No final da década de 1940, o seriado Marte Invade a Terra arrepiou os cabelos dos patenses. Toda noite de domingo o Cine Tupan apresentava um capítulo. Foram 15 sessões de muitos gritinhos e suspiros. Tem gente remanescente daquele fuzuê que ainda espera a real visita dos marcianos. Se eles vão chegar ou não são outros quinhentos, o que importa é que foi na temporada da série que o Zé Lima conheceu a Ambrósia. Foi amor à primeira olhada, de ambas as partes. O começo do namoro, como de praxe, foi naquela base do casal na sala de estar, sentados sem estarem encostados um ao outro e uma conversa totalmente sem tempero com os pais da donzela.
Não mais que dois anos e pouco de namoro o Zé Lima pediu a moça em casamento. O sim proferido pela Ambrósia saiu com uma precisão cirúrgica. Com a sapiente aprovação dos pais da manceba, afinal, como o mancebo não era um espora quebrada, fazia parte de uma das extirpes que promoveu o progresso da Cidade, o casório foi marcado e , mais do que nunca, esperado pela pompa. Antes, porém, a Ambrósia foi obrigada a jurar mil vezes ao Zé Lima que não diria sim a nenhum outro homem. Ela jurou, sim, com convicção, que nunca, jamais e em tempo algum, diria sim a outro homem.
O casório agitou a pequena Patos de Minas daquela época. A saudosa antiga Matriz estava abarrotada de gente. Sim, de gente, pois tinha poucos cachorros e gatos. Toda aquela gente, incluindo os cachorros e gatos, prestou assaz atenção quando o padre perguntou ao noivo:
– José Lima Fulano de Tal, é de sua livre vontade casar com Ambrósia Sicrana de Tal?
O sim do Zé Lima, de tanta satisfação, foi ouvido lá na Mata dos Fernandes e imediações. Então o padre perguntou à noiva:
– Ambrósia Sicrana de Tal, é de sua livre vontade casar com José Lima Fulano de Tal?
Eis que a Ambrósia não respondeu. Todos os presentes imaginaram logo que a moça estava acometida de tamanha emoção que não conseguia pronunciar a palavra. O padre também pensou assim, e por isso repetiu a pergunta:
– Ambrósia Sicrana de Tal, é de sua livre vontade casar com José Lima Fulano de Tal?
E nada da Ambrósia responder. O padre perguntou pela terceira vez, e nada; pela quarta vez, e nada. O assombro já tomara a todos, um murmúrio tétrico pairava no ar. O Zé Lima, coitado, já estava mais branco que cal virgem. Enquanto o padre perguntava pela quinta vez, lágrimas e mais lágrimas escorriam do rosto de Ambrósia. Não teve jeito. O padre encerrou o casamento e retirou-se para a sacristia. Enquanto os presentes olhavam atônicos para o casal, Zé Lima, totalmente aturdido, também às lágrimas, perguntou à amada porquê ela o rejeitara. Ambrósia então o lembrou:
– Ó meu amado Zé Lima, você me fez jurar que nunca, jamais e em tempo algum, eu diria sim a outro homem. Pois assim eu não pude dizer sim ao padre.
O noivo, mais rápido que um corisco no céu tempestuoso, correu até a sacristia e explicou tudo ao padre. A noiva, devidamente autorizada a abrir uma exceção em relação ao padre, finalmente disse o sim. A Ambrósia e o Zé Lima viveram felizes por muitos e muitos anos. Seus descendentes que o digam.
* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.
* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 28/02/2013 com o título “Prefeitura em 1916”.