INCRÍVEL AVENTURA DE DOIS ÁCAROS, A − 3/4

Postado por e arquivado em CANTINHO LITERÁRIO DO EITEL.

– Eu acho que é até muito macio.

– Está bem evidente que é macio, certo?

– É mesmo muito macio. Nossa, que delícia, dá até pra pular e cair de barriga que não me machuco.

– E então?

– E então o que?

– Essa sua cachola de parcos recursos está tendo alguma ideia?

– Ideia sobre o que, meu caro Wanderley? Espera um pouquinho, deixa eu dar mais uns pulos para…

– Rivaldo!

– O que foi?

– Quer fazer o favor de prestar atenção no que vou dizer.

– Fala, nervosinho.

– Está bem evidente que o solo dessa montanha é bem macio, certo? Assim como aqui em cima, o solo lá de baixo é também bem macio, certo?

– Êpa, peraí, quem me garante que lá em baixo é tão macio quanto aqui em cima?

– Ô raios, nós não estávamos lá em baixo?

– É óbvio.

– E então?

– E então o que?

– Você não percebeu que o solo lá de baixo é tão macio quanto o aqui de cima?

– Não senhor, seu sabe-tudo, aqui em cima é muito mais macio que lá embaixo. Além do mais… que é isso Wanderley… para com isso… não, eu vou cair… aaaaaiiiiiiiiiiiiiiiii.

Num gesto brusco, Wanderley empurrou o amigo e logo a seguir pulou atrás. A queda foi longa e a sensação maravilhosa. A superfície lisa e macia provocava um gostoso atrito nas partes baixas dos ácaros, e o ar batendo contra seus rostos tornou a descida excitante. Quando estatelaram-se harmoniosamente no tórax da moça, Rivaldo se alterou com o amigo.

– Seu cretino, você está querendo me matar?

– Qualé, Rivaldo, você se assustou só quando eu o empurrei, mas até que gostou. Eu bem que reparei o seu largo sorriso na descida.

– Olha aqui, Wanderley, nunca mais faça isso, tá legal?

– Tá bom, tá bom. E agora, vamos pra onde?

– Sem pressa, tá, deixa eu descansar um pouquinho porque meu coração ainda está disparado.

– Nossa, veja só lá, bem lá na frente.

– O que?

– Repara bem, Rivaldo, lá longe, bem na nossa frente, está vendo? Parece um buracão.

– Não estou vendo, além do mais, está muito escuro.

– Vamos!

– Vamos aonde?

– Vamos descobrir que buraco é aquele

– Num vou não.

– Como não vai? Para com essa frescura, você me prometeu que não ia ter mais medo.

– E eu por um acaso estou com medo? Só acho que, daqui, aquele buraco parece meio sinistro.

– Pois então? Afinal de contas nós estamos aqui em cima para descobrir, certo?

– Sei não.

– Pare de ser ranzinza e vamos logo.

Meio ressabiado, Rivaldo resolveu acompanhar seu amigo na longa caminhada. O terreno era amplo, liso, macio e cheiroso. Depois de inúmeras passadas, conseguiram chegar ao umbigo da moça, enfeitado por um pequeno piercing redondo.

– Minha Nossa Senhora Aracnídea, que baita buraco.

– Sou obrigado a concordar contigo. O que terá lá no fundo?

– Wanderley, olha só aquilo.

– O que será aquilo?

No exato momento em que os ácaros estavam bem na beirada do umbigo concentrados no piercing, a moça balançou suavemente o corpo, o suficiente para causar um desequilíbrio total nos dois.

– Wanderley, Wanderley, é outro terremoto…

– Se segura, Rivaldo que vamos caaaaaiiiiiiiiiirrrrrrrrrrrr.

– Machucou-se?

– Até que não, só um pequeno galo na cabeça. O fundo desse buraco não é tão macio quanto lá em cima.

– Esse negócio é mesmo diferente do chão lá de cima, mais duro. O que será isso?

– Não sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe. Vamos tratar de cair fora.

– Cair fora, é? Olha só pra cima.

– Wanderley do céu, e agora?

– Calma amigo, está vendo aqueles fios saindo das paredes do buraco?

– Já sei, vamos nos agarrar neles para subir.

– Olha só, não dá para acreditar. E não é que o rapaz tem um pouquinho de miolo na cachola?

– Vai gozar sua mãe, tá bom?

– Sem brigas, sem brigas. Vamos tratar de sair logo desse buraco. Daqui a pouco a gente subindo vem outro terremoto e a gente acaba caindo de novo lá no fundo. Aí é mais outra trabalheira.

Com muito esforço, se agarrando nos finos e sedosos pelos que adornavam o umbigo, os dois ácaros conseguiram voltar para cima do abdome. Exaustos, resolveram tirar uma soneca para descansar braços e pernas. Mas a tranquilidade durou pouco, pois foram acordados quando a moça deu uma leve balançada no corpo.

– Wanderley, eu não quero ser desmancha-prazeres não, mas este negócio está ficando meio perigoso. Posso dar uma sugestão?

– Nem quero saber, eu já sei o que você vai dizer.

– Como você sabe o que eu vou dizer?

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Biomax-mep.com.br, meramente ilustrativa.

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