Em 04 de novembro de 1880, através da Lei Providencial n.º 2656, foi criado o distrito de Lagoa Formosa e anexado à então Vila de Santo Antônio de Patos. Interessante é que, 11 anos após, em 14 de setembro de 1891, a Lei Estadual n.º 2 repetiu o processo. E assim, durante mais de 70 anos, Lagoa Formosa foi efetivamente distrito de Patos de Minas. Até que veio a década de 1950 e começou-se a falar sobre a emancipação daquele distrito.
Eis então que, no início de agosto de 1953, foi criada pela Câmara Municipal uma Comissão Especial encarregada de estudar a emancipação, fazendo parte do novo território municipal o distrito de Chumbo. Na sessão do dia 7 daquele mês, ela se reuniu pela primeira vez. Estavam presentes os vereadores João Borges (Presidente), Zama Maciel (Relator), Delfim Borges da Fonseca, José da Fonseca, Antônio Mendes da Costa e como Secretário, Sebastião Brasileiro Júnior, designados pelo Presidente da Casa, José Nascimento.
No dia 12, a Comissão voltou a se reunir, e José Fonseca sugeriu um plebiscito em Lagoa Formosa e outro em Chumbo. Na reunião de 14, Delfim Borges da Fonseca, com voto em separado, se declarou contra a emancipação tendo o território do distrito de Chumbo incluído. Mas era favorável, de acordo com o relator Zama Maciel, de emancipar-se apenas o distrito de Lagoa Formosa, sem a inserção do distrito de Chumbo. José da Fonseca e Antônio Mendes Costa também votaram a favor. João Borges declarou: Apesar de reconhecer que há vantagem para o distrito de Lagoa Formosa a sua associação com o distrito de Chumbo para formar uma nova comuna, voto acompanhando as conclusões de Delfim Borges da Fonseca, porque o povo de Chumbo não se manifestou até a presente data. Segundo Delfim Borges da Fonseca, a Câmara já havia apoiado esse desmembramento em reunião em 5 de maio.
Após essas primeiras discussões, o assunto só voltou a esquentar em 1958, mais precisamente na sessão de 3 de março, quando foi apresentado o Projeto de Resolução que dispõe sobre as divisas, assinado por todos os vereadores presentes. Na sessão do dia 6, Zama Maciel, antes de dar seu voto, fez esse longo pronunciamento:
“Em 29 de fevereiro de 1868 foi instalado solenemente o município mineiro que tinha por sede a Vila de Santo Antônio dos Patos. Nesta época, as suas divisas compreendia um vasto território que se estendia no sentido norte sendo distante Pontal, onde ocorrem as suas águas os Rios Paracatu e Prata, ao Morro do Pião; e no sentido leste-oeste do Morro das Pedras à confluência dos Rios Areado e Abaeté. Era vasto e úbere esse território; e muita gente vivia a povoá-lo. Os organizadores da nova comuna e que foram os irmãos Antônio e Jerônimo Dias Maciel deram-lhe, portanto, condições de desenvolvimento capazes de torná-la das mais opulentas do Estado. Em 4 de novembro de 1880, o povoado de Lagoa Formosa tornou-se distrito do município de Patos e é essa lei provincial de número 2.656, que hoje solicitamos, seja revogada, desmembrando do município de Patos de Minas o território da antiga Freguesia de Lagoa Formosa.
Votarei a favor da Resolução, e o farei com emoção cívica, bem que, em princípio, seja contrário à proliferação de municípios, porque, enfraquecendo-se os antigos, há o fortalecimento do poder estadual, em detrimento da unidade da República.
Leva-se também votar pela proposição o conhecimento das realidades presentes. Os organismos sociais assemelham-se aos dos seus componentes: nascem, crescem, fecundam-se, reproduzem e morrem. A reprodução aqui se faz por cissiparidade: desmembram-se. Deixam, às vezes, vácuos impreenchíveis. Como todo efeito é resultado de uma causa, ao perquirirem os historiadores do futuro os motivos do movimento emancipar de Lagoa Formosa, alinharão, fatalmente, como fator primordial desse fenômeno social, o descaso com que a administração do município trata dos problemas do distrito. A sua sede, onde se observa intenso movimento comercial e apreciável número de novas construções, está relegado ao abandono. Contemplando-se aqueles buracos, aqueles poços de lama, aqueles muros caídos, ou aquela poeira infernal das épocas de estio, tem-se a impressão que a Vila que vista do alto é tão risonha, é burgo recuperado por gente teimosa que ali voltou depois de uma catástrofe. Só o dinamismo entusiasta de seus moradores, repugna tanto desprezo. E o lenitivo para esses malefícios está na reparação. Somente o futuro poderá responder do acerto ou desacerto desse passo, no presente momento. Uma cousa, porém, Senhor Presidente [Randolfo Borges Mundim], parece-me imprescindível, já que iremos, dentro em pouco, acordar com a separação de nosso município do seu mais próspero distrito. É o dever que tem o município-mãe de auxiliar o distrito que se separa. Tem ele a estrita obrigação moral de fazer o enxoval da filha que se casa, se me permitem a comparação. Por que não se constitui uma comissão de vereadores para se elaborar um programa de obras destinadas à instalação do novel município? As despesas com essas obras devem ser por conta do município de Patos de Minas que assim dirá o povo de Lagoa Formosa que todos contribuímos calorosamente para a criação do município.
Será vergonhoso para nós deixarmos que o distrito de Lagoa Formosa se emancipe como filho espúrio, quando, na realidade, é parte do nosso corpo que se desagrega, por cissiparidade. Apresentarei essa indicação à Câmara na sessão de amanhã, e espero vê-la acolhida favoravelmente. Disse, ao princípio, que votarei a Resolução com emoção cívica, e ao repetir essa afirmativa, quero (a idade já me permite aconselhar) dirigir uma exortação ao laborioso povo de Lagoa Formosa. Os vivos são cada vez mais dirigidos pelos mortos, sentenciava Auguste Conte. A vossa história, lagoense, é cheia de lutas, e as cicatrizes dessas lutas perduram através dos anos. Mister se faz, sejam apagadas para que o município novo possa prosperar. É necessário que seus atuais líderes compreendam dos sazonados frutos que poderá trazer uma política de respeito à lei, guiada por agudo espírito público.
Procurai para os postos de direção os mais capazes; repeli os conchavos dos acordos que satisfaçam interesses pessoais, e desprezam o bem geral.
A tolerância e a liberdade devem predominar sobre todos os outros sentimentos. E sobre o vosso escudo d’armas inscrevei: ‘Formosa terra de gente livre’.
A União Democrática Nacional, pela voz de seu representante nesta Casa, declara que aplaude, por julgá-lo oportuno, o movimento emancipacionista do povo de Lagoa Formosa e para ele determinou o voto de seus representantes na Câmara Municipal de Patos de Minas”.
* Fonte: Uma História de Exercício da Democracia: 140 Anos do Legislativo Patense (2006), de José Eduardo de Oliveira, Oliveira Mello e Paulo Sérgio Moreira da Silva, do arquivo de Eitel Teixeira Dannemann.
* Foto: istockphoto.com/br, meramente ilustrativa.
* Edição: Eitel Teixeira Dannemann.