Alguns países da Europa, como Portugal, Espanha, Holanda e França, principalmente, viviam uma fase de exploração marítima nos idos de 1500. Era mais do que certo que viessem aportar em terras brasileiras no intuito de explorar suas riquezas. Quando aqui desembarcaram, óbvio, se depararam com os nativos. Para os aventureiros que chegavam os índios logo se tornaram uma ameaça. Era preciso eliminá-los ou escravizá-los. Toda a região entre os rios Grande, Paranaíba e Paracatu, até o Carinhanha, era ocupada por tribos pertencentes à nação Caiapó/Cataguá¹, tribos que não se submeteram aos primeiros invasores. As notícias que chegavam a São Paulo pelos entrantes das Minas Gerais davam conta dos morticínios praticados pelos caiapós/cataguás, desfazendo os sonhos de riqueza alimentados por aqueles que ainda pretendiam aventurar-se pelos sertões.
O desencontro de notícias infunde temor em dom Luiz Mascarenhas, governador da Capitania de São Paulo. Em 12 de outubro de 1742, Pires de Campos foi destacado para fazer a guerra aos caiapós. Acompanhado de 500 índios bororós e homens escolhidos a dedo, escravizaram mais de mil caiapós. Assim as trilhas e caminhos de São Paulo a Goiás ficaram sem o perigo das emboscadas indígenas. Mas foi por pouco tempo, fazendo Pires de Campos voltar à luta em 1748. Em 1751, nas proximidades de Paracatu, os caiapós conseguiram abatê-lo.
Os intrépidos desbravadores, alguns ávidos de cobiça, outros sequiosos de glórias, não se fixaram na região dos altos do Paranaíba. Nesta parte amena e aprazível do planalto, poucos foram os veios auríferos encontrados. Por ela passavam as bandeiras, que se embrenhavam pelos sertões no afã de novas descobertas ou na ilusão de atingir as minas de Potosi ou as mirabolantes riquezas andinas. A serra dos Martírios foi imã que desvairou a cobiça dos altivos paulistas pressionados pelos reinóis nas minas do centro da futura Capitania. Por aqui passaram Bartolomeu Bueno da Silva, o Anhanguera, e inúmeros outros destemidos sertanistas, sem que nenhum aqui se fixasse, atraídos todos pelas recentes descobertas de minas em Goiás e Paracatu.
Dominador, com fama de imbatível, esparsos e já aceitando a vizinhança do branco, os caiapós/cataguás passam a servir de instrumento dos bandidos que infestavam a região. Os bororós, da mesma maneira, acabam por tornarem-se agentes dos criminosos. Tornou-se perigoso o trânsito pelas estradas de Minas e Goiás, porque os índios salteadores reuniram-se aos escravos fugidos e assassinos foragidos. Na bacia do rio Paranaíba os bororós contavam com 18 aldeias e estavam reduzidos a pouco mais de 500 homens e mulheres e 330 crianças. A doença, a miscigenação com o branco e o preto, além dos maus tratos constantes, acelerou a decadência das outrora e altivas nações indígenas.
A partir de 1825 o branco invasor já considerava excessiva a terra reservada aos remanescentes indígenas – légua e meia para cada lado da estrada, desde o rio Grande até o Paranaíba. Em 1836 a Câmara de Araxá fez uma representação pedindo a dispersão dos índios aldeados em Sant’Ana do Rio das Velhas pelo receio de que eles, por sua barbaridade, se entregassem a excessos, como já havia acontecido. O pedido foi negado pelo Governo.
Ao certo, não podemos afirmar qual a tribo indígena que habitou, no todo ou em parte, o município de Patos de Minas. Peças de uso, até mesmo igaçabas (pote de barro para guardar mantimentos e/ou água), foram encontradas antigamente em alguns sítios. Thomaz de Aquino Nunes, octogenário que residiu à rua Major Jerônimo, falando dos tempos de seus bisavós, afirmava ter ouvido que “aqui era terra dos ‘carapós’, gentio muito feroz”.
Quais foram os primeiros brancos a alcançarem a região do Alto Paranaíba? Muitos vieram, sem deixar crônicas de sua passagem. Indiferentes à terra humosa e produtiva, buscavam as áreas sáfaras, as piçarras, que davam sinais do ouro e das preciosas pedrarias escondidas no subsolo. Com a abertura da picada de Goiás, em 1737, iniciou-se o povoamento da região. Até 1760, o caminho para Paracatu, que passava pelo atual território patense, nada mais era do que uma trilha à margem da qual habitavam poucos negros, no quilombo do Paranaíba².
O território das Minas Gerais foi então repartido por meio de cartas de sesmarias. O entrante requeria a terra ao governo obedecidas as determinações régias, e tornava-se o seu dono, podendo dispor da mesma, como bem lhe aprouvesse. O objetivo era fundar pousos para as tropas e para proporcionar segurança aos viajantes. Ao longo da picada de Goiás e de outra que ligava Pitangui a Paracatu, bem assim nas bifurcações e caminhos que se abriam pelos campos do planalto, através de passagens mais favoráveis, foi o Governo da Capitania de Minas Gerais concedendo sesmarias àqueles que desejavam fixar-se na região, iniciando-se, deste modo, o seu povoamento.
Em 1768 por aqui chegou Afonso Manoel Pereira³, viandante do caminho do Rio de Janeiro. Comprovada a condição de lugar sem donatário, encaminhou seu pedido ao governo, observando que “as terras no sertão das margens do rio Paranaíba são devolutas e servem de asilo aos negros fugidos dos moradores do Paracatu e Goiás”. No pedido solicitou três léguas de terra para estabelecer fazenda de gado vacum e cavalar. O título lhe foi dado a 29 de maio de 1770. Afonso Manoel se apossou de uma terra povoada. Os negros fugidos de seus senhores goianos e paracatuenses formavam uma pequena povoação às margens do Paranaíba, livres de pulseiras e colares e do temido tronco. Não se sabe quantos anos durou aquele homizio dos negros na beira do Paranaíba. O certo é que com a chegada de Afonso Manoel teve início ao destroçamento do refúgio, em refregas constantes, com mortes e prisões. Vinte e três anos depois da concessão, ele era senhor de vastíssima área de terras, muito além das três léguas obtidas – da Babilônia (Lagoa Formosa) aos Aragoens (entrada de Patos de Minas) até a Onça (algumas léguas além de Aragoens).
Naquela época, todo o território do Município de Patos de Minas compreendido à direita do Rio Paranaíba pertencia à Capitania de Minas Gerais e à sua comarca de Paracatu do Príncipe, e todo o território à esquerda do mesmo rio pertencia à Capitania de Goiás e ao Julgado de São Domingos do Araxá.
* 1: Leia “A Questão dos Índios”.
* 2: Leia “A Questão dos Quilombos”.
* 3: Leia “Afonso Manoel Pereira de Araújo: O Nosso 1.º Dono”, “Carta de Sesmaria de Afonso Manoel Pereira de Araújo”.
* Fontes: Domínios de Pecuários e Enxadachins, de Geraldo Fonseca; Patos de Minas: Capital do Milho, de Oliveira Mello.
* Foto 1 – Desembarque de Pedro Álvares Cabral em Porto Seguro, em gravura de autor desconhecido.
* Foto 2: Divisão administrativa do Brasil após a Guerra dos Emboabas, em 1708.
* Foto 3 – Desenho baseado em pinturas de Thomas Ender retratando antigos bandeirantes.
* Edição: Eitel Teixeira Dannemann.