DALLA E SEU “QUALQUER RUÍDO”

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DSC01768Roberto Antônio de Deus, o Dalla, aprendeu violão com o Prof.º Zico Campos. Começou a compor em 1968 no 1.º Festival da Canção de Patos. Em 1975, estreou no palco no Teatro do DCE-UFMG no show “A Nova Música Mineira”, que reunia os melhores músicos de Minas. Dai nasceu o Grupo Catarse, que fez vários shows em BH e interior de Minas. Desfeito o Catarse, Dalla continuou seu trabalho de composição e shows, mas sem qualquer pretensão profissional.

Compositor nato, quer dizer, com uma força intuitiva muito grande, abandonou os estudos de violão e se dedicou à pesquisa de elementos para suas composições. Apaixonado pela música regionalista e pelos sons eletrônicos ele se aprofundou musicalmente dentro deste contraste. O que aliás vem desde menino, pois cresceu ouvindo Elvis Presley, Beatles, Luiz Gonzaga e Os Cantores de Ébano. Essa dualidade, regional-contemporâneo é um importante elemento diferenciador de seu trabalho, notando-se às vezes melodias que lembram uma toada sertaneja executada em ritmo e harmonia próximas do rock.

Seu encontro com os poetas, principalmente Wander Porto e Wilson Pereira, deu o toque final no seu trabalho. São letras ótimas, intimistas e universais, com a força de quem quer sempre se superar. Parece que letra e música (em alguns casos), nasceram na mesma fôrma.

Do “Projeto Prata da Casa”, da FUCAP, no dia 04 de setembro de 1983, no auditório da Rádio Clube de Patos, Dalla apresentou o show Qualquer Ruído. GIOVANI PEREIRA comenta:

“Qualquer Ruído”. Quem foi gostou e, tenho certeza, nunca vai se esquecer. Momentos de rara beleza e muita harmonia. Foram treze músicas executadas com toda perfeição e, o melhor, com nenhum problema de mixagem. Todos os instrumentos e vozes estavam bem dosados, fazendo bem aos ouvidos e sentidos. Mesmo quando uma corda do violão partiu e se esperava a troca, o público reagiu rápido, quando veio o “Malandro, tire o ray-ban”. A vibração esteve alta no auditório da Rádio, durante quase duas horas de duração do show. Assim, resumindo posso dizer o que senti, e vi ali. Um Dalla maduro e muito seguro, no caminho que vem trilhando.

Um músico com identidade, que não esconde a influência que herdou do Rock, fazendo deste, o suporte para dar um recado bem regional e, às vezes também universal. Explora com a mesma desenvoltura, ora o tema urbano, quando vem com o “Malandro, tire o ray-ban”, ora o rural, com “Marcas do Mato”.

“Qualquer Ruído” é o primeiro show que Dalla faz em Patos, depois que voltou a residir aqui. Contando com a colaboração de músicos patenses, já há muito conhecidos do público, a banda foi formada por Anísio Dias (guitarra), Heleno Versiani (bateria), Waguinho (contrabaixo), Márcio Ávila (viola de 10) e, após dez anos fora do palco, em ótima forma, Humberto Castelo nos teclados. Contou ainda com a participação especial de Kátia Rabelo, em “Brutal”, “Qualquer Ruído” e “Tico-Tico”. Kátia, que também fará um show em breve, no projeto “Prata da Casa”, vem se revelando em cada apresentação como uma grande intérprete. Impecável na apresentação com arranjos bem cuidados, assim foi a atuação da banda.

Dalla, mais uma vez deu um exemplo. Artistas de Patos, acredito que dentro em breve, atingirão a maturidade e divulgação, como merecem, a cultura dessa cidade em outras paragens. Pois coisas boas, têm sido feitas e sua valorização não tardará muito.

JOSÉ AFONSO também comentou o show:

Como eu já conheço o Dalla há bastante tempo (desde o seu primeiro festival, quando participou como compositor, em 1968), lembro-me bem dele no Catarse, quando o grupo esteve aqui etc., não esperava surpresas. Tinha comigo que seria um grande show, mas com um trabalho que já era conhecido por mim e por quase todos os patenses. Engano meu.

O que eu assisti possuía uma roupagem toda nova, uma forma descontraída de transmitir sua proposta musical. Foi um show vibrante e até mesmo incisivo, como deve ser a música em certos momentos.

Foi um canto aberto, acessível a quem quisesse entendê-lo. Um Dalla simples, despojado de recursos que não os próprios (e bastante, diga-se de passagem), cantando o amor, a natureza, com a qual se identifica tão bem, as coisas do nosso tempo, do mato e da vida. É, o canto de Dalla é um canto de vida, de esperança…

Ouvi alguém dizer que a “música era pauleira”. Sim, houve muito barulho! Mas, como ritmo, como expressão, um rock com características exclusivas do artista que se apresentava. E o som às vezes precisa ser agressivo, para poder transmitir certas mensagens.

Logicamente não foram todas as pessoas que assistiram ao show, que sentiram a mesma coisa que eu. Mas é isso mesmo.

Um show com grande conteúdo pelas grandes composições de Dalla e seus parceiros: um grupo de peso formado pelo mano Humberto Castelo nos teclados, Anísio Dias na guitarra (também aí ele é bom), Márcio Ávila na viola de 10, Waguinho no baixo (músico que abriu o projeto) e Heleno Versiani na bateria. E Dalla, a estrela máxima da companhia ou da equipe, como queiram. A direção foi de Wilson Morais; som CADORO; luz CET; cenários Vicente Nepomuceno. Tudo isso aí foi realizado na medida exata. Sem problemas.

Propositadamente, deixei prá falar no final da participação da grande cantora Kátia Rabelo, ao lado de Dalla. Uma convidada muito especial. Sem dúvida, a bela voz e o talento da Kátia, preenchendo todos os espaços do palco com a sua interpretação, enriqueceram o show “Qualquer Ruído” e enriquecem qualquer show que ela participar.

Prá finalizar, a minha decepção quanto ao público. Muito fraco. Parece que o povo acostumou-se com o Dalla cantando de graça. Que é isso, minha gente? Afirmo que Dalla precisava de um show bem produzido como foi esse. Agora, é preciso lembrar que o “Prata da Casa” existe para o povo. Já é tempo de valorizarmos mais os nossos artistas, quando precisamos gastar algum dinheiro. Cadê o estímulo ao trabalho dos mensageiros de arte e dos que nos propiciam meios para tê-la ao nosso alcance, mediante um trabalho sério e profissional?

É isso aí.

* Fonte: Revista A Debulha, edições n.º 75 (31/08/1983) e 76 (15/09/1983), do arquivo do Laboratório de História do Unipam.

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