O destino dos homens e das coisas tem surpresas imprevisiveis: muitas vezes nos dá de presente uma grande satisfação, para, momentos após, mergulhar o nosso espirito na dôr ou na saudade. A cidade viveu, no dia vinte p. passado, uma destas contingencias. Desde cedo, os seus habitantes, entoando um mesmo hino de alegria, preparavam-se para receber festivamente os seus irmãos expedicionarios que regressavam da Europa¹. A ancia com que aguardavamos o regresso desses bravos, cumulou às 16 horas daquele dia, quando as primeiras bombas e o espoucar constantes de fogos que subiam de todos os setores da urbus, anunciavam o seu regresso.
As comemorações prolongaram-se por toda a tarde e noite-à-dentro, quando, mais ou menos às 20 horas, estampidos diferentes se fizeram ouvir em um dos setores da terra. Lá em cima, eram os fogos da alegria, as bombas e os tiros que anunciavam vida. Cá em baixo, eram os estampidos da dôr, os tiros portadores da morte. Estava consumada a tragedia no lar de Benedito Vaz de Melo, em cuja compania morava a familia de seu sogro, Amancio Simão Caetano. Ignoramos o motivo que levou a familia a desentender-se. O fato, porem, é que Benedito Vaz de Melo, dando ao gatilho de seu revolver, prostou sem vida sua velha sogra, Da. Maria Silveira de Jesus e um filho desta, moço de 19 anos. O velho Amancio Simão Caetano, enfurecido ante a banalidade da cena, tira, áto continuo, a porretadas, a vida do genro que acabava de assassinar sua mulher e seu filho.
A noticia que correu célere, levou ao palco da tragedia quasi que a cidade inteira. O nosso espirito, horas a fio, não poude se libertar do espanto de que foi dominado, ao depararmos numa mesma sala, tres cadaveres de uma só familia, rodeados de uma viuva e orfãos pequeninos. Foi com este espanto que a cidade aguardou os funerais, os quais vieram por em relevo não só o espirito elevado de solidariedade humana do povo, sinão tambem denotar a firmeza de solidariedade da classe dos chauffeurs de que Benedito fazia parte, acompanhando incorporados o interramento, evidenciando por esta forma que os chauffeurs de Patos estão unidos, possuindo um élo de classe admiravel sob todos os pontos.
O Diretor desta folha, que prestou toda a assistencia possivel à familia enlutada, na qualidade de Presidente da Associação dos Trabalhadores em Transporte Terrestre (Associação dos motoristas), agradece ao povo e de modo especial aos membros da Associação, concitando-os a permanecerem sempre unidos, para que, inseparaveis, consigam o objetivo de seus mais altos destinos.
* 1: Leia “Força Expedicionária Patense” e “Chegada de Dois Expedicionários Patenses, A”.
* Fonte: Texto publicado com o título “Drama de Sangue” na edição de 26 de agosto de 1945 do jornal Folha de Patos, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto: Itaberabanoticias.com.br.