INTELECTUALIDADE NOS PRIMEIROS TEMPOS

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AATEXTO: ZAMA MACIEL (1967)

Solicita-me a gente amiga da “Folha Diocesana” um estudo sôbre a intelectualidade patense dos primeiros tempos do município. Pouca cousa pode ser dita, já que o meio cultural na vilazinha sertaneja era extremamente pobre, como seja ser em todo êste despovoado sertão do planalto.

Ao investir-se dos forais de vila, em 1868, Patos desmembrava-se de Patrocínio, de onde pouca cousa podia nos vir. De Paracatu, sopravam melhores ventos, pois ali já floreciam alguns espíritos de escola e a instrução era bastante difundida entre as camadas populares.

Como na época não houvesse livros, as “cartas de fora”, isto é, as cartas que chegavam de outros lugares eram aproveitadas para que os aprendizes de literatura se exercitassem. E quem já lia uma “carta de fora” estava muito adiantado. As que vinham de Paracatu eram preferidas e disputadas, pois gozavam de fama de bem escritas.

Nos idos de 1853 a Câmara Municipal de Patrocínio representou à Assembléia Legislativa Provincial de Minas Gerais sôbre a necessidade da criação de “Huma Escola de primeiro grau de Instrução para o arraial – freguesia de Santo Antônio de Patos”. A escola foi criada em 7 de maio de 1853 e instalada em 3 de outubro de 1854, tendo como regente o mestre-escola Francisco de Paula e Souza Brêtas. O Padre Brito – vigário – informa, em 1855, ao govêrno que a frequência era 56 alunos. Assim começou a instrução em Patos de Minas e portanto os primeiros lampejos de cultura. A Brêtas sucederam Zeferino Americano de faria e Valeriano Rodrigues do Souto. Em 1882, foi criada a primeira escola para o sexo feminino, tendo na regência D. Maria Clara da Conceição.

Ao instalar-se a vila, nela residiam poucas pessoas que podiam ser qualificadas como de classe intelectual e a porcentagem dos que sabiam ler era muito baixa. Entre os homens que dispunham de regular bagagem de conhecimento podem ser citados: Jerônimo Dias Maciel, padre Antônio Estêves da Silva Capanema e o Padre Cândido da Rocha Camacho.

De Jerônimo Dias Maciel que foi o primeiro Prefeito de Patos restam-nos alguns documentos. Neles o autor revela notável precisão de linguagem, cultura humanística e pendores literários. Era professor de latim com licença do govêrno imperial, o que equivalia ao registro de hoje. O discurso oficial da instalação do Município foi por êle proferido.

O padre Antônio Estêves da Silva Capanema gozava da fama de fogoso orador sacro e possuidor de bela cultura humanística. De suas atividades literárias nada ficou. Era natural do município de Pitangui. Quando veio para Patos estava suspenso de ordens, já que se atritara com o Bispo de Mariana que não queria tomasse êle parte nas lutas políticas da sua terra natal. Aqui faleceu em 1875. Do padre Camacho quase nada se conhece. Foi vereador à primeira Câmara da Vila e deixou lembrança de homem culto e cidadão prestante.

Como vigário de Santa Rita, fixou residência no Município o Padre Kerdole Dias Maciel. Conta a tradição que era excelente orador, bom latinista e homem de variada cultura. Foi Deputado provincial, e em Patos, exerceu a advocacia criminal. Era muito cuidadoso no preparo de seus sermões e enfeixava-os em cadernos que depois de sua morte desapareceram por obra e graça de seu sucessor na paroquia de Santa Rita. O padre Kerdole faleceu em Santa Rita.

Por volta de 1880, regressa a Patos com o diploma de engenharia, dado pela Escola Central de Engenharia do Rio de Janeiro, o ex-aluno do Caraça Olegário Dias Maciel. Era dotado de notável Inteligência que o cultivo da matemática e do latim aprimorou. Não foi um literato, mas um homem de grande saber. Podia manter uma prosa em latim e redigia os seus trabalhos com maestria de linguagem. Dele ficaram os “pareceres” que ofereceu nos seus muitos anos de deputado. A sua plataforma política como candidato à Presidência de Minas foi considerada obra literária, ao lado de peça de valor político.

O Dr. Sabino de Almeida Lustosa, juiz de Direito da Comarca, aqui viveu largos anos e se distinguia como homem de inteligência e de saber. Brilhou nas letras jurídicas de Minas.

O primeiro jornal – O Trabalho – que se publicou em Patos, já em nosso século, mimeografado, teve como diretor o tipógrafo Fortunato Pinto da Cunha e como colaboradores os raros intelectuais da terra. Foi a primeira manifestação pública de vida literária. Na ocasião, Marcolino de Barros, Sabino Lustosa, Antônio Romero, Padre Macedo, Eufrásio Rodrigues, fundaram em nossa terra, o primeiro estabelecimento de ensino de gráu médio – O ATENEU. Teve vida efêmera, mas brilhante e proveitosa. Antes o padre Getúlio Alves de Melo tentara criar uma escola do mesmo gênero, mas fracassou por falta de professores e alunos.

Na primeira década do nosso século, despontaram novos valores, oriundos dos centros mais adiantados do país e quase todos filhos da terra. Aparecem Deiró Eunápio Borges, jornalista polêmico e de boa cultura humanística; João Gualberto de Amorim, também jornalista e orador; Adélio Dias Maciel, que colaborara no jornal “Cidade de Patos”, fazendo companhia a Eufrásio Rodrigues e a Marcolino de Barros. Nenhum desses intelectuais se dedicou à literatura, exceto Eufrásio Rodrigues, fogoso orador e poeta, publicando o pequeno livro de sonetos que intitulou “O JUBILEU”. Desta época ainda o jornalista Alfredo Borges que publicou, durante anos, o semanário “O COMÉRCIO”, jornal feito com muito capricho. Foi poeta de boa veia e publicou os seus trabalhos em seu jornal. Os irmãos Agenor Dias Maciel e Jacques Dias Maciel também pertenceram a esta geração. O primeiro era dono de boa cultura, mas não se dedicou às letras. Escreveu a primeira resenha histórica do Municipio, onde se revela manejador escorreito da linguagem escrita. O segundo, o Dr. Jacques Dias Maciel, foi professor de humanidade e doutor em borla e capelo. Grande jurisconsulto, orador, passa por ser a mais completa figura de intelectual que Patos produziu. Infelizmente, grande parte de sua vida, passou-a nos grandes centros. Foi poeta de valor porém deixou que suas composições de môço se perdessem. Nenhuma obra publicou, nem mesmo as suas três teses de concurso para professor na Faculdade de Direito de Belo Horizonte, trabalhos que lhe deram merecida fama.

Por aqui andou durante algum tempo o médico Dr. Alencar, fino espírito de poeta, pertencente à família do romancista José de Alencar, de quem era sobrinho. Publicou em jornal de Dôres do Indaiá, tremendo artigo contra a nossa humilde cidade, de onde saíra meio corrido devido às suas intemperanças.

O professor Modesto de Melo Ribeiro pode ser incluído como dos melhores espíritos desta época. Escreveu com facilidade em estilo limpido e agradável. Nada publicou. Houve outras pessoas que apreciavam as belas letras, mas não as cultivaram. O meio era pequeno e atrasado. Não comportava atividades literárias. E as reminiscências que vão acima chegam até a abertura do Grupo Escolar “Marcolino de Barros”, em 17 de junho de 1917, acontecimento marcante no desenvolvimento intelectual de nossa cidade.

* Fonte: Texto publicado na edição de 24 de maio de 1967 do jornal Folha Diocesana, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de (LEPEH) História do Unipam.

* Foto: Oquerolanomundo.com, meramente ilustrativa.

* Edição: Eitel Teixeira Dannemann.

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