TANTÃ, O

Postado por e arquivado em CANTINHO LITERÁRIO DO EITEL.

Havia na esquina da Rua Major Gote com sua colega Maestro Randolfo um pequeno container adaptado onde funcionava um chaveiro. E há ainda na redondeza um personagem cuja cachola não funciona muito bem. Ele fica zanzando pelas imediações e até arrisca uma passeada no centro comercial que tem ali perto. Durante muito tempo nunca tinha reparado naquela estrutura de metal amarela, era como se ela não estivesse presente naquele ambiente. Eis que, certo dia, para espanto do profissional das chaves, o lunático estacou a passada bem em frente e ficou olhando, olhando e apenas olhando. E o chaveiro observando, observando e apenas observando.

Assim foi durante muitos dias. O chaveiro, sabedor das negativas condições mentais do homem, não dava à mínima e seguia seu trabalho. Vire e mexe, lá vinha o atrapalhado e lá ficava olhando, olhando e apenas olhando. Em uma das visitas, o chaveiro, só por curiosidade, resolveu inquirir:

– E aí, meu chapa, tudo bem? Está precisando de alguma coisa?

O sonhador deu um sorriso, balançou a cabeça e seguiu sua viagem alucinatória. Vez ou outra a pergunta era repetida e repetida era a atitude do desmiolado. Mas certo dia, a coisa foi diferente. O tantã chegou humildemente e falou:

– Ontem eu matei um gato. Depois você me conta um seu.

Sem compreender bulhufas o fraseado do homem, o chaveiro continuou sua rotina. E no outro dia, lá estava o tantã:

– Hoje eu tomei café com sal. Depois você me conta um seu.

E no outro dia:

– Tem barata lá em casa. Depois você me conta um seu.

Assim foi durante uma semana. A casa visita, o doido confessava uma estripulia mais estripulada que a outra. Até que um dia o lelé da cuca chegou com um palavreado diferente:

– Já te contei tantos, você não vai me contar nenhum?

Aí então é que o chaveiro ficou para valer impressionado com a doidice do homem. Mas perguntou:

– Você me contou tantos o que? E o que eu tenho que te contar?

O louco, timidamente, apontou para uma placa afixada na lateral do pequeno container. No que o chaveiro bateu o olho na placa, tudo se elucidou, comprovando fatalmente o grau de doidura do homem. Na placa havia duas palavras, apenas duas: TROCA-SE SEGREDOS!

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 28/02/2013 com o título “Prefeitura em 1916”.

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