Patos de Minas, tem a felicidade de comemorar no dia de hoje, o lançamento solene, da pedra fundamental de um empreendimento de vulto. Solicitado por diretores desta futurosa e magnífica realidade, que será a Casa de Saúde e Maternidade Nossa Senhora de Fátima, para interpretar nesta solenidade tão empolgante e de tão grande significação, os sentimentos e os propósitos que orientaram os seus idealisadores, senti de chofre, que não me seria possível recusar tão grande honra e nem menospresar um privilégio tão magnífico.
Com o coração inteiramente aberto e imbuido de sentimentos os mais sinceros e os mais puros, procurarei delinear tanto quanto me permitam as minhas possibilidades, diante de todos quantos prestigiam com suas presenças a este acontecimento, quais as diretrizes que serviram de apoio, aos responsáveis mais diretos pela idéia de construir uma nova casa de saúde, que terá, com a ajuda de Deus, uma realidade irretorquivel, dentro de um futuro não distante.
Diretrizes nobres e humanitárias, destituidas de todos aqueles sentimentos menos nobres e menos dignos, que pudessem empanar o brilho desta obra, que será dentro em breve, mais um motivo de justo orgulho para a nossa terra e a nossa gente.
Nesse preambulo de nossas considerações, não nos seria possível fugir ao dever de felicitar com entusiasmo, àqueles idealistas obstinados, e por vezes mesmo teimosos, à vontade firme dos quais, Patos de Minas deverá dentro em pouco, um estabelecimento hospitalar verdadeiramente modelar e revolucionário; não estaríamos fazendo justiça, se deixassemos de colocar em evidência a atuação destacada e persistente dos Drs. José Wilson Ferreira Pires e Ary Guimarães, aos quais o povo desata terra atendeu pressuroso, em seus apelos em pról de um acontecimento de vulto. Povo altivo e laborioso, que compreendendo num relance, o grande significado e o enorme alcance desta obra magestosa, e a sua repercussão benfazeja na tranquilidade e na saúde da família patense, vem colaborando, decidida e entusiasticamente, para levar avante esta obra gigantesca, condizente com o enorme desenvolvimento alcançado por esta cidade. Estamos absolutamente certos, de que não seria bastante o idealismo de uns poucos sem o apoio popular, do mesmo modo que o apoio do povo, só é dispensado integral e desprendidamente, àqueles empreendimentos, que lhe inspirem uma confiança absoluta, a mais completa, a mais irrestrita e a mais cabal.
Não obstante o grande desenvolvimento alcançado pela medicina em nossa Patos de Minas, em comparação com os nossos recursos de outros tempos não distantes, deveremos reconhecer, que não possuimos ainda, nem aquele minimo absolutamente indispensável. Mesmo levando na devida consideração, os grandes passos dados por iniciativa particular, em materia de progresso médico, não poderemos nunca nos esquecer, de que para os nossos 70.000 habitantes, aos quais se somam os moradores dos municipios visinhos, só possuimos 3 estabelecimentos hospitalares, com um número de leitos insuficiente para a totalidade de nossas necessidades.
Ao lado da precariedade de acomodações, lutamos desesperadamente, com a pobreza imensa de nossos recursos técnicos, recursos indispensáveis ao bom desempenho da medicina verdadeiramente cientifica.
A cada instante que passa, nos vemos na contingencia, de recomendarmos aos enfermos confiados aos nossos cuidados, que procurem centros médicos mais adiantados que o nosso, numa demonstração eloquente de nossa incapacidade, para resolvermos grande número de casos. Esta deficiencia real, reconhecida por nossas inteligencias livres, não existiria por certo, se contássemos com requisitos indispensáveis para a resolução a contento, de todos os problemas que nos surgem a cada passo, no desempenho desta missão tão edificante e tão árdua; missão sublime, quando uma vida se entrega desprendidamente aos nossos cuidados, na esperança, tantas vezes frustrada, de que alcançará o seu completo e integral restabelecimento.
Nestas circunstancias, a saúde do enfermo é tudo, e a nossa vaidade profissional, o nosso amor próprio, devem ceder lugar, para permitirem aquelas providencias que se fazem necessárias para a salvação de uma vida. Por estas razões, quando colocados diante de nossos recursos falhos, não raras vezes temos procedido daquela maneira.
Todos nós que somos médicos, temos sempre em vista, em primeiro lugar, o bem estar daquelas creaturas que foram confiadas aos nossos cuidados, e que devem merecer de nossa parte, tudo quanto de melhor lhes possamos proporcionar.
Devemos sempre nos desdobrar em desvêlo, em atenção e em carinho, complementos indispensáveis de nossa capacidade profissional.
Temos a quasi certeza, de que a concretização da Casa de Saúde e Maternidade N. S. de Fátima, que necessita para o seu mais completo e absoluto exito, do integral apoio do povo de todo o municipio de Patos e das cidades visinhas, mesmo por se tratar de um empreendimento sem côr politico-partidaria, reduzirá a um minimo, o êxodo de doentes, que a todo o instante se dirigem a outros centros, reduzindo consideravelmente a proporção daqueles casos que teremos de enviar a uma instância superior.
Acreditamos mais, que o desenvolvimento inusitado que nos empolga e nos arrebata, Patos de Minas, dentro de poucos anos, será um centro médico bem organisado, respeitado por seus méritos científicos e pelo progresso irresistivel de sua técnica.
No entanto, para infelicidade nossa, e para desdouro de nossa classe, com repercussões incalculaveis no seio do próprio povo, vivemos desunidos e nos alimentamos de incompreensões e mal-entendidos.
Conhecendo de ante-mão, das intenções sérias daqueles que têm sobre os seus ombros, os principais encargos que resultarão na futura Casa de Saúde, que hoje recebe as bençãos de Deus, eu me permito fazer, aproveitando este ensejo que se me oferece, a todos os médicos de Patos de Minas, um veemente e sincero apelo, no sentido de um melhor entendimento e de um desarmamento dos espíritos, em pról de um futuro melhor, mais cordial, mais humano, mais respeitoso e mais ético.
Mesmo que os frutos resultantes destes bons propósitos formulados, não sejam colhidos num futuro imediato e portanto tardem em surgir, cremos na sua possibilidade, desde que cada um de nós, se empregue sinceramente na concretização deste ideal. Eu penso que, “pari-passu” com o soerguimento do magnífico Bloco que se elevará deste local, poderemos também elevar, acima de nossas paixões, tão próprias dos sêres humanos, um edifício magnífico de compreensão, de entendimento e de cordialidade.
Caso tenhamos boa fé e humildade, não nos julgando nunca superiores aos outros, haveremos de admitir sem maiores delongas, a possibilidade da co-existencia cordial de todos os estabelecimentos hospitalares de Patos de Minas e ainda mais, o intercambio técnico e científico entre todos eles, sem excepção. A cada hora que passa, mais nos convencemos de nossas próprias deficiencias, fraquezas e imperfeições, fazendo com que julguemos melhor, com mais justiça e com menos orgulho ao nosso proximo, pelo julgamento prévio de nós mesmos.
Quem mais lucrará coma a realização destes propósitos, na medida em que eles sejam possíveis, sem ferir melindres e nem susceptibilidades, dando tempo ao tempo, para que se encarregue de desfazer as brumas, porventura existentes no passado de nossas mútuas relações, serão os nossos proprios clientes, aqueles que nos procuram para conseguirem alivio para os seus padecimentos.
E não teremos mais o desprazer, de constatarmos a angústia de certos doentes que nos procuram, temerosos de que, por haverem consultado a um médico que supoem não seja nosso amigo, se utilizam de mentiras e de subterfúgios, como se houvessem cometido um crime inominável. Cada doente, consulte o médico que seja do seu agrado e da sua confiança; depois então, usando de um direito inalienavel que lhe pertence “in-totum”, procure a outro se assim o desejar, para poder encontrar enfim, calma e tranquilamente, sem outros sobresaltos que não aqueles impostos pela propria enfermidade, o almejado alivio para os seus sofrimentos.
Encerrando estas palavras, com as quais mais uma vez louvamos ao povo de Patos de Minas e à diretoria da Casa de Saúde e Maternidade N. S. de Fátima, ao ensejo do lançamento desta pedra fundamental quero pedir a Deus, nesta ante-véspera do Congresso Eucaristico Internacional, que ilumine e proteja a todos os médicos desta terra, para maior felicidade do bom povo de Patos, que confia naqueles que são os responsáveis pela manutenção de sua saude fisica.
* Fonte: Texto publicado na edição de 19 de junho de 1955 do jornal Correio de Patos, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.
* Foto: Do livro Fotohistória do Hospital Nossa Senhora de Fátima, de Oliveira Mello.