Um grupo de pesquisadores da Universidade da Califórnia, em Berkeley, publicou, em 2012, um estudo sobre as cores dos gatos influenciarem em sua personalidade, baseado na entrevista de 189 proprietários de gatos. Poucos anos depois, em 2015, esse estudo foi revisado pela Universidade de Davis, também na Califórnia, por meio de uma pesquisa on-line com 1274 proprietários de gatos. Nessa pesquisa, foi pedido que os proprietários avaliassem o nível de agressão de seus gatos em casa, durante o manuseio e as visitas ao veterinário.
De acordo com a médica-veterinária especializada em Gatos, da Clínica de Medicina Felina Gato é Gente Boa (Itu-SP), Vanessa Zimbres, embora esses estudos ofereçam algumas informações interessantes, eles não fornecem uma resposta definitiva sobre se certos traços de personalidade estão associados a cores específicas da pelagem. “O estudo fornece percepções humanas, baseadas na experiência de cada proprietároio. Os entrevistados, de diversas localidades e idades, apresentam suposições diferentes, onde uma pessoa considera agressivo um tipo de comportamento enquanto que outra considera uma brincadeira. Os gatos domésticos têm pouco tempo de domesticação, ainda perpetuam suas características selvagens, são semissociais e muitos dos ‘problemas’ comportamentais estão relacionados ao ambiente inadequado de criação onde o gato não tem suas necessidades básicas preenchidas”, explica. Ela ainda menciona que não é incomum um gato ser considerado agressivo quando, na verdade, ele está com medo, e considera importante citar a conclusão do estudo, onde ele sugere que cores da pelagem podem estar associadas a comportamentos agressivos no gato, mas que as diferenças são relativamente pequenas. “Além disso, a sutileza dos resultados deste levantamento sugere a necessidade de pesquisas adicionais sobre o tema, incluindo estudos observacionais, pesquisas maiores com os proprietários ou mesmo exames no nível molecular ou alélico”, expõe.
Segundo Mayara Maeda, Médica-Veterinária especializada em Medicina Felina, as diferenças encontradas são relativamente pequenas e isso pode ser explicado pelo fato de que o exame dependeu totalmente da interpretação que cada proprietário nos critérios de pontuação de cada tema a ser analisado. “Além de que, no geral, os níveis de agressão foram muito baixos, fazendo com que uma agressão sutil fizesse com que gerasse uma diferença significativa entre os animais comparados”, salienta. A profissional ainda menciona que existem algumas variáveis que também podem alterar totalmente a interpretação dos resultados. “Como, por exemplo, serem castrados ou não, como é o ambiente em que vivem e como foi o período de socialização dos animais. Infelizmente, essas variáveis não foram avaliadas em conjunto com as demais informações”, observa.
Assim, apesar de ser um tema muito interessante e curioso, na visão de Mayara, mais estudos serão necessários para que seja possível definir com mais clareza o impacto que a coloração da pelagem dos gatos tem a dizer a respeito do comportamento. “Ainda é cedo para conclusões”, assegura a veterinária que nos lembra: “A coloração dos pelos está totalmente ligada aos genes que os animais carregam. Até então, não há outros estudos que tenham correlacionado a coloração da pelagem com o comportamento dos gatos. Há muito ainda que precisa ser pesquisado para maior detalhamento da correlação da cor da pelagem com o nível de agressividade ou temperamento dos felinos”.
Como lembrado por Vanessa, até o momento, há poucas evidências de que essas diferenças percebidas entre gatos de cores diferentes realmente existem, mas há sérias repercussões para os gatos, se as pessoas acreditarem que algumas cores são mais amigáveis do que outras. “Gatos de cores escuras permanecem mais tempo nos abrigos que gatos de cores mais claras ou estampadas. Apesar de o estudo não mostrar traços negativos da personalidade desses animais, acredita-se que a sua menor taxa de adoção seja devido a sua aparência”, comenta. E, ainda sobre os gatos pretos, apontados no estudo como muito carinhosos e gratos aos proprietários, a especialista em felinos afirma que, assim como os humanos, os gatos domésticos são frequentemente julgados por sua cor e a mídia e o folclore ajudam a perpetuar esses estereótipos com imagens de gatos pretos frequentemente associados à má sorte. “Essa lenda vem desde a idade média, quando os gatos eram perseguidos pela Santa Inquisição”, relembra.
Mayara relata que, depois de diversas histórias e mitos relacionados aos gatos pretos, hoje, apesar de sabermos que os gatos pretos são tão amáveis quanto os de outras cores, também sabemos que ainda há quem atravesse a rua para não ter o azar de cruzar com um gato preto. “A parte boa desta história é que sabemos que isso está mudando muito nos últimos anos, onde a espécie felina está cada vez mais dentro dos lares brasileiros, mostrando como a companhia de um gato pode ser tão amável e prazerosa e, com isso, essas más reputações também estão aos poucos, sendo desacreditadas”, constata.
Por fim, Vanessa declara que, ao contrário do que muitos dizem, que “gatos gostam da casa e não dos seus proprietários”, quem tem um gato sabe que isso é mais do que um mito: é uma calúnia! “Pois quem tem gatos sabe o quão companheiros eles são. Quem tem gato, jamais dirá isso. Com um felino, você nunca está sozinho, nem na hora de utilizar o banheiro”, brinca. Ela também diz que eles oferecem apoio silencioso enquanto sentam ao seu lado, um miado de saudação de boas-vindas quando você chega em casa, um ronronar que acalma o coração e conforta a alma e um atrito entusiasmado contra você enquanto os alimenta. “Quem tem gato, sabe bem do que eu estou falando. E quem nunca teve deveria se dar a oportunidade de ter um, independentemente da cor”, finaliza.
* Fonte e foto: Texto de Cláudia Guimarães publicado com o título “Discussão: A cor dos pelos do gato influencia em seu comportamento?” (17/02/2021) em caesegatos.com.br.