TEXTO: OSWALDO AMORIM (1985)
Pelo ritmo das chuvas que caem em nossa região, acho que podemos nos preparar para uma enchente de dimensões ainda maiores que a do ano atrasado, que tanto espanto causou à nossa população. Evidentemente, não a mim, que há tantos anos tento alertar a todos para os riscos, prejuízos e, sobretudo, transtornos de novas grandes inundações, que podem acontecer a qualquer ano.
Riscos, felizmente, menores do que os transtornos, pois pela altura das barrancas do Paranaíba, nenhuma enchente apanha os ribeirinhos de surpresa. Assim, por mais rápido que as águas subam, o Rio sempre leva alguns dias para transbordar, o que sempre dá tempo aos moradores de abandonar em ordem suas casas. Pelo menos daria, se não fosse a resistência de muitos em deixar suas moradias, mesmo vendo o avanço das águas. É que parece animar a todos esses recalcitrantes a esperança de que as águas em vez de continuar subindo de repente comecem a refluir.
Falando nisso, em que pese todos os contratempos de uma grande inundação, creio que esta será altamente benéfica para a cidade, na medida que pode consolidar a idéia de que as margens alagáveis do Paranaíba não podem mais ser habitadas. E, da mesma forma, todas as demais.
Felizmente algo já começou a ser feito, como a construção de um conjunto de 48 casas, no Bairro Novo Horizonte, para abrigar igual número de famílias da área mais critica da Vila Operária, num magnífico Mutirão pela Comissão Municipal de Defesa Civil, com o decidido apoio do Prefeito Arlindo Porto¹.
Foi um excelente começo, embora eu tenha restrições à localização do conjunto, pois o ideal numa remoção deste tipo, é que o deslocamento seja o menor possível, ressalvados os limites da segurança, da conveniência e da possibilidade, a fim de que as pessoas deslocadas permaneçam dentro de seu habitat e, assim, continuem próximas de seu trabalho, de seus amigos, de seu armazém, de seu açougue, da Escola de seus filhos, , de sua Igreja, e, no caso, também do Paranaíba, onde muitos gostam de pescar nos fins de semana. Por isso mesmo, para mim não será surpresa se alguns, ou mesmo muitos, dos removidos, apesarem de terem recebido casas muito melhores do que as que deixaram na beira do rio, acabam voltando para a Vila Operária. De qualquer forma, foi um esforço altamente meritório e altamente benéfico para numerosas famílias. Mas para ser realmente eficaz, o trabalho de remoção das áreas alagáveis do rio tem de continuar juntamente com as das áreas alagáveis do Ribeirão da Fábrica, do Córrego do Monjolo e da Lagoa Grande.
Mas a medida mais urgente − pela qual venho me batendo há tanto tempo − é a demarcação dessas faixas alagáveis e a proibição peremptória de edificações nessas áreas. É preciso que a Prefeitura, com apoio da Câmara Municipal, promova logo estas demarcações e faça tudo para impedir novas construções ou mesmo ampliações dentro destas faixas alagáveis, tolerar estas construções hoje, é criar mais problemas para amanhã, inclusive a necessidade de promover novas e cada vez mais trabalhosas remoções em massa, com toda sua pesada carga de custos econômicos e sociais.
Por tudo isso, o melhor é atacar o problema pela raiz, demarcando-se as áreas alagáveis do Rio, do Ribeirão da Fábrica, do Córrego do Monjolo, do Córrego da Cadeia, da Lagoa Grande e também do Córrego do Limoeiro, de onde a cidade já se aproxima. Ademais, a demarcação das faixas alagáveis, é um trabalho mais fácil, mais rápido e muito mais barato do que a construção de um pequeno Conjunto Habitacional para famílias desabrigadas.
Uma grande enchente agora ajudará a definir estas faixas, pelo menos no Paranaíba e no Ribeirão da Fábrica, cujas enchentes seguem o compasso das cheias do rio. Chegar-se-á aos contornos definitivos da demarcação, acrescentando-se uma faixa de segurança às marcas extremas das inundações. Nessa linha terão de se fincar marcos definitivos e visíveis e iniciar-se, em seguida, severa e constante vigilância sobre as faixas alagáveis, para impedir a construção de moradias. Não apenas às margens do Paranaíba e Ribeirão da Fábrica, mas de todas as outras citadas.
É claro que o trabalho de remoção das famílias residentes nas áreas alagáveis tem de continuar, logicamente com a construção de novos Conjuntos Habitacionais (que, daqui para a frente, deverão ser construídos o mais próximo possível das áreas de origem, para conservar a população removida perto dos pontos e das coisas que a se acostumou). Entretanto, o mais urgente, agora, é a demarcação de todas as faixas alagáveis da cidade que, junto com uma boa fiscalização subsequente, para se impedir novas edificações, poderá evitar − no futuro − toda uma série de onerosos, difíceis e quase sempre dramáticos trabalhos de remoção das famílias flageladas.
* 1: Leia “Mutirão em Prol Dos Desabrigados da Chuva − 1984”, “Mutirão da Solidariedade de 1984”.
* Fonte: Texto publicado com o título “Urge Interditar as Áreas Alagáveis da Cidade Para Impedir a Multiplicação dos Flagelados” no n.º 108 de 31 de janeiro de 1985 da revista a Debulha, do arquivo de Eitel Teixeira Dannemann, doação de João Marcos Pacheco.
* Foto: Do arquivo MuP, via Geovane Fernandes Caixeta, publicada em 20/05/2016 com o título “Enchente do Rio Paranaíba em 1965”.