DEIXAREI SAUDADE – 62

Postado por e arquivado em 2018, DÉCADA DE 2010, FOTOS.

Sou da época em que reinavam na Cidade as máquinas de beneficiar arroz. Isso a partir do final da década de 1940, quando fracassou o sonho do trigo patense¹. Para tudo quanto era lado havia uma máquina de beneficiar arroz. Nos jornais abundavam as propagandas dos comerciantes de arroz. Nessa região onde me construíram², reinou o negócio arrozal dos irmãos Garcia Roza (Genésio e Mário). Aqui era a Fazenda Limoeiro, que eles lotearam e hoje é o Bairro Vila Garcia, na época um aglomerado de gente humilde e de parcos recursos financeiros. Ainda hoje nota-se a presença de moradias que denotam a pobreza daqueles idos. Então, a passos de cágado, proprietários e governantes foram melhorando o aspecto visual. Eu surgi nessa época, nem muito pobre, nem muito abastada, mas o suficiente para me destacar perante muitas de minhas colegas. Foram muitos anos de calmaria onde as almas que me habitavam seguiam os cursos naturais de suas vidas, mantendo-me anatomicamente apreciável aos olhos de todos. Até que as coisas começaram a tomar um rumo esquisito.

É fato que a Cidade se desenvolveu muito lentamente para essas bandas, mas os pequenos prédios de três a cinco andares já começaram a pipocar com mais rapidez em todas as ruas do bairro, ocupando os lugares das humildes residências. Meus ouvidos paredais têm captado muita conversa a respeito, inclusive sobre mim. Sei lá, neura de imóveis antigos como eu, sabedores que a especulação imobiliária é inimiga número um do passado. É o tal progresso, que jamais e em tempo algum aceita o antes, só o depois. E assim vai com seu rolo compressor arrasando tudo para que novas alvenarias verticais tomem conta do pedaço. E cá estou, já não cuidada como dantes, já esteticamente no chamado vias de abandono, engolindo na marra o som de betoneiras e passagem de caminhões carregando materiais de construção. Para reformas? Ora, sou apenas um velho e humilde imóvel, mas não sou besta não, viu! Sei perfeitamente que meu destino já está traçado com os seguintes dizeres: Aqui jaz uma antiga e humilde casa! Que seja, pois nem os humanos escapam da morte. Um dia serei um monte de entulhos, mas orgulhosamente pertencente à História de Patos de Minas. E deixarei saudade!

* 1: Leia “A Vinda da Cia. Moinhos Minas Gerais S/A”, “Companhia Moinhos Minas Gerais S/A” e “A Queda da Cia. Moinhos Minas Gerais S/A”.

* 2: O imóvel está localizado à Rua Padre Antônio de Oliveira, ao lado das suas colegas Deocleciano Mundim e Getúlio Borges, no bico inferior do Bairro Vila Garcia.

* Texto e foto (19/08/2018): Eitel Teixeira Dannemann.

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