A família Malheiro de Patos de Minas tem sua história iniciada em Portugal, onde nasceu José Ventura Malheiro no dia 06 de novembro de 1906, na cidade de Fafe. Ele veio de navio para o Brasil em 1930. Chegando ao Rio de Janeiro, trabalhou e foi reconhecido pelos empresários da época, sendo indicado para abrir uma filial das Casas Pernambucanas aqui. Aceitou o desafio e veio, hospedando-se no Hotel da Luz, de propriedade de Olívio Borges. Ali conheceu a filha de Olívio, Maria Pepitinha Borges, com quem veio se casar.
Por estar trazendo uma loja de renome nacional para a cidade e por sua capacidade de liderança, rapidamente se torna amigo dos empresários do comércio. Torna-se também uma liderança empreendedora se destacando pela capacidade de realização. É uma pessoa com ideias novas, vinda de outros cantos do mundo e desperta a admiração de seus pares na época.
Em 25 de setembro de 1935, participa de uma reunião com outras 13 pessoas de destaque do comércio e da sociedade¹ e decidem pela fundação da Sociedade Recreativa Patense. O encontro se deu às 20:00h na Sala de Visitas do Hotel da Luz, onde foi nomeada uma comissão para formular o plano para conseguir levantar o capital necessário para o empreendimento. Em 28 de novembro, na segunda reunião, é eleita a primeira diretoria, empossada em 08 de dezembro².
Em abril de 1936, a Recreativa já estava em sua sede provisória localizada no segundo andar do Edifício Ponto Chic. Em 03 de dezembro, foi reeleito presidente para o ano seguinte, tendo como Vice, Júlio Bruno. Em abril de 1937, sendo recusado seu pedido de renúncia, continuou no cargo. Em 28 de dezembro foi aprovada a compra do terreno pertencente a Virgílio Borges para a construção da sede própria. Em 28 de julho de 1938, apresenta pessoalmente sua carta de renúncia por não estar presente tanto tempo na cidade.
José Ventura Malheiro foi um líder na autêntica acepção da palavra. Foi duro quando a situação assim exigiu, apresentou soluções para os problemas que foram surgindo nos primeiros passos da Recreativa. Ele construiu as bases do clube junto com seus companheiros que muito o respeitavam e o seguiam. Amou esta cidade, conforme declara em seu discurso de renúncia. Ele se dizia um estranho que a cidade acolheu e por isso era grato.
Por sua origem portuguesa e por sua experiência era um empresário respeitado pela capacidade de liderar e buscar soluções para os impasses. Em várias ocasiões argumentou com dureza nas reuniões para decidir questões importantes e conseguiu levar adiante suas ideias. Talvez sua obra maior seja ter inspirado autoconfiança nos demais colegas de sua época, demonstrando que eles mesmos tinham a capacidade para fazer grandes realizações. Foi dele a ideia de criar as cotas societárias, chamadas quinhões, com participação e direito de propriedade, como se o clube fosse uma empresa, para que o aporte pudesse ser feito e também a distribuição de dividendos.
Não há dúvida que Malheiro administrou com firmeza as finanças da Recreativa. Essa preocupação com a saúde financeira da agremiação foi fundamental e muito bem estruturada, abrindo contas bancárias em dois estabelecimentos. Tudo passava pela aprovação e fiscalização dos diretores. Esse rigor na condução dos controles e das finanças estruturou a forma de pensar e agir basicamente de todas as diretorias posteriores à sua primeira gestão³ e também à sua atuação mesmo estando em outra cidade. Morando em Belo Horizonte, sempre que vinha a Patos participava das reuniões, acompanhava o andamento dos trabalhos e cobrava resultados. Demonstrava apreço pelo Clube e também exigia uma postura equivalente de seus companheiros de diretoria. Ele instalou a cultura do controle financeiro e da seriedade administrativa na Sociedade Recreativa Patense.
O grande lusitano da história da Recreativa era incansável e deixou um exemplo bem acabado de persistência e autoconfiança. Sua família jamais deixou de ter sua história ligada à SRP, dando continuidade a um trabalho bem feito do patriarca, seguido pelas gerações sucessoras. Muitos dizem que é o elo familiar um dos principais motivos do sucesso e da permanência da Recreativa por tantas décadas. Ao que depender da família de Malheiro, essa é uma premissa comprovadamente verdadeira.
* 1: Antônio da Silva Caixeta, Aristheu Borges, Eunápio Correia Borges, Fernando Caixeta, Hugo José de Souza, João Borges, João Borges de Andrade, João da Rocha Filho, José Olímpio Borges, José Olympio de Melo, Júlio Bruno, Octávio Borges e Theodorico Borges.
* 2: Presidente, José Ventura Malheiro; Vice-presidente, João Borges; 1.º Secretário, Sebastião de Castro Amorim; 2.º Secretário, Anésio Rocha; Tesoureiro, Hugo José de Souza; Diretores do Mês, Antônio da Silva Caixeta, João da Rocha Filho e José de Melo Sumbem; Conselho Consultivo, João Ambrósio, José Olympio Borges, José Olympio de Mello, Octávio Borges e Virgílio Borges; Conselho Fiscal, Aristheu Borges, Júlio Bruno e Virgílio Caixeta de Queiroz.
* 3: Malheiros teve uma segunda gestão de 1982 a 1984.
* Fonte e foto (Malheiro em 1931): Livro Recreativa: Uma Jovem Acima de 80 Anos, de Dennis Lima (2018).