TEXTO: JORNAL O TRABALHO (1907)
Snr. Redactor.
Não posso furtar-me ao desejo de cooperar comvosco, escrevendo alguma cousa de util aos nossos concidadãos; e se não me abstenho é devido a vossa benevola attenção.
Lendo attentamente o “O Trabalho” de 20 de janeiro pp., onde vêm lúcidos artigos sobre melhoramentos locaes, hygiene, e Implicancias, puz-me a pensar, e nas horas do descanço dos meus trabalhos da lavoura, fiz os rabiscos que ora os envio; e desde já vos peço e aos benevolos leitores do “O Trabalho”, para relevarem as impertinencias do lavrador implicante.
E’ verdade que o municipio não deve abster-se do direito de reclamar de seus representantes na Camara Municipal, pedindo instantemente os melhoramentos locaes; mas debalde esforçar-se-á a Edilidade em querer satisfazer os lúcidos reclamos da bôa imprensa, se o mesmo povo que representa não vier em seu auxilio e da Agencia Executiva Municipal.
Apontamos muitas cousas que necessitamos, e que actualmente difficultam ao illustre Agente Executico¹, distribuir os minguados rendimentos do municipio.
A cidade reclama instantemente o estabelecimento do matadouro publico e da canalisação d’agua potavel, etc. Primeiro deve fazer-se o matadouro, porque a saude publica está a soffrer por falta da inspecção rigorosa que deve soffrer o gado a abater-se, afim de evitar-se o consumo das carnes do gado doente, que os boiadeiros refugam; 2.º porque da inspecção resulta o saneamento do gado de que se tem descuidados os fazendeiros, uma vez que na matança particular, elles consomem os bois doentes!…
Continuemos, pois, a reclamar a falta do Matadouro, porque della resulta o mal a saude e difficuldades na arrecadação do imposto de sangue.
Não devemos mesmo deixar para um longo futuro a canalisação da agua, porque realmente é de grande necessidade attenta as boas condições que trara a saude do povo; mas com o pequeno fundo existente para esse fim destinado não poderá o Sr. Presidente do Municipio conseguir fazer obra duradoura. Despender aquella quantia com uma canalisação ephemera, será uma utopia, e estamos certos que isto não acontecerá porque a pratica nos tem demonstrado que as obras ephemeras têm dado muito prejuizo ao municipio, mesmo com referencia as nossas canalisações. Uma boa canalisação precisa de estudos technicos, e esperamos que o Exm.º Sr. Dr. Presidente do Estado², auxiliando o municipio, ordenara a vinda de um Engenheiro para fazel-os; e então a Edilidade reconhecendo o quanto de numerario precisa o Sr. Agente Executivo para levar a cabo esse melhoramento, promoverá os meios de armal-o, mesmo contrahindo emprestimo, se para isso se promptificarem os nossos capitalistas.
Para uma obra que reconhecemos de grandíssimo valor ao municicpio como é a fundação de uma “Fazenda Modelo”, já a Camara auctorisou ao seu Presidente a despender a verba de vinte contos de reis; pois bem, essa fazenda nos mostrará os processos mais aperfeiçoados em todos os ramos da agricultura patria, e se não tivermos preparada a mocidade, pouco adiantaremos, precisamos pois cuidar da educação dos moços, dando-lhes preparo sufficiente.
Assim como a Edilidade unanimamente promptificou-se em auxiliar o Governo do Estado para a fundação da “Fazenda Modelo” esperamos que se promptifique em auxilial-o na fundação de um “Grupo Escolar”, onde nossa mocidade colherá os conhecimentos bastantes, para dirigir seus serviços agricolas, industriaes e commerciaes. O antigo predio, onde funcciona a 1.º cadeira do sexo masculino, e que é proprio Municipal, não prehenche as condições adequadas para aquelle fim, e por isso houve proposta para vendêl-o e comprar-se novo predio que satisfizesse as exigencias para o grupo escolar, se esse projecto for avante, será obra de grande alcance estabelecer-se o Grupo Escolar. A classe agricola, aquem o governo dedica esforços para afastal-a da cega rotina que vae seguindo, vae lucrar muito com a fundação das fazendas modelos si os governos municipaes, não se descuidarem com os auxilios necesserarios á instrucção primaria. O moço trabalhador q’ colher os conhecimentos litterarios precisos; theorica e praticamente assistindo os trabalhos em uma fazenda modelo, vendo o movimento e manejo dos instrumentos aratorios, convencidos de suas vantagens, não roteará pelos sythemas antigos e rotineiros. O Criador nella achará uma fonte onde vae tirar os principios necessarios e sufficientes, em se tratando da zoothechnia, para bem plirigir a sua cria ainda deixada a mercê da natureza.
Esperamos, Sr. Redactor, q’ a Edilidade, com a unanimidade de seus pares, na proxima sessão ordinaria que se effectuará a 3 de maio do corrente anno tractara seriamente dos nossos serviços locaes que para bem de todos justamente reclamamos.
O Lavrador.
* 1: Olegário Dias Maciel.
* 2: João Pinheiro.
* Fonte: Texto publicado com o título “Snr. Redactor” na edição de 17 de março de 1907 do jornal O Trabalho, do arquivo da Hemeroteca Digital do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, via Altamir Fernandes.
* Foto: Primeiro parágrafo do texto original.