PESCARIA COMPLICADA

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Dizem que pescar faz um bem tremendo à saúde. Para os humanos, lógico, pois para os peixes é uma tragédia. Até existe um mundaréu de frases a respeito, como, por exemplo: Tá nervoso? Vai pescar! A que os considerados craques pescadores adoram é essa: Pescaria é paciência, não pegar é natural, mas se beliscou e não fisgou, é o pescador que pesca mal.

Com essa filosofia, cinco empresários patenses compraram um rancho na beira da Represa de Três Marias. Uma vez por ano, sem as respectivas esposas e demais familiares, zarpavam para lá e por lá ficavam uma semana ou mais. Sabe-se lá o que aprontavam no rancho, mas a volta era acompanhada de muito peixe.

Com o tempo, eles perceberam que a cada ano pescavam menos. Então, apaixonados que eram por pescaria, tomaram uma decisão drástica: venderam o rancho de Três Marias e compraram um na beira do Rio Paraguai, pertinho da cidade de Porto Murtinho, no Pantanal do Mato Grosso do Sul. Com o rancho devidamente montado e com as devidas licenças de pesca, os amigos combinaram o dia da primeira pescaria no lugar. Para eles, muita ansiedade no preparo da tralha, com a preocupação costumeira de não se esquecerem de nada.

Faltando uma semana para a tão esperada e ansiada viagem, veio o imprevisto: a sogra de um deles sofreu um AVC e foi internada num hospital da Rua Padre Caldeira. O genro se desesperou quando a esposa praticamente o proibiu de participar da pescaria com a mãe em vias de falecer. O esposo rebateu que a sogra, mesmo ficando com as sequelas tradicionais, se recuperaria em breve, de acordo com as palavras dos médicos, e que não havia necessidade dele não ir à pescaria. Os quatro companheiros, solidários, decidiram esperar. O amigo, decididamente, resolveu cumprir com eles o combinado. A esposa chiou:

– Você é mesmo desalmado, marido, minha mãe prestes a morrer e você vai pescar.

– Ora, mulher, os médicos já confirmaram que ela vai ficar boa em breve.

– E se não ficar, e se o caso complicar e ela morrer? Ela morre e você lá, tranquilão, pescando, seu sem coração.

Foi pelo menos uma hora de lamúrias da mulher acusando o marido de não gostar dela, de não gostar da mãe dela, de não gostar dos filhos e só gostar dele, nem aí se a mãe dela morrer. E a esposa lançou a cartada final:

– Se você for pescar com a minha mãe prestes a morrer eu peço o divórcio e fim de papo.

O marido pensou, racionou, pensou de novo, raciocinou de novo, ponderou os prós e os contras e decidiu:

– Tá bem, mulher, pronto, não vou mais pescar com a minha turma nessa primeira vez no rancho do Pantanal. Mas tem uma coisa: se sua mãe não morrer, quem vai pedir o divórcio sou eu.

Os quatro amigos foram, a sogra sobreviveu, a esposa ficou contentíssima pelo sacrifício do esposo, este agradeceu, mas o que ele desejou mesmo era estar ao lado dos amigos no Pantanal. E assim a vida continuou.

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 06/06/2014 com o título “Antiga Rodoviária no Final da Década de 1970 − 1”.

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