No final da década de 1970, Lizandro Souza e Vanir Amâncio resolveram criar um “clube ecológico” incrustrado no meio de uma mata urbana não muito afastada do centro. No terreno de pouco mais de sete hectares, uma típica mata de galeria por onde corre o Córrego da Caixa D’água, originalmente possuía nascentes e alguns pequenos lagos naturais. Na concepção original dos dois empreendedores surgiria para Patos de Minas um típico “clube campestre”, onde os futuros sócios poderiam se sensibilizar com as belezas da natureza, onde cada associado pudesse passar o dia com sua família em contato com a flora farta e a fauna com seus inúmeros espécimes de pássaros, tatus, ouriços-cacheiros, gambás, tartarugas e pequenos símios que alegremente pulavam de árvore em árvore.
O fato inédito e inusitado, um “clube campestre” perto do centro da cidade, gerou descrédito por parte da maioria da população. Entretanto, Lizandro e Vanir resolveram bancar o empreendimento, na certeza concreta de que quando o clube estivesse, se não totalmente concluído, mas em condições de receber confortavelmente os sócios, estes seriam seus maiores propagadores para o sucesso definitivo. Então, mãos à obra. E as obras começaram.
Quando as “primeiras enxadadas” se fizeram ouvir, as “cotas” começaram a ser vendidas. Não foi fácil vender sociedade num clube campestre desenhado apenas no papel. Muitos diziam que o local era muito afastado do centro, que aquela área só servia para criação de gado e, pasmem, que muitos “bandidos” se escondiam naquela mata. Mas o projeto seguiu em frente, mesmo com poucas cotas vendidas, e mesmo com as obras sendo tocadas lentamente por falta de recursos apropriados para maior ligeireza.
No início da década de 1980, o Mocambo Clube de Recreio foi aberto para o lazer dos sócios, mesmo ainda não completamente finalizado. Basicamente, a infraestrutura envolta pela mata e pelo Córrego da Caixa D’água continha um lago, piscinas, quadras, barzinho, trilhas e muito espaço verde para alegria dos “pulmões sedentos de ar puro”. A previsão inicial dos empreendedores, de que tão logo o clube estivesse aberto aos sócios estes seriam seus principais propagadores, se fez presente, pois a área se tornou a diversão principal dos finais de semana daqueles e dos muitos que começaram a chegar como novos sócios. Para alegrar mais ainda os mantenedores financeiros, isto é, os associados e seus convidados, foram instaladas jaulas que receberam como hóspedes alguns felinos selvagens que não queriam ficar de jeito nenhum morando entre grades.
Foram poucos anos de otimismo. Os “sócios” não vieram na quantidade necessária para a mantença do clube e os empreendedores não tinham estrutura financeira para sustenta-lo. Então, sem a manutenção adequada da infraestrutura, já não vinham novos sócios e os presentes foram se fazendo ausentes. Comentários não registrados em cartório dão conta de que muitos tiveram prejuízo no fracasso do clube. Na tentativa de salvar a bela ideia do projeto, a Prefeitura resolveu contemporizar a problemática campestre. A Lei n.º 2.077, de 14 de novembro de 1985, autorizou a abertura de crédito especial para fins de indenização pela desapropriação do clube, estando assim descrita:
O Povo do Município de Patos de Minas, Estado de Minas Gerais, por seus representantes decretou, e eu, em seu nome, sanciono a seguinte Lei.
Art. 1º – Fica o Chefe do Executivo Municipal autorizado a abrir crédito especial no montante de até Cr$150.000.000 (cento e cinquenta milhões de cruzeiros) destinado ao pagamento de indenizações pela desapropriação do Mocambo Clube de Recreio, nos termos dos decretos 766 e 767/85.
Art. 2º – Fica igualmente autorizado o Chefe do Executivo a utilizar como fonte de recursos necessários para atendimentos às despesas decorrentes da aplicação desta lei, o excesso de arrecadação apurado no vigente orçamento.
Art. 3º – O crédito especial a que se refere o artigo 1º desta lei, terá vigência até o exercício financeiro de 1986, nos termos do § 4º do art. 62 da Constituição Federal e art. 45 da Lei 4.320/64.
Art. 4º – Revogadas as disposições em contrário, esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Prefeitura Municipal de Patos de Minas, 14 de novembro de 1985.
Arlindo Porto Neto – Prefeito Municipal
Cinco anos após a desapropriação pela Prefeitura, esta não conseguiu, também, manter adequadamente a infraestrutura do clube, que a cada ano se via tomado pelo mato indesejado e abandonado pelos visitantes. Tornou-se urgente uma medida mais drástica para preservar aquela área verde. Diversas reuniões de autoridades competentes foram realizadas para a solução do imbróglio verde. A primeira concordância se transformou na Lei n.º 2.578, de 28 de março de 1990 com o seguinte título: Declara de Preservação Permanente Área de Proteção à Nascente do Córrego da Caixa D’água e do Parque Municipal do Mocambo. Esta lei, no seu artigo 1.º estabelece como 101.769,33 m² a extensão da área preservada, e em seu artigo 2.º estabelece os seus limites.
Fato interessante é que na lei citada acima, o Executivo se referiu ao parque como “Parque Municipal do Mocambo” e não “Mocambo Clube de Recreio”. Interessante porque foi a Lei n.º 2.586, lançada dois dias após, que criou oficialmente o parque com o título Cria o Parque Municipal do Mocambo e dá Outras Providências. E mais interessante ainda, enquanto a lei que determinou a proteção permanente à nascente do Córrego da Caixa D’água estabeleceu uma área de 101.769,33 m², na nova lei a área limitada pelo parque ficou em 64.265,50 m².
Eis então que a Prefeitura assumira de vez o então Mocambo Recreio Clube e agora Parque Municipal do Mocambo. Em 20 de fevereiro de 1998, alguns lotes localizados no vizinho Bairro Jardim Paraíso, numa área de 5.437,80 m², foram incorporados à região protegida, de acordo com a Lei n.º 4.550. Mesmo com a aparente mão protetora da Prefeitura, o Parque não foi adequadamente supervisionado e sua estrutura de local de lazer para os patenses foi se deteriorando.
Na realidade, a cada ano que passava as autoridades competentes davam mais e mais as costas para tão aprazível ambiente verde. A edição de 20 de janeiro de 2001 do jornal Folha Patense, ao publicar um comentário da Juiza do Trabalho Alice Lopes do Amaral, nos mostra um exemplo das más condições do Parque:
Todas as noites me lembro dessa história, quando ouço o rugido-lamento do leão que está confinado numa pequena jaula, no Parque do Mocambo, sem companhia, sem espaço, preso apenas para ser visto e para demonstrar de quanta crueldade somos capazes. Ninguém se condói, ninguém denuncia, ninguém fala nele. Porque foi condenado ao martírio? Porque não foi mandado para outro lugar, já que em Patos não existe um jardim zoológico? Como veio parar aqui? Como é que o IBAMA não toma uma providência? Moro perto do Parque do Mocambo e vi o “Rei das Selvas” apenas uma vez. Nunca mais levei minhas netinhas ao Parque, para que não pensem que a humanidade é toda assim, capaz de deixar um animal exposto à visitação pública naquele estado. Eu não vi um leão majestoso e imponente naquele cubículo. Vi uma prova da insensibilidade daqueles a quem cabe zelar pelo bem estar dos animais. Sei que, num mundo onde crianças são exploradas e prostituídas, a sorte dos animais não poderia mesmo interessar. Mas, em Patos de Minas, é difícil acreditar que essa situação vai continuar existindo. Imaginem o paradoxo de se convidar os turistas, durante a Festa Nacional do Milho, para uma visita ao Parque do Mocambo… Que juízo seria feito de nós? Seria bem melhor que não houvesse um leão aqui.
Mas, parece, que naquele momento as autoridades não estavam tão despreocupadas assim. Quem sabe devido ao apelo da população que clamava pela recuperação do Parque, resolveram tomar uma atitude. Na mesma edição do citado jornal, uma matéria anunciava algumas ações:
O Parque Municipal do Mocambo será fechado, provisoriamente, para remoção dos animais selvagens e, com isso, promover pequenos reparos. O secretário de Serviços Públicos, Júlio César Fonseca, informou que esta medida está sendo adotada, para garantir segurança à comunidade. Segundo ele, o Parque precisa de uma atenção especial e, no primeiro momento, há necessidade de reparos imediatos nas jaulas dos animais que, por estarem deterioradas, comprometem a segurança dos visitantes. […] Júlio César acredita que será necessário implementar uma grande reforma, com a execução de um projeto especial, envolvendo não só a reforma do parque em seus atrativos, mas, principalmente a drenagem da bacia do córrego da Caixa D’água, que tem nascente na área do parque.
O Parque ficou fechado quase quatro anos e sofreu uma boa recuperação. Enquanto as obras eram efetuadas, que para o desejo do povo era necessário transformá-lo no nosso “Parque do Sabiá”, as autoridades tiveram tempo para atitudes políticas que em nada contribuem para a salvação daquela aprazível área verde. Em 29 de maio de 2003, a Lei n.º 5.293 alterou o nome do Parque para Parque Municipal do Mocambo Vereador Geraldo Martins. A foto da placa de reinauguração, acontecida em 05 de dezembro de 2004, deixa-nos a impressão que daquele momento em diante o Mocambo seria eternamente cuidado. Ledo engano, pois após o bom trabalho de reestruturação o Parque foi novamente abandonado, caindo no esquecimento e proporcionando nova erosão de sua infraestrutura. E sua sina de abandonado continuou.
Os anos se passaram céleres, e o agora majestoso Parque Municipal do Mocambo Vereador Geraldo Martins continua em busca de socorro. Em março de 2010, foi anunciada uma nova revitalização, numa parceria entre a Prefeitura e a COPASA. Ficou no papel. Para piorar a situação, em outubro do mesmo ano o Executivo foi condenado a pagar uma dívida de R$ 15 milhões de reais a um dos donos da área na ação de desapropriação efetuada na década de 80. A processo ainda rola na Justiça. De importante, aconteceu em suas dependências em maio de 2010 a inauguração da nova sede do Conservatório Municipal Galdina Corrêa da Costa Rodrigues. Em novembro de 2013, uma empresa patrocinou o replantio de diversas árvores. E no mesmo mês, como atestado de abandono do Parque, o jornal virtual Patos Hoje comentou:
No entanto, queimadas, poluição dos mananciais, depredação, presença de usuários de droga e andarilhos afastam a população do local. No último fim de semana, o Corpo de Bombeiros atendeu uma ocorrência no parque que deixou todos assustados. Uma garota de 12 anos teve que ser socorrida após grande consumo de álcool. Ela foi levada ao Hospital Regional em coma alcoólico.
E assim, abandonado, continua o potencial e majestoso Parque do Mocambo em sua luta pela sobrevivência, sem a gente esquecer que desde maio de 2003 ele se chama “Vereador Geraldo Martins”.
* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.
* Foto 1: Showmystreet.
* Fotos 2 e 3 (25/04/2014): Eitel Teixeira Dannemann.