Lá pelo final da década de 1940, residia ao lado da antiga ponte do Rio Paranaíba o preto André e sua esposa. Ali comerciava com os viajantes, os mais diversos artigos, desde a pinguinha Paracatulina, a bala calibre 44, e também se aprovisionavam das saborosas broas de fubá produzidas pela mulher do André¹. Antes, uns 500 metros no trecho que hoje é a Rua Joaquim Fubá, moravam o Juvenal e a Adelina. E a Adelina tinha uma particularidade que desafiava diariamente o marido: a esposa era danada a contrariar tudo e todos. A bicha era teimosa, mas tão teimosa, que todos os seus conhecidos, na base da gozação, a chamavam de Anileda, pronuncia do nome da mulher de trás para frente.
Certa feita, Juvenal e Adelina proseavam de manhãzinha à beira do fogão de lenha quando, num rompante, ela disse ao marido que ia pescar. Ele tentou de todas as formas desencorajá-la, alertando que o rio estava acima do normal e com muita correnteza. Mas como entrou em ação a teimosa Anileda, não houve argumento suficiente para impedir a mulher de se armar com os apetrechos necessários e se mandar para o barranco.
Preocupado, pois já passava do meio-dia e nada da Adelina voltar, Juvenal resolveu procurá-la no ponto em que ela gostava de ficar, uns duzentos metros acima da casa do André. Não vendo a esposa e reparando a latinha de minhocas à beira do barranco, Juvenal se desesperou imaginando que a mulher caíra n’água e foi arrastada pela correnteza. Saiu então barranco abaixo numa correria destrambelhada com um olho no rio e outro no caminho. O André viu o amigo correndo e partiu atrás dele, correndo um tanto a mais. Quando o alcançou, Juvenal contou o que tinha acontecido. Tentando acalmar o homem, André sugeriu algo que tinha tudo a ver com a Adelina:
– Juvenal, meu amigo, bem sabe você e todos nós vizinhos que a sua mulher não concorda com absolutamente nada, que é mais teimosa que a mais teimosa das mulas. Não perca tempo nessa correria no sentido da correnteza. Você tem que mudar de rumo, voltar, ir procurá-la no sentido contrário da correnteza, rio acima, pois, mesmo se ela já estiver morta, nem assim deixará de ser teimosa.
* 1: Leia “Sobre o Rio Paranaíba em 1956”.
* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.
* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 28/02/2013 com o título “Prefeitura em 1916”.