CACHORRINHO DE CORDA, O

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Sábado, 07 de maio de 1960, duas horas da tarde. Em frente à entrada do Mangueirão, hoje Estádio Zama Maciel, estaciona uma Rural Willys. Estava marcada para as três horas uma partida válida pelo Campeonato do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba entre a URT e o Independente de Uberaba¹ com uma atração especial: o pontapé inicial seria dado por Gelza Gonçalves de Carvalho (filha do Quinquim Carvalho), na época candidata à Rainha da 2.ª Festa do Milho (a vencedora foi Maria Olívia Alvares da Silva Campos).

Enquanto os torcedores chegavam, o motorista da Rural Willys armou uma mesa na calçada e nela depositou quinze cachorrinhos de pelúcia movidos a corda e que latia com uma perfeição de assustar, brinquedos esses muito populares na época. Como era comum naqueles áureos e sadios tempos os pais levarem seus filhos menores aos estádios de futebol, o comerciante optara apropriadamente pelo local. Fazendo demonstrações, antes de começar o jogo os quinze cachorrinhos foram vendidos. Com o esvaziamento do público, o comerciante guardou seu material e se retirou.

Uma semana após, o Josenildo recebe em sua residência o primo Armando, residente em Presidente Olegário. Enquanto conversavam na sala, Mirinho, filho do Josenildo, surge com um daqueles cachorrinhos, dá corda e o brinquedo sai caminhando, uma gracinha, mas com um indesejável problema: não latia. O Mirinho não se importou muito, mas o pai nem tanto:

– Pois é, Armando, domingo passado comprei esse cachorrinho na porta do campo da URT e o bichinho latia que era uma beleza. Quando cheguei em casa e dei corda é isso aí, ele caminha mas não late. Como comprei de um camelô, não há como reclamar o defeito.

Imediatamente o Armando questionou o primo:

– Peraí, por um acaso você comprou esse brinquedo de um sujeito numa Rural Willys?

– Foi sim.

– Pois é, na quinta-feira da semana passada essa mesma Rural esteve lá em Presidente Olegário vendendo os tais cachorrinhos e depois de pouco mais de meia hora o sujeito foi embora. E todos os cachorrinhos não latiram mais. Sabe o que aconteceu, primo? Fomos ludibriados.

– Ludibriados?

– Um representante comercial amigo meu, vindo de Lagamar, me contou que lá aconteceu a mesma coisa, e o sujeito teve que fugir às pressas porque lá em Lagamar descobriram a farsa.

– Que farsa, Armando, eu ouvi o cachorrinho latir quando comprei.

– Primo, o cara é muito bom ventríloquo, sacou? Ele vende dez a quinze brinquedos que é o tempo necessário para ele se mandar antes de descobrirem a farsa. E assim ele vai correndo as pequenas cidades enganando o povo.

Ô disgranhento, e nessas alturas do campeonato ele já deve ter passado por Guimarânia, Patrocínio ou quem sabe Lagoa Formosa, Carmo do Paranaíba… ou Varjão de Minas…

* 1: Leia “URT x Independente − Pontapé Inicial” e “URT 2 x 1 Independente (Uberaba) – 07/05/1960”

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 06/06/2014 com o título “Antiga Rodoviária no Final da Década de 1970 − 1”.

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