros históricos da cidade é o terceiro a ser usado pelos patenses. O primeiro ficava na confluência das ruas Olegário Maciel e Tiradentes, o segundo no local onde hoje está o edifício do Fórum, na Avenida Getúlio Vargas, e o atual, que segundo dados constantes em seus arquivos, começou a funcionar em 28 de julho de 1911 com o sepultamento de uma criança do sexo masculino da localidade de Canavial, filho dos lavradores José Honório da Silva e Jacinta de Jesus, vítima de moléstia desconhecida.

Até o presente momento já recebeu um total de 35.748 corpos, não obstante seja reconhecido o fato de que faltam informações concretas sobre o número exato de pessoas ali enterradas. A média mensal de sepultamentos é de 35, entre adultos, crianças e fetos, e os que repousam definitivamente no campo santo do município recebem, por dia, a visita de 80 a 100 pessoas, aproximadamente, número que cresce vertiginosamente para 25.000 a 30.000 no dia de Finados.

Segundo o funcionário Murilo de Lima Maciel, que trabalha no cemitério há quase quatro anos, antigamente não havia vigias, e por isso os vândalos e viciados tinham condição e oportunidade para depredação dos túmulos e jazigos, além do aproveitamento da solidão do espaço destinado aos mortos para consumo despreocupado de drogas e entorpecentes, situação que já não existe mais, pois dois rondantes (vigias) cuidam do patrimônio local durante o dia e outros dois durante o período noturno. Vinte e três pessoas, incluindo o Encarregado Administrativo Sr. Antônio Wilson Caixeta, formam o quadro de funcionários, cuidando de todos os detalhes ligados à conservação e funcionamento do cemitério. O espaço destinado à sepultura pode ser comprado, ou não, e nesse caso o período máximo de ocupação pelo enterrado é de 3 anos. Após esse prazo, os ossos são afundados por mais de 2 palmos, para que a cova possa ser reutilizada.

Segundo Murilo e seu colega Vicente Paiva, o túmulo mais visitado é o de José Lourenço da Costa (foto), conhecido em vida como “Zé Borrachudo”, considerado por um número apreciável de pessoas como “fazedor de milagres”. José Lourenço, natural de São Pedro da Ponte Firme, filho de Lourenço Manoel da Costa e Alexandrina de Oliveira, era solteiro quando foi sepultado aos 22 anos de idade no dia 19 de janeiro de 1946, no Setor A, Quadra 3, Ala 6 e Sepultura 4.

Murilo ouviu dizer do pai muita coisa a respeito de Zé Borrachudo. Era um moreno bem apessoado, jovem e alegre capataz de boiadeiro numa fazenda do município, e fundamentalmente, um boêmio inveterado. Nas noitadas, seu esporte preferido era cantar toadas românticas dedilhando um violão. Estas características atraiam por demais as mulheres, chegando ao ponto de gerar ciúmes no meio masculino. Talvez esta última característica, associada a algumas acusações de roubo, explique, e sabe-se lá o como e o porquê, a morte cruel que teve, sendo torturado e lhe arrancado o órgão genital antes de ser afogado no Rio Paranaíba. A sua ficha de registro aponta submersão como causa da morte. Dizem ainda que foi arrastado pelas ruas até o Cemitério. Não se sabe sobre as consequências políticas e jurídicas sobre o caso.

O fato é que a morte cruel de Zé Borrachudo gerou um descontentamento enorme entre as mulheres de seu convívio. Muitas começaram a rezar por ele, para que sua alma descansasse em paz. A partir de um determinado momento, algumas começaram a contar que receberam graças pelas rezas. Segundo Murilo, esta crença de que o Zé Borrachudo tem a capacidade de proporcionar “milagres” àqueles que acreditam, explica a grande procura pelo seu túmulo, principalmente em dias de Finados, ocasião em que o espaço simples onde está enterrado fique coberto de cera derretida. Como exemplo, Dona Lázara Augusta Branquinho, que nem chegou a conhecê-lo, garante que já recebeu bênçãos por intercessão do Zé Borrachudo.

Estive no túmulo de José Lourenço. Acompanhado do funcionário Vicente, resolveu tirar uma foto. Clicou. Ao conferir o resultado, comentou com o acompanhante: – “Ficou ruim, pois o sol incide diretamente sobre o túmulo produzindo reflexo”. Imediatamente, uma nuvem cobriu o sol, resultando na luminosidade necessária sem reflexo. Tão logo Eitel clicou, conferiu que ficou boa. No mesmo momento o sol voltou a iluminar o túmulo com seus raios resplandecentes. Eitel comenta: “Vicente me fez uma cara esquisita dizendo que foi pura coincidência”.

Murilo e Vicente afirmam que várias pessoas já se ofereceram à família do Zé Borrachudo para não só reformar o túmulo mas construir um pequeno mausoléu para que as pessoas possam reverenciá-lo mais condizentemente. Os dois dizem que os familiares sempre recusam e que preferem o túmulo como está, simples como foi a sua vida.

Além do José Lourenço, muitas outras histórias são contadas sobre o Cemitério Santa Cruz, que vão sendo alteradas conforme o espírito e o jeito do narrador, aumentadas por uns, tornadas soturnas e misteriosas por outros, mas despertando invariavelmente a atenção de todos, seja na crença e respeito de muitos, seja na descrença e desrespeito de tantos. Conta-se, por exemplo, que Zé Avelino, já falecido, funcionário que há tempos trabalhou no Cemitério não tinha medo de assombração, e por diversas vezes chegou a dormir encostado em algum túmulo. Certa madrugada, o Zé acordou justamente no momento em que ia passando pela rua um padeiro carregando em sua bicicleta uma cesta cheia de pão. O coveiro, sabe-se lá porque, chegou junto ao portão e deu um grito, não muito forte, mas suficiente o bastante para assustar o bicicleteiro, que pulou apavorado de sua Monark, deixando espalhadas pelo chão da Rua Ouro Preto as dúzias de pães que transportava.

Outra história lembra que o dito Zé Avelino estava abrindo uma cova funda, onde jaziam os restos de uma pessoa ali enterrada, quando em determinado momento sentiu-se mal e foi levado às pressas para o hospital, morrendo, porém, ao chegar no pronto-socorro. Fala-se, também, do comovente e trágico amor de um policial, que ao final do sepultamento de sua esposa, no momento em que a cova era fechada, não suportou a dor da perda sofrida e matou-se com um tiro na cabeça, diante de todos os presentes.

Mais recentemente, Murilo destaca o caso do “galo cravado de agulhas”. Sobre o assunto, o jornal virtual Patos Hoje, edição de 13 de julho de 2010, publicou a seguinte matéria:

Funcionários do Cemitério Municipal de Santa Cruz em Patos de Minas acionaram a Polícia Militar na manhã desta terça-feira (13) ao descobrirem a barbárie que fizeram com um Galo durante esta noite. A ave teve a cabeça e o corpo cobertos por agulhas em um ritual de magia negra. O Galo foi deixado em cima da sepultura usada para o enterro de indigentes. O animal estava imóvel, paralisado pela dor. Ao ser usado em um trabalho de macumba, ele teve o corpo cravado por enormes agulhas. O equipamento de costura foi usado para fechar os dois olhos da ave. Outras agulhas atravessaram as asas, o pescoço e a cabeça. A Polícia Militar registrou um Boletim de Ocorrência por crime ambiental, mas não há pistas de quem possa ter usado o Galo no ritual de magia negra de forma tão cruel. A suspeita é de que a ave tenha sido deixada sobre a sepultura durante a noite. Bastante machucado e provavelmente cego dos dois olhos, o Galo foi socorrido por funcionários da prefeitura e encaminhado para o Centro de Controle de Zoonoses. Veterinários do órgão vão cuidar da ave e tentar fazer com que ela sobreviva¹.

O Cemitério Municipal de Santa Cruz, que fica bem próximo ao centro da cidade, é bastante frequentado por pessoas que realizam rituais de magia negra. De acordo com os funcionários, os horários preferidos para fazer os trabalhos é ao meio dia, às 18h e à meia noite. Muitos entram no local de forma clandestina.

Os guardas do Cemitério já tiveram problemas com pessoas que tentavam entrar no local fora do horário. Apesar de já terem deparado com muitos trabalhos de magia negra, o sacrifício do Galo chamou a atenção até mesmo dos funcionários do Cemitério Municipal.

* 1: Técnicos do Centro de Controle de Zoonozes decidiram diminuir o seu sofrimento e foi feito a eutanásia, acelerando a sua morte. Um medicamento especial foi utilizado e ele não sentiu dor no momento de morrer.

* Texto e foto (29/11/2013) : Eitel Teixeira Dannemann.

* Fontes: Edição n.º 03 do jornal O Tablóide de 01 de junho de 1996, do arquivo de Fernando Kitzinger Dannemann; Depoimento dos funcionários do Cemitério, Murilo Lima Maciel e Vicente Paiva, e do Encarregado Administrativo, Antônio Wilson Caixeta; Matéria do jornal virtual Patos Hoje.

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