SIMPLÓRIO SEU JOÃO

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Perto da comunidade de Córrego Rico passa o Córrego Amargoso. O pessoal mais antigo de lá afirma que nos idos tempos, pelo menos até a década de 1970, ele estava mais para ribeirão do que para córrego, pois tinha em alguns pontos até quatro metros de largura e nas curvas uns poços de até três metros de fundura. Eles, os antigos, só não sabem explicar tecnicamente o porquê, hoje em dia, mesmo no tempo das chuvas, o curso d’água não passa de um metro e meio e os poços, quando muito, mal chegam a um metro de fundura.

Então, naqueles idos tempos, lá estavam diante de um daqueles poços fundos o Seu João e um amigo praticando, após largar as labutas da roça, o seu esporte preferido: pescar. Nisso, passa um avião e o amigo começa a falar sobre o tal avião, que nunca tinha vista um avião de perto e um dia, se Deus quiser, ainda ia chegar perto de um. O João rebateu dizendo que já tinha visto um bem de pertinho e que foi o maior susto de sua vida e que até hoje tem horror de avião e que, se Deus quiser, nunca mais ia chegar novamente perto de um. Curioso, o amigo quis saber o motivo:

– Tava eu visitando o Mané Chambota lá perto da Cidade na casa dele que ficava na bêra da estrada e que é hoje a tar Avenida JK quando, meus Deus do Céu, esburrachou um avião bem na frente da casa. Nascemos de novo, nascemos de novo, purisso num chego mais perto de avião nenhum¹.

O avião se foi, a pescaria prosseguiu e o sol lá ia se escondendo por trás do morro quando os dois amigos, com as capangas cheias de mandis, piabas, tubaranas, sete-léguas, piaus e outros, se mandaram para suas casas. No outro dia, o João amanheceu com um mal-estar esquisito. Por coincidência, um seu primo da Cidade estava lhe visitando e resolveu levá-lo ao Hospital Regional. Na espera para ser atendido, o João mostrou-se muito nervoso já pensando no pior e chegou até a contar para o amigo que quase um avião caiu sobre ele. Vindo em direção ao paciente, o médico notou seu nervosismo e para tentar acalmá-lo, perguntou com um sorriso simpático:

– O que o senhor tem, Seu João?

O João pensou um pouquinho para não esquecer nada do que tinha e respondeu:

– Uai, sô, tenho uma casinha boa, uma picape véia mas supimpa, uma muié supimpa, três filhos supimpas, 10 vacas, 2 cavalos, 5 porcos, umas 20 galinhas, dois cachorros, um milharal bunito dimais da conta…

– O senhor não entendeu, Seu João, diga o que o senhor está sentindo.

Ah, sim, tô sentino uma vontade danada de matá um porco e comê ele no final de semana.

E a vida segue!

* 1: Leia “2.º Acidente Aéreo”.

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 25/02/2020 com o título “Palacete Mariana na Década de 1960”.

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