TEXTO: JORNAL O COMMERCIO (1913)
Dizia um piedoso escriptor que a esmola é a consolação dos que têm fè, è a columna da esperança, a consoladora das virtudes, e o remedio do peccado: è ella que nos reconcilia com Deus, ella nos faz favoravel o Juiz, e o torna nosso devedor. E’ Deus que nos dá os bens neste mundo, e é tambem elle que os recebe outra vez pelas mãos dos pobres. Quem não dá esmola, não tem o coração no céo, nem a esperança em Deus.
Temos, portanto, restricta obrigação de dar esmolas, a medida de nossas forças, si quisermos gozar dos favores do céo.
E qual é o coração tão duro que resiste à supplica de um mendigo aleijado, cego, coberto de andrajos e de feridas?
Quando praticamos um acto de caridade, temos a approvação dentro de nós mesmos, e a nossa alma que se sente, desde logo, possuida de immensa satisfação, como que aliviada de suas dores intimas.
Devemos dar esmolas; e que nunca saiam com as mãos vasias, os desherdados da sorte que vieram à nossa porta implorar, por Deus, uma codea de pão para mitigar a fome que lhe devora as entranhas.
Que o verdadeiro pobre encontre sempre em nós um amigo, um protector que lhe lance na alma palavras de conforto e de compaixão.
Si Deus nos deu os bens caducos d’este mundo, depositemos um pouco d’elles em as mãos do pobre, para que esse pouco seja o penhor do muito que havemos por isso de receber no céo.
Mas, saibamos dar, para que o nosso acto de caridade não se converta em maleficio.
Demos ao pobre, ao verdadeiro pobre, ao digno d’este nome, ao invalido para o trabalho, e não aos exploradores, aos preguiçosos que embora validos, querem viver á custa da caridade publica, como, infelizmente, temos alguns por ahi.
Praticamos um acto reprovado si a estes ultimos prestarmos auxilio, porque, dando lhes esmola, contribuimos para a alimentação de seus perniciosos costumes, conservando-os assim afastados do caminho da honra e do trabalho.
Penso que tambem não devemos dar esmolas a creanças, para não habitual-as a pedir, a viverem vagabundas, desde cedo, na estrada dos vicios.
Mas, devemos deixal-as à mingua de recursos?
Não!
Devemos procurar empregal-as, a fazer-lhes sentir a triste figura que representam na sociedade, mostrar-lhes o quanto é mais nobre e sublime viver à custa do suor de seu rosto, do que à custa do suor do rosto alheio.
Devemos, em ultimo caso, apresental-as à auctoridade competente, para que esta providencie sobre a sua sorte, arrancando-as do caminho da perdição, para collocal-as na eschola do trabalho.
Spes.
* Fonte: Texto assinado por “Spes” publicado com o título “Palestra” na edição de 02 de novembro de 1913 do jornal O Commercio, do arquivo da Hemeroteca Digital do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, via Altamir Fernandes.
* Foto: Primeiro parágrafo do texto original.