Vários edifícios já são dotados de muita parafernália para tentar coibir certas visitas indesejáveis de quem não foi convidado a entrar e mesmo assim resolve entrar. Não é infalível, mas, indiscutivelmente, pelo menos obriga o mal intencionado a elaborar uma tática pouquinha coisa mais razoável. Num desses, ali na Avenida Getúlio Vargas, tem câmeras pra tudo quanto é lado. Num belo dia, quase meia noite, um sábado daqueles calorentos em que mesmo sem roupa o corpo teima em parar de suar, um morador garotão chega com duas vizinhas. Ele, típico estudante universitário que frequenta as aulas unicamente para não perder a mesada e o uso indiscriminado de um dos carros da família, estava naquela condição de não conseguir fazer o 4 com as pernas, por isso mais alegre e desconjuntado que político no final de mês. As duas, lindas gatinhas daquelas que vieram ao mundo unicamente para agradar ao sexo oposto, pois autoestima era palavrão para elas, se agarravam ao garotão ainda ao volante parecendo que aqueles momentos seriam os últimos de suas vidas.
Pois bem, o rapagão estacionou a cabine dupla na garagem subterrânea com o som berrando um sertanejo universitário daqueles de fazer defunto abandonar a tumba, coisa 100% usual no gênero. Os três apearam e prontamente pularam para cima da carroceria. Em questões de segundos começou um rela-rela mais atritante do que ralar queijo. Ele, óbvio, fazia o papel de ralador e as duas, óbvio, faziam o papel de queijo. Parecia que o queijo era duro demais, pois o ralador precisou se esforçar bastante para realizar o seu duplo serviço. A coisa chegou num ponto tal de conjunção de matérias que parecia uma pizza saindo do forno, de tão entranhados e escarafunchados que ficaram. Tanto, que nem se lembraram das câmeras. Terminado o êxtase, o trio subiu à recepção e deram de cara com o porteiro de olho no monitor de TV. Este não perdeu tempo:
– E aí, que farra hêim? Dona fulana, seu pai deixou um recado pra quando chegasse: é pra você não esquecer de terminar o texto que vai proferir na missa de amanhã… quer dizer, hoje cedo na Catedral.
Cada um, garotão e garotonas mais vermelhos que tomate maduríssimo se dirigiram a seus lares. Quanto ao porteiro, amigo meu de infância e que me contou detalhe por detalhe incluindo a grande pinta na virilha da coxa direita da loira de olhos azuis que esqueceu os óculos de grau na carroceria tendo que descer para pegá-lo e presenciar outra vez os olhares de reprovação do amigo, como não tem nada a ver com a vida de ninguém, cerrou os lábios para a patuleia geral.
* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.
* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 10/04/2017 com o título “Jardineira de Pedro Gomes Carneiro”.