ASFALTO PÍFIO NO ENTORNO DA NOVA RODOVIÁRIA APÓS INAUGURADA − CONSTRUTORA SANT’ANNA ESCLARECE

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Belo Horizonte, 5 de maio de 1983

Exmo. Sr.
Dirceu Deocleciano Pacheco
DD. Diretor Responsável de A Debulha
Av. Brasil, 387 − Patos de Minas − MG

Prezado Senhor:

Na leitura que fazemos, com regularidade, dessa prestigiada revista editada sob a responsabilidade de V. Sa., não pudemos deixar de destacar o Editorial do último número (67), de 15 de abril passado¹, no qual V. Sa. aborda com clareza, coragem e dignidade a preocupação, que certamente é a mesma de toda a comunidade patense, sobre o estado em que se encontra a pavimentação asfáltica das ruas que circundam o Terminal Rodoviário “José Rangel”.

A citação nominal desta empresa no referido Editorial já seria motivo suficiente para que nos dirigíssemos a V. Sa. a propósito do tema abordado, ainda que não fosse a Construtora Sant’Anna S.A. praticamente uma empresa de Patos de Minas, em decorrência da folha de serviços prestados à cidade e a todo o Vale do Paranaíba desde 1975 − há oito anos, portanto − do que resultou uma profunda e inabalável vinculação de admiração, de respeito e de amizade pelas coisas, e muito mais ainda, pelas pessoas de Patos, sentimentos estes que são usufruídos e cultivados pelos Diretores desta Empresa, cada um com maior intensidade.

Em defesa de uma tradição de trinta anos de serviços prestados a Minas Gerais e ao Brasil, muitas vezes com elevado sacrifício mas sempre com muita técnica, probidade, denodo e responsabilidade a toda prova, e ainda sob a chancela da honra do nome, maior patrimônio que uma família pode conquistar, preservar e legar aos seus descendentes, por tudo isto faz-se necessário que venhamos à presença de V. Sa. prestar alguns esclarecimentos importantes que certamente serão repassados aos prezados leitores da revista, e se não pretendem resolver o problema proposto no mencionado Editorial, pelo menos permitirão a cada cidadão patense, justamente preocupado, melhores elementos de avaliação e julgamento, evitando possivelmente qualquer imprecisão de juízo que não faça justiça a alguma das partes envolvidas. E, neste caso, nada mais natural que a nossa preocupação, que já citamos.

Permita-nos V. Sa. rememorar  as considerações que se seguem:

Qualquer obra ou Serviço de Engenharia, de qualquer tipo ou natureza, de qualquer dimensão ou valor, em qualquer lugar ou para qualquer fim, deverá ser executado levando em consideração, entre outros os seguintes aspectos relevantes: custo, qualidade técnica, funcionalidade e qualidade visual. Uma menos ou mais adequada combinação destes fatores é que definirá o nível de qualidade da obra como um todo. A grande dificuldade, e daí resulta a complexidade do que se chama ENGENHARIA é que alguns dos fatores citados evoluem em sentido contrário ao dos demais. Para resumir, uma obra será tanto mais cara quanto mais se procurar aprimorar os demais aspectos mencionados, especialmente a qualidade técnica.

Não será demais registrar aqui que a qualidade técnica é o nível mínimo de características físicas ou mecânicas que suportem, com o grau de segurança necessário, os esforços e as solicitações que estarão sujeitas a obra dentro da utilização para que foi projetada e executada. Assim, por razões de bom senso e de economia racional, não se concebe projetar e dimensionar uma obra para suportar condições mais severas que aquelas que se podem esperar com os dados e a experiência que se tem do local e da situação. Para exemplificar, poderíamos citar que o edifício mais bem construído no Brasil não é suficientemente resistente para suportar um terremoto de grande intensidade, como o que ocorrem algumas vezes em outros países inclusive vizinhos do Brasil, pela simples razão de que é infinitamente pequena a probabilidade de que tal fenômeno vem ocorrer em nosso país, e prevenir-se contra isto seria um ônus caríssimo e discutível, senão desnecessário.

Retornando ao caso das ruas próximas ao Terminal Rodoviário de Patos de Minas, é fundamental que se registre que:

1 − Os serviços de pavimentação foram executados em perfeito acordo com os projetos e especificações apresentados pela Prefeitura Municipal;

2 − A execução dos serviços obedeceu a todas as técnicas e procedimentos operacionais aplicáveis a natureza da obra em questão, conforme constatou na época certa a Fiscalização, e como poderá ser ainda comprovado por qualquer perícia técnica que venha a ser procedida, a qualquer tempo;

3 − Ainda que nenhuma responsabilidade possa ser imputada à expressa executora, pelas razões já expostas, também não se poderia atribuir, aprioristicamente, sem um exame técnico de profundidade, maior responsabilidade ao projeto executivo, exatamente pelas razões antes enumeradas, uma vez que as condições meteorológicas locais, à época e em seguida à execução dos serviços apresentou condições absolutamente anormais, especialmente no que se refere à precipitação pluviométrica: precipitação total no período, máxima altura e número de dias de chuva;

4 − A ninguém passou despercebido a singular e desastrosa manifestação do período chuvoso da última estação, com calamitosas conseqüências em inúmeras localidades do Estado de Minas Gerais e da região Sudeste, entre as quais, e com destaque, Belo Horizonte, São Paulo, Rio de Janeiro, Lavras, Estrela do Sul e muitas outras, além, naturalmente, da cidade de Patos de Minas, cuja população sofreu dissabores e prejuízos suficientemente grandes a ponto de não poder se esquecer, por bastante tempo, da intensidade do recente castigo, imerecido, diga-se de passagem, proporcionado pelas manifestações meteorológicas²;

5 − Não obstante: ainda se pode atestar, com números exatos e eloqüentes, a gravidade da inclemência das chuvas que assolaram essa cidade, através dos dados fornecidos pelo Quinto Distrito de Meteorologia do Instituto Nacional de Meteorologia do Ministério da Agricultura, a partir de medições feitas na própria localidade de Patos de Minas, cuja planilha estamos anexando à presente e cujo resumo aqui registramos:
5.1 − Precipitação mensal de dezembro, janeiro e fevereiro últimos: 388,6 + 444,1 + 431,8 = 1.264,5 mm. Idem no ano anterior: 579,2 mm. Acréscimo de 81/82 para 82/83: 118,3%.
5.2 − Maior altura no período: 117,7 mm. Idem no ano anterior: 59,4 mm. Acréscimo de 81/82 para 82/83: 98,2%.
5.3 − Dias de chuva no período: 21 + 30 + 17 = 68. Idem, no ano anterior: 49. Acréscimo de 81/82 para 82/83: 38,8%.
5.4 − A precipitação total de janeiro e de fevereiro de 1983 somente foi superada uma única vez nos últimos anos; a maior altura e o número de dias de chuva no mês foram inegavelmente os maiores nos últimos anos.

6 − Outras conclusões semelhantes poderão ser tiradas da análise dos dados fornecidos pelo Serviço de Meteorologia do Ministério da Agricultura, corroborado tudo o que aqui foi afirmado, confirmando a tese ora proposta.

7 − A despeito da excepcionalidade das chuvas no período em questão, foi notório o excelente comportamento dos muitos milhares de metros quadrados de pavimento asfáltico feito por esta empresa nas ruas de Patos de Minas nos últimos anos. Mas é igualmente incontestável que os efeitos destas chuvas extraordinárias não poderiam de deixar de se concentrar e se manifestar na região do Terminal Rodoviário, por ser está área o fundo de uma depressão que define a topografia da cidade, e que, por isso mesmo, sempre apresentou um lençol freático extremamente alto e superficial, atribuindo àquele região uma característica reconhecidamente “pantanosa”. O solo saturado, não necessariamente por penetração superficial, mas por elevação do lençol freático não poderia suportar os esforços mecânicos previstos para um pavimento viário. Qualquer ensaio tecnológico poderá comprovar esta situação.

8 − Para que tal fosse evitado teria sido necessário projetar e construir um dispositivo de drenagem muitas vezes mais complexo que o atual, e de custo tão elevado que, se a municipalidade de Patos de Minas se decidisse a fazê-lo, a despeito do elevado sacrifício financeiro, ainda assim correria o risco de ser incluída no rol das administrações públicas de visão megalômana, caso de chuvas ocorridas não tivessem superado as médias anteriores, dentro das previsões razoáveis.

9 − No âmago do problema, a grande fatalidade foi o regime excepcional de chuvas ter ocorrido antes que fosse executado o importante projeto de drenagem da Lagoa, do qual já tínhamos notícia mas que somente agora está sendo desenvolvido e preparado para ser executado. É válido acreditar que somente este projeto teria sido suficiente para evitar os problemas ocorridos se pudesse ter siso executado antes das chuvas. Para esta confiança é bastante lembrar que a terraplanagem e base do pavimento − verdadeiros suportes do pavimento − foram executados em maio e junho de 1982, e embora expostos ao tráfego desde aquela época até dezembro, quando se iniciou a execução da capa asfáltica, nenhum dano sofreram, apesar de ainda não protegidas pelo revestimento betuminoso.

10 − Em resumo, a manutenção do lençol freático em níveis toleráveis, quer seja pela normalidade das chuvas, o que não ocorreu, quer seja pela construção do canal de drenagem da Lagoa, o que não pode ser feito com a antecipação devida, teria evitado a saturação do solo na área, comprometendo sua resistência mecânica como base de pavimento.

11 − Como um pormenor a destacar, cabe aqui o registro de que a pavimentação asfáltica da Av. Piauí, concluída em dezembro de 1982, teve parte de seu revestimento aceleradamente destruído já em fins de janeiro seguinte pelo simples motivo de que a saturação da base decorrente da excepcionalidade das chuvas foi, naquele local, agravada substancialmente pela penetração superficial resultante do acúmulo de águas pluviais nos canteiros centrais não enchidos oportunamente, tarefa esta que não fora atribuída a esta empresa.

12 − Por fim, cumpre-nos ressaltar que a não autorização pela Prefeitura, até o presente, para que fossem executadas as obras necessárias de restauração das áreas danificadas, parece-nos totalmente lógica e coerente em virtude da continuidade, aliás já surpreendente, do período chuvoso, o que invalidaria os esforços dispendidos e poderia acarretar novos e indesejáveis prejuízos aos cofres municipais.

Patos de Minas não foi, infelizmente, poupada das atribulações e prejuízos causados pelas chuvas anormais do último verão. Mas certamente todos, povo, autoridades e também esta empresa, fizeram e continuarão fazendo tudo o que for correto, necessário e possível para dar a esta querida cidade tudo o que ela merece, e que é o melhor.

Desculpando-nos pela demora em nossa manifestação, e pela natural desconfiança e má interpretação que possamos ter casado a V. Sa. e ao amigo povo de Patos de Minas, esperamos agora ter restabelecido o correto entendimento sobre nossa participação nos dissabores e prejuízos sofridos por esta comunidade, e da qual participamos com solidariedade e quase igual sofrimento, e pela atenção que puderam dar à presente e extensa manifestação desde já agradecemos penhoradamente, subscrevendo-nos.

Atenciosamente,

Saulo Santana
Construtora Santana S/A

* 1: Leia “Asfalto Pífio no Entorno da Nova Rodoviária Após Inaugurada – Crítica de A Debulha”.

* 2: Choveu muito no verão de 1983. E mais ainda no de 1984. Leia “Mutirão da Solidariedade em 1984”, “Mutirão em Prol dos Desabrigados da Chuva − 1984”.

* Fonte: Texto publicado com o título “Construtora Sant’Anna esclarece” na edição n.º 70 de 15 de junho de 1983 da revista A Debulha, do arquivo de Eitel Teixeira Dannemann, doação de João Marcos Pacheco.

* Fotos: Trechos do texto original.

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