Quando completou 16 anos de idade num sábado de outubro de 1971, ela ficou felicíssima com a calça jeans da marca Levi’s que ganhou de sua mãe. Até parece que a peça foi confeccionada exatamente para as medidas de seu corpo, de tão bem ajustada que ficou. Isso logo de manhã e por isso foi um verdadeiro martírio para a Ritinha esperar a noite chegar para encontrar com suas amigas no vai-e-vem da Rua Major Gote, que a bem da verdade não tinha mais o charme, o encanto e o magnetismo dos idos tempos. Às cinco da tarde começou a se aprontar com seus apetrechos embelezadores. Houve uma tremenda dúvida sobre a camisa ou blusa que usaria para um perfeito acompanhamento da calça. Só nessa, ela levou pelo menos uma hora e só se deu por satisfeita quando a sua mãe lhe indicou uma que ela concordou. Quando foi pegar a calça azul-anil no guarda-roupas, a tragédia: a pontinha de um prego até então despercebido causou um esgarço mínimo, mas o suficiente para a moçoila entrar em estado de desespero. Veio uma choradeira tipo cachoeira que nem os consolos da mamãe foram suficientes para estancar. Mas acabou por aceitar a triste realidade: não poderia usar a calça no vai-e-vem. Não, mil vezes não, ela tinha certeza absoluta de que seria ridicularizada pelas amigas quando vissem a sua Levi’s com aquele enorme rasgado, pois sabia que as amigas só usavam roupas da moda no vai-e-vem e sem um arranhão sequer. O tempo foi passando, a Ritinha foi se acalmando e se acalmou de vez quando a mãe lhe prometeu outra calça Levi’s novinha em folha sem um arranhão sequer. Então seu desespero passou, mas, psicologicamente abatida, não foi se encontrar com as amigas. A calça com o pequeno arranhão? Descartou. Peça que o mais miserável morador de rua usaria com garbo.
Entre as seis calças jeans que possuía, a Norma ficou em dúvida sobre qual usaria para ir ao Parque de Exposições assistir ao show de Chitãozinho e Xororó na Festa do Milho de 2018. Colocou as seis peças em cima da cama e ficou olhando com atenção para perceber qual delas tinha mais a ver com o show, pois sabia que a dupla sertaneja costumava usar calças jeans em seus shows. Mas a dúvida era enorme, porque ela considerava uma mais linda e moderna do que a outra, cada qual com uma tonalidade de azul, da mais desbotada ao anil escuro. Não aguentando a indecisão, mandou um zap para a amiga que logo veio em seu socorro. As duas ficaram pelo menos uma hora verificando cada uma das quatro calças até que optaram pela que tinha mais rasgos, sendo dois enormes e esfiapados em que as coxas ficavam totalmente de fora, a parte traseira toda arranhada e as duas bainhas esfarrapadas. Assim, modernamente vestida, na era da moda molambenta, a Norma, feliz da vida, foi apreciar a dupla sertaneja na Praça Park do Parque de Exposições, com a sua calça jeans que nem o mais miserável morador de rua usaria.
* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.
* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 25/02/2020 com o título “Palacete Mariana na Década de 1960”.