Além de exímio mecânico, o Miquinho (apelido herdado de seu pai, o José Alves de Oliveira, mais conhecido por Zé Mico, sem nenhum favor foi um dos mais famosos mecânicos da região) gostava muito de pescaria. Como sempre, muito habilidoso, inteligente e criativo. Nas horas vagas ocupava-se ora em modificar uma vara de fibra própria para pesca, ora em refazer uma braçadeira, cujo amarrilho está cedendo ou então substituir uma ponteira que não está funcionando bem. Sua roda de amigos é grande e os encontros na Casa Capivara eram frequentes, onde cada um contava suas peripécias pescais. Num dia, foi chegando o Paulo Batista, mais conhecido por Paulinho Pintor. Cumprimentando alegremente a todos foi logo perguntando:
– Vocês conhecem o Troi, o cão perdigueiro do meu primo Miquinho?
Todos olharam para o Miquinho, que fez uma cara de surpresa, e o Paulinho continuou:
– Bem, também não têm obrigação de conhecer, e até, aliás, já morreu. O que pretendo dizer é do tempo que não era proibida nenhuma caçada e havia aqui pertinho perdizes e codornas, como se veem pardais no meio da rua. Quero destacar aqui a fidelidade do Troi. Certa vez o primo foi caçar no Chapadão de São Pedro, levando o famoso perdigueiro. Já era bem de tardinha, o cerrado engrossando cada vez mais, quando o Troi deixou-se enganar por uma siriema e desapareceu na noite. Procurou-se o cão por vários dias e nada. O Miquinho ficou muito sentido e teve que conseguir outro. Dois anos mais tarde, indo pela mesma região, eis que encontra um esqueleto de cão, em pé, bem armadinho, tendo à sua frente outro esqueleto, que indicava ser de uma perdiz. Foi quando o primo, com lágrimas nos olhos, compreendendo toda a tragédia que havia acontecido com o falecido Troi, exclamou:
– Eta cachorro bom e cumpridor de seu dever. Ficou me esperando, e como não apareci, ficou no seu posto até acontecer isso!
E o melhor de tudo é que, diante daquela cena, e por força de hábito, ordenou:
– Vamos, Troi!
O esqueleto então se desarmou todo, demonstrando quanto o referido cão obedecia a seu dono. Só não pôde segui-lo!
* Fonte: Texto publicado sem título na coluna Todo Pescador Mente da edição de 18 de agosto de 1979 do jornal Boletim Informativo, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto: Muraljoia.com.