TEXTO: J. S. ALVES DE OLIVEIRA (1983)
Deu piolho na cabeça do Arlindo, é só o que posso imaginar.
Vejam vocês que eu aqui em meu habitat, muito anterior ao surgimento desta cidade, exuberante e linda sem ser vaidosa, fui despertada por notas musicais emitidas pela flauta de um “sátiro” (semi-deus da Mitologia Grega) que por distração num destes momentos raros, deixou seus costumeiros jogos libidinosos e com a “cuca” sem os costumeiros afrodisíacos, deu uma espiada no “PROJETO” se assim podemos chamá-lo, que se encontra em uma gaveta de escrivaninha do Departamento de Engenharia e Arquitetura da Prefeitura Municipal de Patos.
Como é do feitio dos deuses, porque só a eles são dadas tais liberdades, veio a mim espero, com uma de suas divertidas jocosidades.
Nota após nota, inteirei-me de tudo.
Saibam vocês, que vão matar-me.
É o que pretendem com o tal “PROJETO”. Além de diminuírem o meu restrito espaço vital, tão lesado por administradores tão desavisados, vão aterrar-me até transmudar-me de lagoa que ainda sou, em ridículo “espelho d’água” e ainda por cima com duas ilhotas artificiais no meu interior, como se isso fosse fácil e barato de se concretizar.
A justificativa para tais ilhotas, é para que nelas garças e outros palmípedes venham pousar, como se já não o fizessem desde os primeiros tempos e lhes garanto em maior número e variedade.
Como se isso já não bastasse, em minha volta vão construir, vejam só se cabe: uma aquário, campo de futebol, pista para ciclismo, Cooper, parque infantil, bosque, viveiro e imagem só, um teatro grego. Haja dinheiro e talento…
Daqui do meu lugar de direito, pois como disse e repito, sou anterior a todos vocês e além do mais, já lhes dei provas de potência; basta olhar as fotografias do último período chuvoso; estão aí para não me deixar mentir.
Arlindo, enquanto eu tiver vida, lutarei e desafio para que me drenem e aterrem, pois o Plancton que acumulei desde os tempos de menina, não suporta peso algum (vejam as ruas ao meu redor, afundaram) e igual destino terão tudo que construírem em meu espaço.
Por isso, Arlindo, procuro a sua proteção. Atribuo-a às forças dos deuses. Devolva a minha grandeza e beleza, faça de mim um lugar lindo de se ver. Ver coisas lindas dá prazer. Foi para isso que fui criada.
Deixe-me viver, é o que lhe peço.
Nota: Deixo aqui uma alternativa: o povo necessita de lazer, é uma verdade, ainda mais que o campo do antigo Tupi, foi negociado com a CEMIG: tudo bem.
Crie outro espaço para além dos eucaliptos da Casa das Meninas. Seria o “Campo de Marte”, parodiando a Roma Antiga. Aí sim, construa campos e mais campos de futebol, quadras, teatro de arena, bosques, parques infantis, churrasqueiras, tudo que for possível. Lembre-se que teremos novos períodos eleitorais e o povo quase tudo sabe e quase tudo vê.
Atenciosamente,
Lagoa dos Japoneses.
* Fonte: Texto publicado na edição n.º 78 de 15 de outubro de 1983 da revista A Debulha, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto: Colorirgratis.com, meramente ilustrativa.