Certa vez, no tempo em que o Bar do Cochila¹ funcionava na Rua José de Santana ao lado do Posto Ipiranga, onde hoje é o prédio da UAI, adentrou ao recinto o Epaminondas. Encostou-se ao balcão e pediu duas doses de pinga em copos separados. Durante uns 20 minutos sorveu as duas doses acompanhadas de um gorduroso naco de torresmo. Daí em diante, de segunda a sexta, por volta das seis e meia da tarde, o sujeito chegava, tomava as duas doses de pinga em copos separados, comia um torresmo, pagava a conta e se mandava. Depois de alguns meses, o Cochila já estava intrigado com aquilo, chegando ao ponto de não resistir em saber por que aquilo:
– Desculpe, não me leva a mal, mas por que você não toma a pinga num copo só?
E o Epaminondas explicou:
– É que eu tinha um amigo do peito e todas as vezes que saíamos do trabalho a gente passava naquele boteco mais lá embaixo e cada um tomava uma pinga e eu comia um torresmo. Aí ele morreu e isso está sendo pesado demais da contra pra mim, porque a gente era como irmãos. Então, em homenagem ao meu amigo, eu tomo a minha pinga e também a dele. Passei a fazer isso aqui no seu bar porque não consigo mais entrar no outro, de tanta dor no coração.
O Cochila chegou a se emocionar com a narrativa do sujeito. E assim o tempo foi passando e toda vez que o homem entrava no bar ele nem precisava pedir: as duas doses de pinga e o torresmo eram prontamente servidos. Até que um dia, quando o Cochila depositou no balcão as duas doses de pinga, o Epaminondas afastou um copo dizendo que a partir daquele dia só seria uma dose. O Cochila, surpreso, quis saber o porquê. E o Epaminondas respondeu serenamente:
– É que eu parei de beber, e agora eu me imagino sendo meu amigo bebendo a sua dose.
* 1: Leia “Leoclides Araújo de Menezes (Cochila)”.
* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.
* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 28/02/2013 com o título “Prefeitura em 1916”.