MARIA DE LOURDES FARIA DE QUEIROZ (DONA PIQUETA)

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Na opinião de Júlia Morim, Consultora da Fundação Joaquim Nabuco, “Mães de umbigo, curiosas, parteiras do mato ou simplesmente parteiras são mulheres detentoras de conhecimentos acerca de costumes, técnicas e saberes ‘da arte de botar gente no mundo’, como chamou Mário Souto Maior. Essas mulheres, que sobrevivem de outras ocupações, vivenciam a mesma realidade sociocultural das mulheres atendidas e consideram seu ofício de parteira como mais uma de suas atribuições: ‘pegam menino’ por solidariedade ou para suprir uma necessidade da comunidade onde vivem. Portanto, é comum não cobrarem pela atividade. Dia ou noite, embaixo de sol ou de chuva, ‘acodem’ outras mulheres que dão à luz aos seus filhos em regiões de difícil acesso ou periferias de grandes cidades”.

Patos de Minas teve o privilégio de ter entre sua gente uma digna representante da classe: DONA PIQUETA. Maria de Lourdes Faria de Queiroz, a Dona Piqueta, nasceu em Uberaba-MG no dia 07 de agosto de 1920, filha de Eduardo Francisco Faria e Maria Justina de Azevedo Faria. Ficando órfã aos 4 anos de idade foi criada pela avó materna, Maria Ludovina da Silva. Estudou no Colégio Nossa Senhora das Dores. Fez curso particular de Enfermagem com o Dr. Sabino Vieira de Freitas, do qual foi o braço direito durante muitos anos no Hospital Santa Maria. Já aos 15 anos de idade era professora no curso de Puericultura, quando também atendia partos, sem o auxílio de qualquer pessoa. Em 20 de maio de 1942 casou-se com o patense Pedro Caixeta de Queiroz, em uma cerimônia modesta na Catedral de Uberaba. Dois meses após, o casal mudou-se para Patos de Minas, mais precisamente em 30 de julho. Foi o início de uma jornada de mais de 30 anos exercendo a abençoada atividade, sempre com o apoio do marido Pedro, período no qual realizou mais de cinco mil partos, todos, sem uma única exceção, com sucesso, incluindo uma noite em que atuou em cinco deles.

Dona Piqueta atendia com amor tanto as famílias mais abastadas quanto as mais carentes. Fazia partos na beira do rio, nas casas de pau a pique, passando as noites com fome, às vezes sendo servida apenas com um pouco de farinha de mandioca ou jiló cru, tamanha era a pobreza das pessoas que atendia. Além de nada receber pelo seu trabalho, nesses casos ela própria incumbia-se de levar alimentos durante dias para garantir a recuperação daquelas mães. Inúmeras vezes foi à Zona Boêmia, em casas de Eva Branca, Joaninha, Brama e outras, onde atendia com amor e respeito as meretrizes, como se atendesse a mais fina dama da sociedade. Quando a situação exigia, internava a paciente e responsabilizava-se pelas despesas.

Durante toda a sua vida de parteira, Dona Piqueta teve o apoio do Médico Benedito Corrêa da Silva Loureiro que, prestativo, atendia aos seus chamados quando ocorria hemorragias ou a necessidade de cesariana, chegando às vezes a pé, de pijama e chinelos.

Em 07 de agosto de 1972, Dona Piqueta completou 72 anos de idade. Vários amigos se reuniram em uma missa em ação de graças pelo aniversário onde foi lida uma mensagem de Déia da Fonseca, mensagem esta que foi publicada na coluna Patos Society (Sandra Castro) do jornal Correio de Patos, edição de 15 de agosto:

Caríssima D. Piqueta. É o momento de ação de graças e muito temos a agradecer ao Senhor pela sua vida. Numa época em que a vida é atacada de tantas maneiras, a senhora foi alguém que, com suas mãos santas, trouxe ao mundo centenas de crianças (entre elas esta colunista), valorizando e defendendo o grande dom de Deus, que é a vida. Quantos aqui somos testemunhas da sua dedicação, das noites e noites que passou em claro, pacientemente, ajudando com seus cuidados e carinho as mães nos seus momentos difíceis. Sofreu com seus sofrimentos e se alegrou com sua felicidade, ao terem nos braços os filhinhos que ajudou a nascer. D. Piqueta, hoje em dia o mundo está cheio de heróis que são cantados em verso e em prosa nos meios de comunicação. Porém, heroína para nós é alguém como a senhora, que soube dar a vida no silêncio do trabalho escondido, cumprindo com dignidade a nobre missão que Deus lhe confiou. Agora, aposentada, já vai ficando longe o seu tempo de luta ativa. Porém, nós estamos aqui hoje para abraçá-la, rezar junto com a senhora, mostrar que seus inúmeros amigos não a esqueceram e continuam gratos e, sobretudo, agradecer a Deus por tê-la colocado em nosso meio. Que Deus a abençoe e guarde, D. Piqueta, e lhe dê ainda muitos anos de vida feliz junto aos seus.

Os vereadores Edimê Erlinda de Lima Avelar e Paulo Batista de Castro, na sessão da Câmara Municipal de 04 de fevereiro de 1994, apresentaram o Projeto de Decreto Legislativo n.º 003/94, que assim determina em seu artigo 1.º: Fica concedido à Sra. MARIA DE LOURDES FARIA DE QUEIROZ “DONA PIQUETA”, o Título Honorífico de Cidadã Patense. O título foi outorgado em 15 de julho de 1994 e assinado por José Osmar de Castro, Presidente; Valter Carneiro de Lima, 1.º Vice-Presidente e Cleonaldo Raimundo Silva, 1.º Secretário. Na mesma data, a homenageada enviou à Câmara um cartão de agradecimento: Os meus sinceros agradecimentos à Câmara Municipal pelos momentos de rara felicidade que me proporcionaram. É muito gratificante saber que os trabalhos que prestei à comunidade hoje são reconhecidos pela edilidade patense, que é a representação fidedigna da nossa gente. Um abraço a todos os vereadores e em especial aos amigos Edmê de Lima Avelar e Paulo Batista de Castro, autores do decreto que concedeu-me este honroso título. Obrigado aos organizadores do evento.

Dona Piqueta também foi homenageada pela BPW-Associação de Mulheres de Negócios e Profissionais de Patos de Minas (filiada à International Federation of Business and Professional Women). Em comemoração ao Dia Internacional da Mulher, 08 de março, em 1999 ela recebeu um diploma com os seguintes dizeres: A BPW de Patos de Minas, no dia Internacional da Mulher, confere a Maria de Lourdes Faria Queiroz pelo valor de seu Trabalho Pioneiro na abertura do espaço para a mulher como participante ativa da sociedade patense.

Maria de Lourdes e Pedro tiveram três filhos: Helena, Hely e Helga. Pedro partiu definitivamente em 29 de julho de 2003. Se foi o destino ou não, se foi a ausência ou não, Maria de Lourdes partiu em busca de Pedro um mês após, em 30 de agosto. Atualmente a família registra nove netos e sete bisnetos. Se existirem partos no Céu, como na Terra, é certo, como dois mais dois é igual a quatro, que DONA PIQUETA estará em ação.

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Fonte: Mylene Queiroz de Melo Simão (neta, filha de Helena)

* Foto: Pedro, Piqueta e o bisneto Rafael (filho de Silene, filha de Helena), do arquivo de Mylene Queiroz de Melo Simão.

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