ESTADO DA CADEIA PÚBLICA EM 1994

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Símbolo do descaso das autoridades com a segurança da comunidade, a Cadeia Pública de Patos de Minas funciona há várias décadas num precário prédio de estilo colonial, contendo apenas três celas. No pavimento superior está a Delegacia da Comarca e a central de Perícia Técnica. A área de carceragem situada no térreo, tem espaço para abrigar no máximo 20 detentos, em condições sub-humanas, pela falta de estrutura sanitária que apresentam atualmente. “Não é fácil garantir a segurança da sociedade patense diante da fragilidade do prédio da Cadeia Pública de Patos de Minas”, já desabafou o Delegado Regional de Segurança Pública, Raimundo Inácio de Oliveira, ao participar da Tribuna Livre da Câmara Municipal.

A forma mais simples que os presos descobrem para fugir da cadeia pública é furar buracos e atravessar facilmente as paredes do prédio, pois os velhos tijolos estão praticamente soltos. Esta prática já possibilitou inúmeras tentativas de fugas e, numa delas, os presos foram sair na sala de perícia, depois de furar o teto de uma cela. A tentativa só fracassou por que um detetive que estava na sala, conseguiu frustrar a fuga, acionando a guarda de segurança do presídio. Vale alertar que a cadeia abrigava vários presos considerados periculosos, preventivamente encarcerados na cela I, que oferece um pouco mais de segurança. Entre eles incluem-se, assaltantes, homicidas, traficantes de drogas, estupradores e outros condenados de longas penas.

XERIFE – A exemplo do que ocorre em outros presídios e penitenciárias, os detentos da Cadeia Pública local, também contam com um líder. Ele é conhecido como “Xerife” dos apenados, fica na perigosa Cela I, mas nenhum preso tem coragem de revelar seu verdadeiro nome. A maioria dos detentos se conforma com a idéia de ter um chefe e admitem naturalmente a existência de um líder para comandar as ações dentro do presídio. Possivelmente, foi o “Xerife” que orientou um recente motim na Cadeia Pública, quando os presos puderam fogo nos colchões em protesto contra a qualidade da alimentação servida aos encarcerados.

Os próprios detentos admitem que a Cadeia Pública de Patos de Minas é um verdadeiro “queijo-suíço”. Até o delegado da Comarca, Coriolano Lourenço de Almeida, faz piada com a precária situação do prédio. “De tanto os presos fazerem buracos e a polícia tapar com concreto, as paredes das celas já estão ficando mais firmes”, brinca ele, que também é diretor da cadeia Pública Municipal. Só este ano, foram registradas duas tentativas de fugas através de buracos feitos por detentos. No ano passado ocorreram seis fugas com a evasão de nove presos, sendo a maioria recapturados. Apenas o conhecido traficante Aéreo Manoel da Silva, popular “Piruá”, conseguiu ir mais longe, mas acabou sendo morto numa troca de tiros com a polícia de Goiás.

RESPONSABILIDADE – Mas afinal, de quem é a responsabilidade das fugas rotineiras que acontecem na Cadeia Pública de Patos de Minas? Esta questão já gerou uma acirrada discussão entre o Delegado Coriolano Lourenço e o comandante do 15.º BPM, tenente-coronel Vicente de Paula. Ambos trocaram farpas na imprensa tentando justificar a fuga de quatro presos que teriam escapado tranquilamente pela porta principal do presídio. Ao final do entrevero, a responsabilidade do caso recaiu exclusivamente sobre as costas do Estado. Acontece que, segundo a determinação da Constituição Estadual cabe à Polícia Militar manter unicamente a segurança externa dos presídios. Se isto acontecesse em Patos de Minas, a Cadeia Pública ficaria sob a guarda interna de apenas quatro carcereiros da Polícia Civil, encarregados de garantir a segurança das celas, onde são mantidos em média 60 detentos.

O ápice do problema está no desestruturado sistema carcerário do país, que logicamente reflete em todos os estados e municípios. Em síntese, a cadeia Pública local deveria funcionar como um mero depósito de presos para triagem e encaminhamento dos apenados com maior tempo de sentença. Ela é usada como presídio devido a uma Lei Estadual que permite que as cadeias municipais abriguem presos da justiça mesmo depois de julgados e condenados. Nos últimos quatro anos, o único detento de Patos de Minas transferido para um presídio Estadual foi o famoso “assassino de Coromandel”, José Humberto da Mota. Ele recebeu uma sentença de 139 anos de prisão por ter matado sete pessoas de uma vez só em 1.989. A falta de vaga nos presídios estaduais obriga as cadeias municipais a assumirem uma responsabilidade do Estado, jogando nas costas dos prefeitos um gravíssimo problema de ordem social.

PRIORIDADE – A construção de uma nova cadeia em Patos de Minas já transformou uma novela que não tem fim. Existe um projeto perfeito, um terreno doado, mas ainda falta recursos para que a obra seja iniciada, apesar da proposta tramitar nos órgãos competentes há cerca de cinco anos. “Para uma cidade com tantos políticos que se sentem tão importantes, esta falha é imperdoável”, lamenta um morador próximo ao atual prédio da Cadeia Pública, preocupado com os riscos constantes de fugas. A área de localização do prédio é considerada nobre e passa por uma profunda reforma urbana, com a canalização do antigo “Córrego da Cadeia”. Sobre o leito do ribeirão será inaugurada a futura Avenida Padre Almir Neves de Medeiros, importante via sanitária e de escoamento de tráfego, já em fase de conclusão, com custo estimado em 6,5 milhões de dólares advindos do Estado.

Guardadas as proporções sociais de cada prioridade, vale lembrar que, segundo os cálculos iniciais do Departamento de Obras do Estado (Deope), com 8% dos recursos investidos na referida obra, daria para se construir não só a cadeia de Patos de Minas, como também a sede própria da Delegacia Regional de Segurança Pública, com instalações para o Instituto Médico Legal (IML), postos de identificação, divisões administrativas, salas dos delegados e ainda sobraria dinheiro para aquisição do mobiliário.

* Fonte e foto: Texto publicado com o título “Queijo Suíço” e subtítulo “Buracos facilitam fugas da Cadeia Pública” na edição de agosto de 1994 da revista Diga, do arquivo de Luís Carlos Cardoso.

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