ATAÍDES DE DEUS VIEIRA, UM GRANDE CORAÇÃO

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O ódio não esquece − escrevi há anos na extinta revista “O Cruzeiro”. E ainda hoje assinaria em baixo. Entretanto, o bom Ataídes¹, que a morte levou tão cedo, mostrou em vida que um gesto magnânimo pode apagar as labaredas do ódio ou as brasas do ressentimento.

Homem decidido e impetuoso, Ataídes fez muitos amigos e admiradores ao longo de sua vida e, inevitavelmente, alguns inimigos também. Um dia um desses inimigos caiu gravemente enfermo. Só o Hospital das Clínicas de São Paulo poderia salvá-lo, segundo seu médico. Mas como transportar o doente, incapaz de resistir à longa viagem de carro, em boa parte da estrada de terra? A família estava em pânico, sem saber o que fazer. Então aconteceu o inesperado: Ataídes solucionou o problema, mandando levar o doente a São Paulo em seu avião. “Foi um gesto bonito” − comentou seu velho amigo Zé Lacerda, da Prefeitura. Mas o esforço deu em nada: o doente acabou morrendo no hospital. De novo Ataídes revelou sua generosidade, mandando seu piloto, Vicente do Inhaque, buscar o corpo em São Paulo. Por isso, quando a viúva do antigo inimigo soube da morte de Ataídes chorou também, como tanta gente.

Amigo de seus amigos, preocupava-se com seus problemas e em colaborar na solução. Assim, discretamente, ajudou um a pagar as prestações de seu carro e outro, as do telefone. Fez, inclusive, o que poucos teriam coragem de fazer: deu um cargo de responsabilidade a um amigo por baixo na tentativa de levantá-lo. E ganhou um auxiliar eficiente.

Excelente Ataídes. Ele foi antes de tudo um grande coração.

Foi também um homem de valor. Moço pobre do Carmo do Paranaíba, ele iniciou a arrancada para a fama e a fortuna apenas com a cara e a coragem. Começando como simples chofer de caminhão, ele se tornou um dos maiores empresários do País no setor de ônibus interestaduais.

Espírito pioneiro, criou novas linhas de ônibus em Minas e no Paraná. Foi a sua primeira empresa que estabeleceu a ligação Patos de Minas-Brasília.

E foi dela o primeiro ônibus a sair da então novíssima Estação Rodoviária da nova capital. Até há pouco tempo, Ataídes, juntamente com seu sócio José Baguinho, era responsável pela ligação rodoviária, via ônibus de passageiros, entre São Paulo e Brasília.

Além de grande dono de empresas de ônibus, o que exigia até o concurso de um avião para melhor administrá-las, Ataídes adquiriu fazendas e tornou-se grande criador de gado.

Certamente, Ataídes foi mais feliz nos negócios do que na política. Mas teve também muitos méritos neste setor. Afinal, ele foi prefeito de uma das mais importantes cidades de Minas, a nossa Patos de Minas. E como prefeito, destacou-se pelo seu dinamismo, pela sua capacidade e velocidade de realização. Para começar, ele operou uma verdadeira revolução na zona rural, rasgando todo o município de muitas e boas estradas e erguendo um surpreendente número de escolas: 46. Foi na inauguração de uma delas que aconteceu o famoso discurso do Guaraná, seu operoso e bem-humorado auxiliar, encerrando mais ou menos nestes termos: “Espero que daqui saiam futuros engenheiros, médicos, dentistas, agrônomos, economistas e não fique ninguém analfabeto como eu e o Sr. Prefeito”.

Ataídes se zangou? Pelo contrário, riu à bessa da brincadeira. Depois, se não era culto, poucos fizeram tanto pela educação de Patos de Minas quanto ele.

Na cidade, Ataídes também operou uma revolução, inclusive partindo para uma empreitada de cujo êxito todos duvidavam: o calçamento da Avenida Brasil, desde as proximidades da URT até as cercanias da Antena da Rádio², livrando-a do lamaceiro no tempo das águas e das nuvens de pó, na estiagem. Também pavimentou a Rua Tiradentes, e as Praças da Rodoviária e do Mercado. Foi ele ainda que calçou a entrada da Catedral e, por isso, ganhou uma placa de agradecimento do então Vigário Paulo Egídio.

Outro mérito do Ataídes administrador público: ele ampliou o patrimônio do município, incluindo a área física da prefeitura, com a compra de uma casa ao lado. Área que permitirá a ampliação do prédio da prefeitura, quando isso se tornar necessário. Foi ele também que adquiriu o terreno onde o INPS está construindo sua sede própria³.

Como prefeito, Ataídes se valeu de sua tarimba e até de sua infraestrutura como empresário. E assim muitas vezes conseguia resolver problemas com rapidez, surpreendente. Por exemplo, se uma patrol quebrava uma peça, inexistente na cidade, ele telefonava para o escritório de suas empresas de ônibus em Uberlândia, pedindo a peça. Se não fosse encontrada em Uberlândia, o escritório de Uberlândia acionava o escritório de São Paulo, que remetia a peça por ônibus. Com isso, Ataídes conseguia resolver o problema até de um dia para outro, mas houve casos em que seu avião se deslocou até Goiânia para buscar peças para máquinas da Prefeitura de Patos de Minas. Por um desses caprichos que marcam a vida dos homens públicos, com tantos acertos, talvez Ataídes seja mais lembrado por dois erros: as más localizações do Ginásio Estadual “Professora Elza Carneiro Franco” e das Casas Populares. Mas nenhum lhe pode ser debitado por inteiro: segundo me informa o correto Zé Lacerda, ambas as localizações foram aprovadas pela Câmara Municipal, sem nenhuma voz discordante.

Na área política, Ataídes concorreu a uma cadeira na Assembléia Legislativa, nas últimas eleições, tornando-se um dos primeiros suplentes da bancada da Arena.

Como empresário, ele morreu no auge de sua carreira: tinha cinco importantes empresas de ônibus e três fazendas de gado, com vários milhares de rezes, entre Patos de Minas e Presidente Olegário.

Sua morte privou a região de uma de suas figuras mais importantes. E generosas também.

NOTA: Ataídes de Deus Vieira faleceu em Uberlândia, onde foi sepultado, em 12 de fevereiro de 1976.

* 1: Leia “Ataídes de Deus Vieira” e “Transição Ataídes/Sebastião”.

* 2: Hoje Praça 7 de Setembro, mais conhecida como “Praça do Cristavo”.

* 3: Leia “Anunciada a Construção do Prédio do INPS” e “Aspectos Arquitetônicos do Prédio do INSS”.

* Fonte: Texto de Oswaldo Guimarães Amorim publicado com o título “Ataídes, um Grande Coração” na edição de 19 de fevereiro de 1976 do jornal Folha Diocesana, do arquivo do Laboratório de Ensino, pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.

* Foto: Do livro Patos de Minas: Minha Cidade, de Oliveira Mello.

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