O vibrante e bem informado repórter Rodolfo Foquento, da PRK25, a mais ouvida emissora de rádio em Periquitinho Verde e região do Alto Aguaprarriba, informou há pouco tempo que a ONU – Organização das Nações Unidas, decidira tratar com um pouco mais de atenção o triste e lastimável fato que vem ocorrendo em certas partes do mundo: a morte de um número cada vez maior de pessoas, principalmente crianças, por não terem o que comer. Em razão desse posicionamento a entidade tomara a iniciativa de promover uma pesquisa sobre a fome no mundo, e para tanto solicitava aos moradores de cada um dos aglomerados humanos espalhados pelo planeta, que respondessem a uma pergunta simples e direta:
“Por favor, diga honestamente qual a sua opinião sobre a escassez de alimentos no resto do mundo”.
Esse pedido da organização representativa dos países de primeiro e terceiro escalão – além de outros, que de tão inexpressivos não têm classificação – mexeu com o brio e sentimentos dos cidadãos de boa cepa (é verdade, ainda existe no mundo gente que se preocupa com o bem estar de seus semelhantes). Infelizmente, hoje esses homens são bem poucos, e o que é pior, já não têm substitutos à altura, porque ao serem avaliados pelos padrões atuais de moralidade pública como indivíduos de procedimento ultrapassado e, portanto, sem qualquer serventia, não estimulam a formação de sucessores que, como eles fizeram, também cultivem sentimentos nobres inspirados, por exemplo, na decência e nobreza de caráter.
Com o início da pesquisa, emissoras de rádio, jornais, revistas e redes de televisão começaram a se interessar vivamente pelo assunto, e entre esses tantos e tantos veículos de comunicação incluía-se, como não poderia deixar de acontecer, a PRK25 – Rádio Periquitinho, porque quando o negócio é manter o público bem informado, isso é com ela mesmo, sim senhor. A princípio as coisas andaram timidamente, em passo de cágado, é verdade, mas pouco a pouco esse acompanhamento foi ganhando amplitude e ressonância, fazendo crescer, em paralelo, o falatório de que a pretensão da entidade sobre conhecer a opinião do público a respeito de assunto tão simples, não era o que parecia ser. Em outras palavras, o estômago vazio, a necessidade imperiosa de comer alguma coisa, ou a conseqüente inanição, não eram as causas do genocídio cuja culpabilidade permanecia sem réu confesso ou inconfesso.
Por causa disso, as dúvidas e incompreensões começaram a aparecer, empanando a luminosidade da iniciativa que surgira como um raio de esperança para os condenados à morte pela inanição. As primeiras manifestações desse desentendimento vieram dos Estados Unidos, cujas autoridades não conseguiam entender o significado da expressão “resto do mundo”.
– O que é isso? – indagava um perplexo senador ao assessor mais importante do presidente daquela nação, e este respondia com cara de quem está mais perdido que cego em tiroteio na favela da Maré: – Se você não sabe, eu é que vou saber?
Para não ficarem em segundo plano, os cubanos, vizinhos que não devem ser considerados como “de parede” dos gringos, pois o que os separa não são tijolos, mas sim um braço de mar, também questionaram.
– Opinião? Que troço é esse?
Segundo se comenta, os que conheciam o significado da palavra saíram da ilha praticamente a nado, ao passo que os ainda moradores curiosamente não sabem nadar. Enquanto isso, do outro lado do oceano, os africanos levantaram o dedo e perguntaram com a curiosidade estampada no rosto:
– Será que vocês poderiam nos esclarecer o que é esse tal de alimento?
Bem ao sul do continente americano os argentinos tomaram conhecimento da pergunta formulada pela ONU e se indagaram perplexos: – Esse ‘por favor’ quer dizer o quê? Ninguém sabia. Foi certamente por isso um brasileiro da fronteiriça Uruguaiana, que ouviu essa indagação em Passo de Los Libres, do outro lado do rio Uruguai, aonde tinha ido para abastecer o seu automóvel, comentou com a mulher: – Não é á toa que se você misturar as letras que formam a palavra ‘argentino’, e reagrupá-las de forma diferente, vai acabar encontrando um ‘ignorante’. Experimente.
Ao norte, os europeus não conseguiram entender o significado de escassez. E bem que tentaram. – O que será que eles estão querendo dizer com isso? – perguntou o alemão ao francês. – Sei lá! Talvez o inglês possa nos dar uma dica – respondeu o indagado. Mas este também estava por fora. E assim a consulta foi percorrendo o continente, de boca em boca, até desaparecer na imensidão da Sibéria.
Com relação ao Brasil, a questão chegou ao congresso nacional, que até hoje está discutindo o significado de “honestamente”. Inclusive se ouviu dizer no plenário, em aparte de não sei quem, que a casa merecia respeito, e que por isso os palavrões deveriam ficar na praça, do lado de fora.
Pretendendo ajudar os congressistas, O “Jornal Sem Igual”, da emissora de televisão “Vem Ver, Bobo”, ao se manifestar sobre o assunto, declarou que a palavra, vinda do latim “honestas”, qualificava o que era probo, correto, decente e honrado, mas que praticamente desapareceu do vocabulário popular em virtude de ter sido substituída por expressões como “eu não sabia de nada!”, “não existem provas”, ou “isso é intriga da oposição”. O que não deixa de ser um sinal dos tempos em que vivemos.