Sou duplamente privilegiada. À esquerda, a Rádio Clube de Patos. À direita, a residência da família do Cel. Arthur Thomaz de Magalhães. Viver todos esses anos ao lado da emissora pioneira presenciando as idas e vindas em meu passeio daqueles que a fundaram e dos profissionais que a formataram é realmente um enorme privilégio. Quantos deles se juntaram à frente do meu alpendre para parlamentarem sobre o dia-a-dia da emissora e de suas próprias experiências! Quantas novidades fiquei sabendo antes que se espalhassem pela Cidade! Sobre a Usina das Lages, muito se discutiu aqui à minha frente¹. Sobre o assassinato do Tito Silva², ouvi até coisas que não devia. Política, então, Nossa Senhora da Abadia, quando chegava época de eleição o bicho pegava. E o coronel³, o nosso mestre do cinema, aquele que tanta alegria nos proporcionou? Bons tempos, tempos que se foram para sempre. Meu interior, antes festivo e apinhado de gente, agora se vê calmo e sereno. Olhando em volta, percebo a enorme transformação nesta avenida. Minhas antigas colegas estão desaparecendo, cedendo lugar ao inexorável progresso. Felizarda é a casa do Olegário Maciel, que foi tombada pelo Patrimônio Histórico e não pode ser demolida. Quanto a nós outras, não terão dó e nem piedade!
Ó bela avenida, você é o berço da Cidade, você que já foi Municipal e Liberdade, felizes foram aqueles que te produziram tão larga. Minhas paredes ouviram com atenção os comentários sobre quando o Prefeito Camundinho foi obrigado a mudar seu nome para Getúlio Vargas4. Na marra, né! Você, avenida, aos poucos está perdendo as características dos idos tempos. Casas e casarões vão, inapelavelmente, sendo substituídos por edifícios, praticamente todos com m² caríssimo. Era para eu me sentir feliz por fazer parte de um ambiente tão valorizado, mas não há a mínima possibilidade de ser feliz, por saber que meu tempo é apenas questão de tempo para chegar ao fim. Toda vez que minha dona sai com seus cãezinhos sinto uma espécie de crise existencial. Eu sei que um dia ela irá para sempre. Cada andar construído de qualquer prédio ao meu redor é um sinal de que um dia serei demolida. Ó, quanta História guardo em meu interior que, infelizmente, se perderá na poeira da inutilidade. Mas já sou História, cada tijolo meu é parte da História de Patos de Minas. E quando me ruírem, deixarei saudade!
1: Leia “A Questão da Usina das Lages”, “Chegaram as Máquinas da Usina das Lages” e “Usina das Lages Está Pronta”.
* 2: Leia “O Assassinato de Tito Silva”.
* 3: Leia “Cine Magalhães”, “Arthur Thomaz de Magalhães” e “Antiga Casa do Cel. Arthur Thomaz de Magalhães”.
* 4: Leia “Ingerência do Estado Novo no Mapa da Cidade”.
* Texto e foto (10/06/2018): Eitel Teixeira Dannemann.