ANARQUISMO PATENSE

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TEXTO: EITEL TEIXEIRA DANNEMANN (2023)

Contam os livros de História, que o Anarquismo, aflorado nos finalmentes do século 19, é uma ideologia que surgiu com o político francês Pierre-Joseph Proudhon e teve grande divulgação com o russo Mikhail Bakunin. Para eles, o Anarquismo tem como princípio básico a autogestão democrática da política, ou seja, no sistema anarquista não existe governo, não existe Estado, não existem lideranças, não existem instituições econômicas, e a Lei é criada e exercida pela participação de toda a população, pregando a valorização da liberdade individual. No frigir dos ovos, cada um faz o que quer!

Aqui não se trata de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Salvador, Fortaleza, Manaus, Curitiba e muito menos de Belo Horizonte, Uberlândia, Contagem, Juiz de Fora, Betim, Montes Claros, Ribeirão das Neves, Uberaba e outras mineiras. Nessas grandes populações, repletas de problemas estruturais e sociais porque não foram combatidos quando deveriam ser combatidos, no hoje é muito, muito difícil, praticamente impossível, reverter os erros cometidos pelas administrações públicas daquelas Cidades que permitiram que se chegassem às horrendas mazelas atuais. Refiro-me a Patos de Minas, uma ainda pequena Cidade de pouco mais de 150 mil habitantes e com crescimento vertiginoso que segue no rumo para se equiparar aos exemplos daquelas, porque não está valorizando os acertos do Passado e, pior, está agregando demasiadamente os erros dos idos tempos.

Quando, em 1868, a então Santo Antônio dos Patos foi desmembrada de Patrocínio tornando-se um Município, o nosso primeiro prefeito, Jerônimo Dias Maciel, teve a preocupação de formular o nosso 1.º Código de Posturas, porque sabia que o progresso de uma coletividade depende de ordem, de Leis, senão se transforma em baderna, onde cada um faz o que bem quer sem dar satisfação a nenhum outrem. Como funcionou, não se sabe. O que se sabe, e muito bem, é que há décadas o poder público de Patos de Minas não cumpre a Lei. É o Anarquismo. Vejamos apenas alguns exemplos, para não alongar muito, pois só o nosso atual Código de Posturas é composto de 408 Artigos (Leis), todos eles, sem uma única exceção, desrespeitados pelo poder público:

− A obrigação de arrumar o passeio em frente ao imóvel é do proprietário. E o assunto é tão sério que no nosso Código de Posturas isso vai dos Artigos 18 ao 34 (Leis). Como o que importa é a liberdade individual, cada um confecciona o seu passeio de acordo com a sua vontade e o mantem igualmente de acordo com a sua vontade − complicando e não raras vezes impedindo as andanças de idosos, deficientes físicos, mães com carrinho de bebê e, principalmente, cadeirantes − acarretando aquela inacreditável aberração da Rua Ceará¹. É o Anarquismo!

− Para quem é proprietário de um lote ou terreno, os Artigos 234 a 236 do nosso Código de Posturas (Leis), o obriga a murá-lo e mantê-lo limpo. Mas ele, na sua liberdade individual, não o faz. Assim, no período das chuvas, é muito mato, e no período da seca, vem incêndio. Para complementar, o local transforma-se em depósito de lixo e entulhos. Todos os lotes e terrenos não murados, por isso repletos de lixo, hospedam baratas, ratos, escorpiões e outros seres indesejáveis. Ainda, com vários objetos que acumulam água, é maternidade para o mosquito da Dengue. Entra ano e sai ano, as mídias anunciam esses transtornos e, entra ano e sai ano, o problema prevalece. É o Anarquismo!

− Para quem é lojista, tem os Artigos 153 a 158 (Leis) que estabelecem como devem ser colocados os toldos para que nenhum deles interfira no ir e vir dos transeuntes no passeio e, principalmente, para que ninguém sofra danos físicos, e eu só não tive um olho perfurado no Centro da Cidade por um daqueles cordames que ficam estirados porque uso óculos. Outro simplesmente ocupa o passeio em frente ao seu comércio obrigando o transeunte a ir para a rua. Mas o lojista, na sua liberdade individual, instala o seu toldo do jeito que quer e danem-se toldos, que dizer, todos, que se aborrecem ou se prejudiquem com isso. É o Anarquismo!

− Há Leis que proíbem motos, independente da cilindrada, de trafegarem com escapamentos que provoquem barulho. Mas o motoqueiro de entregas e outros, na sua liberdade individual, com sua máquina com escapamento totalmente fora do padrão, que produz um barulho infernal, que trafega pelas ruas a 100 km/hora ou mais, ziguezagueando entre os carros, não respeitando sinal vermelho e muito menos faixa de pedestres, sabe perfeitamente o mal de saúde que produz a quem quer SOSSEGO em seu Lar, principalmente a idosos, acamados e autistas. É assim durante todo o dia e até lá pelas 11 da noite, de meio em meio minuto se ouve o infortúnio dessas motos, atrapalhando deveras até a quem assiste TV ou quer apenas conversar. Para piorar, recentemente estão presentes bicicletas motorizadas conduzidas por jovens sem capacete que produzem barulho tanto quanto ou mais que as motos, que também não respeitam sinal vermelho e incomodam o dia todo, zanzando pelas ruas do Centro fazendo malabarismos com a roda dianteira levantada no único intuito de incomodar. É o Anarquismo!

− A Lei determina que o Cidadão tem direito a um atendimento de saúde pública digno. Assim não sendo, ficar horas e mais horas esperando por um atendimento na UPA não é nada agradável. Esperar meses e mais meses por um exame e o exame não sai até que o paciente morre, é tétrico. Procurar a saúde pública para um exame oftalmológico e descobrir que há uma fila de espera de mais de 3000, é decepcionante.  Ficar esperando uma cirurgia no Hospital Regional durante meses até que a vida do paciente se complica a tal ponto que a família do mesmo é obrigada a recorrer à mídia pedindo ajuda financeira para conseguir um atendimento particular antes que ele morra, é humilhante. E para desonrar qualquer Cidadão de bem, se um delinquente chega num carro da polícia precisando de atendimento urgente, ele, o delinquente, tem a preferência para ser atendido. Ultraje!  Isso acontece todo dia. O poder público, para sua saúde, não depende de saúde pública, pois a saúde dele quem paga é o Contribuinte, e inúmeros desses Contribuintes estão agora na fila de espera. É o Anarquismo!

− Quando um Cidadão com plano de saúde ou não quer marcar uma consulta com um médico, o que ele faz? A trabalheira de ir até onde o médico atende para marcar a consulta? Claro que não. Então, simplesmente, ele liga para a secretária do médico e marca a consulta. Simples. Na saúde pública, não existe isso. O Cidadão que depende dessa saúde pública não tem o direito de ligar para o posto de saúde para marcar uma consulta. Não, de jeito algum, ele, o Cidadão que depende da saúde pública, tem que ter a trabalheira de se deslocar de sua residência para ir ao posto de saúde só para marcar a tal consulta. E cada posto de saúde tem os horários e os dias para isso, geralmente só algumas horas de dois ou três dias de manhãzinha da semana. Então, depois dessa trabalheira, consulta marcada, o Cidadão comparece na data marcada e haja paciência para esperar a sua vez de ser atendido. É o Anarquismo!

− Já não é de hoje a nova mania: prédio novo com comércio no térreo construído afastado do passeio para servir de estacionamento para clientes. Entretanto, como determina a Resolução 302 (18/12/2008) do CONTRAN, os proprietários de estabelecimentos comerciais que possuem estacionamentos de recuo paralelo a via não podem caracterizar como privativas as vagas criadas. Com isso, os proprietários que privam os motoristas de estacionar paralelamente ao passeio, não podem impedir que veículos sejam estacionados dentro do recuo e entre o passeio e a edificação. E para complicar, a maioria dessas construções tem recuo curto e os carros acabam obstruindo a passagem do pedestre no passeio. É o Anarquismo!

− O motoqueiro de cilindradas altas tem uma paixão medonha por barulho. Ele, quando senta em sua máquina e urra o motor com o escapamento adulterado a qualquer hora do dia, da noite ou de madrugada; ele, quando parado no sinal vermelho (quando o respeita), fica fazendo vrum-vruns insuportáveis e quando parte acelera a máquina numa barulheira mais insuportável ainda, soltando tiros, percebe-se que praticamente tem um orgasmo quando vislumbra o aborrecimento que está causando. Quando faz isso sabe, perfeitamente, que está exercendo a sua liberdade individual, repetindo tudo aquilo exposto acima sobre os motoqueiros entregadores². É o Anarquismo!

− Carroça no trânsito congestionado na Rua Major Gote não é novidade. Apesar da Lei que a proíbe de transitar no Centro da Cidade (Artigo 101 do nosso Código de Posturas), ela está sempre presente, atazanando o já caótico trânsito e emporcalhando a via com dejetos intestinais equinos, altamente fedorentos, semana após semana, pois, exercendo a sua liberdade individual, seu condutor, não o equino, não se preocupa com isso. É o Anarquismo!

− Os motoristas de carretas bi-trem ou não de altíssima tonelagem, assim como outros caminhões pesadíssimos, sabem da existência da Rodovia do Contorno. Por que a existência da Rodovia do Contorno, desde 1985? Ora, justamente para que o trânsito pesado não trafegue no Centro da Cidade, evitando danos aos pisos das vias e à integridade física dos transeuntes e ainda para não tumultuar o já caótico trânsito. Presente no nosso Código de Posturas, o Artigo 91 (Lei) é capcioso. Por que capcioso? Porque coloca nas mãos do gestor, decidir ou não o impedimento de trânsito pesado no Centro da Cidade, mesmo ele, o gestor, sabendo que esse trânsito pesado causa uma enormidade de prejuízos ao Erário. Quer dizer, ele, o gestor é quem decide (Democracia?), e, mesmo ele sabendo dos prejuízos que isso vem causando desde 1985, não toma providências para acabar com isso³. Não é à toa que a Rua Major Gote pode ser considerada Rodovia Major Gote. É o Anarquismo!

− Reclamar da COPASA e da CEMIG é a mesma coisa que reclamar da galinha que botou um ovo podre. Estas duas empresas fazem o que querem e o que não querem em Patos de Minas. O atual prefeito até anunciou que rompera o contrato com a COPASA.  Mas a COPASA continua firme e forte, e os Contribuintes pagando taxa de tratamento de esgoto, e mesmo assim, os Contribuintes pagando taxa de tratamento de esgoto, constantemente a mídia denuncia esgotos não tratados pela COPASA sendo jogados no Rio Paranaíba e seus afluentes. Sobre a CEMIG, dizem que a iluminação pública foi terceirizada e que tudo ia melhorar. Ora, postes com luzes queimadas se espalham pela Cidade aos montes, chegando a inúmeros casos que demoram mais de meses para a correção. E o Contribuinte recebe, sem falta, a cobrança de iluminação pública. É o Anarquismo!

− O sujeito que equipa seu carro ou sua camionete com caixas de sons poderosas e sai pelas ruas da Cidade assustando até os moradores do Cemitério Santa Cruz, a qualquer hora do dia, da noite e de madrugada, tremendo as janelas e paredes das casas e apartamentos, ativando alarmes dos carros, mesmo sabendo que há Leis impeditivas, faz isso porque está exercendo a sua liberdade individual, chegando ao cúmulo de uma camionete zanzar pela Cidade com um reboque com enormes caixas de som nas alturas. Às vezes o som é tão alto que provoca mais males que os citados em relação às motos, igualmente transgredindo Leis. É o Anarquismo!

− Com o crescimento vertiginoso da Cidade, são legalizados loteamentos como num piscar de olhos, sendo a maioria para a camada mais necessitada da população e que, constantemente, não atendem a muitas exigências da Lei. Geralmente, as ruas são asfaltadas com meio centímetro de camada, não são construídas redes pluviais e as redes de esgotos são inadequadas ao futuro crescimento populacional. Tudo é muito bonitinho na foto. Mas quando vem a primeira chuvarada, a verdade sobre as deficiências estruturais se estabelecem. As mídias, vira e mexe, mostram essa problemática. É o Anarquismo!

− As ocupações indevidas das áreas alagáveis do Rio Paranaíba e seus afluentes vêm de décadas e isso já gerou enormes prejuízos ao Erário com as inúmeras inundações, como, por exemplo, a de 1984, e mais recentemente há dois anos. Acontece que essas áreas alagáveis vão sendo ocupadas, com o poder público sabendo que elas estão sendo ocupadas e que não poderiam de modo algum ser ocupadas, e mesmo assim o poder público nada faz para impedir a ocupação. O mais estranho de tudo é que essas ocupações são devidamente equipadas com CEMIG e COPASA. Aí vem a enchente e desabriga muitos. Aí vem o poder público e gasta uma dinheirema danada do Erário para socorrer esse povo. Povo socorrido, todos voltam para suas casas até a próxima enchente. Aí vem outra enchente, e tudo se repete, com mais dinheiro do Erário para socorrer os desabrigados e… moto perpétuo. É o Anarquismo!

− Para não alongar mais, porque se aqui fossem declaradas todas as omissões do poder público a coisa ia longe, tem a Lei n.º 273 do nosso Código de Posturas que determina que todo proprietário de estacionamento particular só pode cobrar por fração de 15 minutos. O atual prefeito é dono do estacionamento particular Riviera Park e não cumpre a Lei. Na minha simploriedade, assevera-se a desqualificação de todo o poder público, caracterizando, mais do que nunca, o ANARQUISMO PATENSE!

Essa é a nossa real Patos de Minas há muitos e muitos anos, uma ainda pequena cidade de pouco mais de 150 mil habitantes, onde o Contribuinte NORMAL não consegue ter, primordialmente, SAÚDE e SOSSEGO. Continuando esse ANARQUISMO, Patos de Minas, não demora muito, estará repleta de todos os problemas daquelas cidades citadas acima. Fica aqui registrado para a posteridade. E lá no Futuro, nossos descendentes terão a tristeza de saber que tudo poderia ter sido evitado, mas que era assim que a banda tocava por aqui e quem eram os maestros!

* 1: Leia “Aberração no Passeio − 10: Atentado à Vida do Pedestre”.

* 2: Na verdade, de vez em quando, e muito de vez em quando, blitz policiais apreendem algumas dessas motos possantes barulhentas, tipo meia dúzia por aí, isso num universo de mais de 26 mil motos, com praticamente 99% barulhentas.

* 3: Artigo 91 do nosso Código de Posturas: O Poder Público poderá impedir, independentemente de notificação ou de autuação anterior, o trânsito de qualquer veículo ou meio de transporte que possa ocasionar danos à via pública e/ou à segurança dos munícipes.

* Foto 1: Guiadoestudante.abril.com.br.

* foto 2: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann.

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