Como diz o ditado, cada doido com a sua mania. Eu tenho algumas, e acredito que também todos têm as suas. Uma das minhas manias é, de vez em quando, pelo menos uma vez por mês, entrar num ônibus coletivo e percorrer todo o itinerário, apreciando as características das vias, das casas e das pessoas. Creio que nesses últimos anos já percorri todos os itinerários disponíveis e já repeti muitos deles, oportunidade em que pude perceber as mudanças físicas dos bairros com o passar do tempo e assim acompanhar a transformação da Cidade. E em cada parada num ponto, não perco tempo em fotografar algo considerado importante.
Numa dessas andanças, estava eu no Bairro Morada do Sol quando, num determinado ponto, percebi pela janela um jovem aparentando fisicamente uns 15 anos de idade segurando a mão de um menino, muito do provavelmente seu irmão. Antes de entrar no ônibus, deu para ouvir o diálogo entre os dois:
– Você não vai pagar passagem, por isso, se por um acaso o trocador – é, foi naquele não muito distante tempo que existia nos transportes coletivos a figura do trocador – perguntar quantos anos você tem, você diz que tem cinco.
– Mas eu tenho seis.
– Eu sei, frogoió, mas se o motorista te perguntar quantos anos você tem, diz que tem cinco, pra não pagar a passagem, deu pra entender? Vamos testar: quantos anos você tem?
– Cinco.
Combinados, os dois entram no ônibus e realmente o trocador resolveu perguntar pela idade do menino. Este respondeu corretamente que tinha cinco anos, só o mais velho pagou a passagem, mas o trocador e até o motorista deram a entender de que não acreditaram no garoto. E eu sentadinho no meu lugar percebendo que o trocador a todo momento dava uma manjada no menino, e o coitado do menino, que já estava ficando nervoso, cutucou o irmão, que também começou a ficar nervoso.
O ônibus seguiu o seu trajeto com o trocador manjando os dois prováveis irmãos. No ponto situado no quarteirão da Rua Olegário Maciel entre sua colega Major Gote e a Avenida Getúlio Vargas, os dois jovens se levantaram para o desembarque. Se era ali mesmo o local do desembarque dos dois ou se foi por constrangimento das manjadas do trocador, não fiquei sabendo, mas antes de descer pela porta central, o trocador perguntou:
– Ô menino, você disse que tem cinco anos, diga quando você vai fazer seis anos?
Foi o irmão que respondeu secamente:
– Quando ele chegar lá no passeio.
Eles desceram, eu continuei o meu trajeto dentro do ônibus e a vida seguiu em frente!
* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.
* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 25/02/2020 com o título “Palacete Mariana na Década de 1960”.