VINGANÇA DO ATANAGILDO, A

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O empresário Atanagildo, morador nas imediações da Avenida Marabá, já não estava suportando mais o atroz ronco de motos com escapamentos alterados, principalmente nas noites e madrugadas. Já havia conversado algumas vezes com o prefeito e também com alguns vereadores, em vão, pois nenhum deles tomou providências para acabar com a zorra. Chegou a sugerir uma lei obrigando todas as motos a só trafegarem pela zona urbana com escapamentos regulados. Em vão. Depois de anos de aborrecimentos, decidiu, juntamente com amigos que igualmente estavam injuriados com o problema e sabedores da inércia dos políticos, promover um churrasco para 18 convidados especiais: o inerte prefeito e os 17 inertes vereadores, somente eles, sem parentes, amigos, assessores e muito menos representantes da imprensa. Ia ser um churrasco exclusivo para os 18.

E que churrasco! Como dinheiro não era problema para a turma dos insatisfeitos, a festança aconteceu no sítio do Atanagildo, distante poucos quilômetros da Cidade, regada a muita cerveja, uísque, cachaça, diversos tipos de carnes de primeiríssima e até rã importada da Argentina e ainda caviar do Irã. Churrasco de arromba! Entre vários assuntos parlamentados, óbvio, o ronco das motos não ficou de fora. E foi nessa que o anfitrião-mor convidou os políticos para conhecerem o campinho de futebol.  Chegando lá, estranharam a presença de 18 estacas de dois metros de altura cada uma fincada no gramado em linha reta distante um metro uma da outra. Foi quando perceberam que os anfitriões, igualmente 18, cada um estava com um revólver na mão.

Em meio a xingamentos e ameaças jurídicas, cada um dos políticos foi amarrado num poste, tão bem amarrados que só conseguiam mover os olhos. Só pararam com os xingamentos e ameaças jurídicas quando ouviram um som ensurdecedor se aproximando. Em poucos minutos, chegaram 18 motos com os escapamentos totalmente abertos. Cada moto, com o tanque cheio, teve o pneu traseiro acondicionado num tripé e o escapamento voltado para cada um dos políticos. Os arquitetos dessa malvadeza, devidamente com protetores auriculares, aceleraram ao máximo as motos, travaram os aceleradores e se mandaram. Os vitimados não puderam ouvir as palavras do Atanagildo:

– Aproveitem, cambada de inúteis, sintam até na pleura o quão desgracento é o som de motos com escapamentos alterados. Aproveitem, cambada, sintam o que o povo sente diariamente com esses desgraçados motoqueiros, aproveitem, cambada…

Foi nesse momento que o Atanagildo sentiu umas cutucadas no ombro. Abriu os olhos e se deparou com a esposa ao lado lhe dizendo:

– De novo, marido, sonhando com motos estourando os tímpanos do prefeito e dos vereadores?

Atanagildo suspirou longamente e, antes de tentar pegar no sono outra vez, murmurou:

– Ô disgrama, foi só mais um sonho!

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 06/06/2014 com o título “Antiga Rodoviária no Final da Década de 1970 − 1”.

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