ADVOGADO, O

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Foi difícil, penoso, árduo, mas Maria e Pedro conseguiram formar o Carlos, o filho único. Quando este resolveu fazer o vestibular para Advocacia no UNIPAM, os pais entraram em desespero, pois não tinham condições de bancar o desejo do rapaz. Moradores no alto do Bairro Antônio Caixeta, Maria, empregada doméstica e sem carteira assinada; Pedro, servente de pedreiro, fazia um serviço aqui, outra acolá. Resultado: para aumentar as rendas de ambos, Maria passou a fazer faxina à noite e Pedro arrumou um serviço de vigia noturno em uma empresa na Avenida Fátima Porto, não muito distante de casa.

Foram cinco anos difíceis, penosos e árduos para Maria e Pedro. Entretanto, em nenhum momento lamentaram ou perderam as forças, porque o desejo de ver o filho formado de acordo com sua vontade era o combustível que movia os dois. Além do mais, pelo caráter do filho, Maria e Pedro tinham certeza absoluta que depois seriam recompensados de alguma forma. E assim foram-se os cinco anos para alívio do casal. Quanta alegria ao vê-lo recebendo o canudo.

Canudo recebido, e agora, o que fazer? Afinal, um dos grandes obstáculos de boa parte dos advogados recém-formados é, certamente, o local de trabalho. Não é todo mundo que consegue montar sozinho um escritório para desenvolver suas atividades. A primeira opção que lhe veio à mente foi montar um escritório com um colega. Isso foi conseguido numa pequena sala de um edifício na Rua Major Gote, que o colega, com boa condição financeira familiar, arcou para receber depois.

Montado o escritório e estabelecido os horários de revezamento, era preciso conquistar os primeiros clientes. Mas como avisar Patos de Minas que ele era Advogado? Depois de três dias sem conseguir um cliente, Carlos começou a desanimar. Ficava andando pra lá e pra cá no interior da sala, ia até o corredor, ficou de conversar com o colega para aumentar a placa afixada acima da porta. Já no quinto dia, buscando na Internet dicas de empresas de advocacia para se tornar conhecido no mercado, percebeu um homem adentrar à sala. Imediatamente ele pegou o telefone fixo e simulou estar conversando com um cliente:

– Sim, há condições de se reverter essa situação. Aliás, essa é uma de nossas especialidades, reverter condições injustas como é o seu caso, por isso convido-o a vir até o escritório para tratarmos do assunto. O que? Ah, fui indicado pelo Dr. José… que bom ser indicado por um colega tão afamado como o Dr. José. Ok, então aguardo você aqui às 14 horas. Bom dia e até lá.

Desligando o simulado telefonema, gentilmente perguntou ao homem o que ele, Dr. Carlos, poderia ser útil. Também gentilmente, o homem respondeu:

– Nada não, sou técnico da operadora, é que todos os telefones do prédio ficaram mudos e eu estou trocando os terminais de todos os aparelhos para religá-los.

Se depois disso o Carlos arranjou clientes? Sinceramente não fiquei sabendo!

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 25/02/2020 com o título “Palacete Mariana na Década de 1960”.

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