Estranho paradoxo é a morte de um santo, a morte do justo. O justo não morre. Um santo não morre – “Vita mutatur, non tollitur”. Existe realmente apenas uma mudança de posição: da vida terrena, passa o justo para a vida eterna. A íntima união que liga o homem a Deus, pela graça divina, não sofre dissolução de continuidade. Esta mudança não nos deve entristecer como àqueles que não têm fé – “ut non contristemini, sicut et ceteri qui spem non habent”.
Mons. Manoel Fleury Curado apenas deixou esta vida terrena, vida de torturas físicas e velada da visão beatífica e transpôs os umbrais da eternidade, indo juntar-se aos anjos e santos do céu, para o eterno repouso em Deus.
Foi a cidade de Corumbá, no Estado de Goiás, que viu nascer, a 18 de fevereiro de 1887, o robusto menino, que na Pia batismal receberia o nome de Manoel Fleury Curado. De família ilustre francesa, Deus lhe deu por pais o nobre Cel. Luiz Fleury de Campos Curado e D. Maria Joaquina Fleury Curado, esposa de segundas núpcias.
Ingressando no Seminário, iniciou os estudos preparatórios para a vida sacerdotal, em S. Paulo, em 27 de junho de 1903, indo, em 20 de abril de 1904, completá-los na velha Itália, no Colégio Pio Latino Americano, seguindo para lá na companhia de D. Eduardo Duarte Silva, bispo de Goiás.
Recebeu a Primeira Tonsura em 6 de março de 1909, passando desde já a usufruir dos privilégios do clero. As ordens menores foram-lhe conferidas a 27 do mesmo mês de março. Em 28 de outubro do ano seguinte, recebe o subdiaconato na igreja de S. João de Latrão. A 15 de abril de 1911, já era Diácono da igreja, dando passo resoluto que honraria até a morte. É ordenado sacerdote em 26 de outubro de 1911, na igreja de S. João Berkmans, do Colégio Germânico-Úngaro, pelo Cardeal Vigário D. Pietro Respighi. No dia seguinte celebra sua Primeira Missa nas Catacumbas de S. Calisto, sobre o túmulo sagrado de Santa Cecília.
Em 14 de julho de 1912, o Pe. Manoel Fleury Curado regressa ao Brasil, aceitando a paróquia de Araguari como primeiro campo do seu imenso apostolado. É nomeado Cônego Honorário do Cabibo de Uberaba em 7 de setembro de 1914 e já no ano seguinte, torna-se Cônego Efetivo do mesmo Cabibo uberabense.
Vagando a paróquia de S. Antônio de Patos, com a morte do virtuoso Cônego Getúlio (o Tio Padre), Pe. Fleury foi designado para substituí-lo tomando posse em 28 de fevereiro de 1920, em meio a estrondosa e cordial recepção de seus novos paroquianos, que estavam recebendo de Deus uma preciosa dádiva do céu.
Em 21 de junho de 1936 é nomeado Monsenhor Camareiro Secreto de S. Santidade o Papa Pio XI, e reconfirmado nestas honrarias pelo Papa Pio XII, em 2 de julho de 1945. Em 1949, movido por um justo desejo de descanso, parte para Araguari, onde permanece durante três anos.
Após a morte do Pe. Alaor Porfírio de Azevedo, em 1952 retorna a Patos de Minas dia 27 de agosto, numa permuta de cargos com Pe. Antônio Resende. É recebido de braços abertos pelos seus saudosos paroquianos e velhos amigos, que sempre lhe devotaram aquele amor e carinho de filhos bem-amados. Aos 30 de outubro de 1955, é o Vigário Geral da Nova Diocese de Patos de Minas para colaborar com D. José André Coimbra. Sobrecarregado de trabalhos e sentindo já o peso dos anos, em 20 de abril de 1958 deixou o Curato da Catedral, aceitando apenas o zelo das Capelas rurais da Paróquia de Santo Antônio.
Sábio orientador e valoroso guia das almas, cada vez mais conquistava os corações para Deus, no exemplo de uma vida de oração, de penitência e dedicação. Não sabendo dizer “não” a quem quer que fosse, compartilhava com os amigos de suas ansiedades e trabalhos, sendo sempre querido por todos. Nunca poder-se-ia dizer tudo de Mons. Fleury. Foi bem feliz D. Jorge ao dirigir-se a seus diocesanos, dizendo-lhes: – O que eu vos poderia dizer mais sobre este homem de Deus? Vós bem o conhecestes e sabeis dele melhor do que eu.
Realmente Mons. Fleury é um livro aberto no coração de todos que conviveram com ele. O dia 2 de julho de 1981 estava assinalado nos anais de Deus para nos tirar tamanha preciosidade. Fica para nós o exemplo do apóstolo, o zelo do obreiro da seara do Senhor, a santidade do ministro de Deus, o carinho de um pai dedicado a seus filhos espirituais, o luzeiro da fé e da graça divina, preciosidades que ele sempre soube repartir a seus filhos queridos, que carregou no coração para a Pátria eterna do céu. Nesse dia 2 de julho, que ficará na eterna gratidão dos patenses, Mons. Manoel Fleury Curado ouviu aquela voz mansa, suave e benfazeja, abrindo-lhe as porta do céu: – “Euge serve boné et fidelis, intra in gaudium Domini tui”.
* Fonte: Texto publicado com o título “Morre um Santo?” na edição de 18 de julho de 1981 do jornal Boletim Informativo, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto: Arquivo da Escola Estadual Monsenhor Fleury.