Filha de Aurélio Caixeta de Melo e D. Henriqueta Caixeta de Melo, nasceu em Patos de Minas em 17 de novembro de 1910. Fez o curso primário no Grupo Marcolino de Barros, que funcionava onde atualmente está o Colégio das Irmãs, seguindo posteriormente para Oliveira (MG), onde cursou o Adaptação e o Normal, que concluiu em 1928. É solteira.
Por que a senhora foi estudar em Oliveira?
Naquela época não havia os cursos de Adaptação e Normal aqui em Patos. Éramos vinte e quatro alunas daqui: Pegávamos o trem em Catiara e íamos até lá, em uma viagem que durava dois e até três dias e ficávamos lá o ano inteiro, sem vir em casa nas férias de meio de ano, por causa da distância.
A senhora foi sempre uma aluna exemplar?
Não. Nunca fui a primeira da classe, nem a aluna exemplar, mas nunca tirei uma nota baixa.
Após a formatura, qual foi o seu destino?
Vim direto para Patos e comecei a lecionar aqui nesta sala ao lado, no ano de 1929. (Estamos em sua residência, à Rua Afonso Pena, esquina com Major Gote).Como e por que surgiu a idéia de sua escola?
Desde pequena eu costumava dar aulas para as crianças da vizinhança aí nas esquinas. Dava catecismo, tomava tabuada. Cheguei formada e com grande entusiasmo e desejo de lecionar e logo no ano seguinte, comecei aqui em casa mesmo. Meus primeiros alunos foram os filhos do Sr. Abdias Caldeira Brant, lá das Alagoas; a Carminha do Sebastião Amorim e mais outros, num total de dez alunos.
A senhora nunca lecionou em nenhuma das escolas de Patos?
Logo no início, o Sr. Vicente Barbosa, que era o Diretor do Grupo Marcolino me convidou para que eu fosse para lá, porque a Wanda Mourão estava lecionando para uma classe com 80 alunos do 2.º ano. Meu pai me aconselhou a aceitar o convite e eu lecionei lá durante o ano de 1929 somente e resolvi voltar para a minha escola.
O crescimento de sua Escola foi rápido?
Dentro de pouco tempo a sala não comportava mais o número de alunos e então passei a escola para a União dos Moços Católicos, aqui na Praça Antônio Dias, ao lado da “Casa do Joãozinho”. Lá eu já lecionava de manhã e à tarde, por causa do número de alunos e houve até uma época, em que eu lecionava em três turnos, das 7 às 10, das 11 às 14 e das 14 às 17 horas. Pouco depois transferi a escola para esta casa de meu pai aqui em frente (confluência das Ruas Afonso Pena, Teófilo Otoni e Major Gote), onde fiquei até o encerramento de suas atividades.
Quais as séries que existiam na Escola?
Da primeira à quinta série e eu lecionava para todas elas.
Qual era o número de alunos quando a Escola se transferiu desta sala?
Não me lembro bem, mas lá na União dos Moços Católicos, havia uns 130 a 150 alunos: todas as salas ficavam cheias.
E a senhora continuou a lecionar sozinha?
Não. Quando a escola cresceu mais, a Maria Maroquinha Borges (cunhada do Joãozinho Andrade) passou a me auxiliar e depois dela, vieram a Irene Borges, a Lúcia Madalena de Melo, minha irmã, que lecionou muitos anos, Marinha Maciel e outras.
A senhora teve dificuldades e problemas no início de sua Escola?
Demais da conta. Tive muitas dificuldades. Ninguém me auxiliava nem me dava nada. No governo do Alcides Lins eu fui a Belo Horizonte para conseguir alguma coisa para a escola e recebi talvez umas duas centenas daqueles cadernos de dez folhas, poucas caixas de um giz duro que não escrevia e alguns lápis também muito duros, que não pagaram a viagem.
Todos os alunos pagavam? Era compensador financeiramente?
Todos os alunos pagavam, mas não era compensador, porque eu cobrava muito pouco. Papai sempre dizia: “Olha minha filha, você deve cobrar pouquinho, para que tanto o rico como o pobre possam estudar”. E eu sempre o atendi, embora muita gente sempre me estimulasse a cobrar caro. Mesmo assim, não eram raros os casos dos que deixavam de pagar e me davam prejuízo.
Qual era o nome oficial da escola que sempre foi chamada de “Escola da Dona Madalena”?
A escola foi registrada em Belo Horizonte, no dia 4 de novembro de 1929, sob o N.º 2583, com o nome oficial de Escola “Madalena Maria”.
O currículo escolar era o mesmo nas escolas do governo?
Era igualzinho.
A senhora se lembra do nome de alguns alunos que concluíram o curso na primeira turma?
Tenho aqui o livro de registros das atas onde está a primeira, de novembro de 1931, da qual constam os nomes e as médias dos alunos:
Do 1.º para o 2.º ano: José Borges Filho (Juquinha), Cristóvão Caixeta de Melo, Gerson Borges Amorim, José Maria Caixeta Borges, José Afonso Queiroz (Filhinho), Maria de Lourdes Queiroz, Raul Caixeta de Queiroz.
Do 2.º para o 3.º: Sebastião Borges de Amorim, Benedito Caixeta de Melo.
Do 3.º para o 4.º: Geraldo Caixeta de Melo, Suzana Borges, Maria de Lourdes Borges, Ofélia Borges, Maria Elvira de Souza, Elvira Maria de Souza, Ana Carneiro de Abreu, Maria Caixeta de Melo e Maria Caixeta de Souza.
Naquela época, quando não eram comuns as escolas particulares, como sua escola era vista pelos inspetores e demais autoridades do ensino?
Sempre com muita atenção e respeito. Vejam este termo de visita registrado neste livro:
“Em cumprimento a minha missão de Assistente Técnica Regional, apresentei-me no dia 2 de abril, na Escola Particular “Madalena Maria”, mantida pelas professoras normalistas Madalena Maria de Melo e Maria Maroquinha Borges.
Funciona a Escola em prédio bem localizado, dispondo de salas adequadas ao mister.
Estive presente a várias aulas, constatando assim que o ensino é ministrado com critério e proficiência, sendo observado o programa de ensino primário em vigor.
Com muito prazer, acedi ao convite das professoras, dando algumas aulas e orientando-as de um modo geral sobre a aplicação dos nossos métodos de ensino, aconselhando-as que adotassem o sistema de correlação das matérias, muito mais interessante e econômico. Iniciei-as ainda, na prática do método-projeto tão rico de atividades e de tanta eficiência.
Terminando pois a minha visita a este modelar estabelecimento, cumpre me recomendar às suas dignas professoras que observem o artigo 8.º do regulamento, a fim de darem cumprimento a todas as suas exigências.
Dos 52 alunos que se acham matriculados, verifiquei no dia da inspeção, a presença de 49.
Para efeitos regulamentares peço que se tire deste uma cópia.
Patos, 2 de abril de 1932.
Leonildes Scarpellini Montandon
– Assistente Regional -”
Há muitos outros termos de visitas elogiosas. Houve entretanto, um inspetor que disse por aí, que precisava que se acabasse com a minha escola, porque os alunos que poderiam pagar a sopa e a merenda escolar, vinham para cá, restando apenas os pobres para o Grupo Marcolino.
Quando sua escola encerrou as atividades por aqui?
As atividades foram encerradas em 1973, quarenta e quatro anos depois, sem interrupção. Eu havia me aposentado em 1972 e lecionei ainda mais um ano. Naquela época, já havia um grande número de escolas do governo por aí e o número de alunos já era pequeno. Tínhamos 10, 12, quando muito 15 alunos por classe.
A senhora poderia mencionar os nomes de alguns de seus ex-alunos, bem sucedidos na vida?
Olha, existem inúmeros, porque milhares de alunos passaram pela minha escola. Poderia citar por exemplo, o Dr. Arlindo Porto Neto e o Dr. Aldo Lino Silva, atuais Prefeito e Vice-Prefeito de Patos; o Dr. Dácio Pereira da Fonseca; ex-Prefeito; Dr. Paulo José de Amorim; Prof.º José Paschoal Borges de Andrade; Leopoldo Porto; Dr. Murilo Corrêa da Costa; Oswaldo Amorim e suas irmãs; José Magalhães; Dr. Antônio Vieira Caixeta; Dr. Sebastião Borges de Amorim; Dr. Wolmar Olympio Borges; Dr. Antônio Felisberto Borges; Artur Gonçalves da Silveira; Edson Ferreira e seus irmãos da Casa das Representações; Padre Roldão; meus irmãos Cristóvão e Breno; Dr. Paulo; Dr. Helvécio e Dr. Fábio Ferreira Borges; Olavo Amorim; Ernani Santos; Prof.ª Marta Caixeta de Queiroz; Walmir Caixeta de Castro e tanta gente mais.
A senhora teve grandes decepções na sua carreira?
Grandes decepções não, porque malandragem e problema de alunos a gente espera mesmo. Tenho no entanto, uma grande paixão que sempre comento: lecionei 43 anos, para aposentar pelo INPS, com um salário mínimo. Isto me apaixona…
De gratificante, o que é que a senhora recebeu?
O que sobrou para mim e que é muito gratificante é a distinção, a atenção, a delicadeza e a bondade de meus ex-alunos para comigo.
A senhora já recebeu alguma homenagem ou alguma honraria, do povo ou dos órgãos públicos?
Quando eu me aposentei, recebi uma homenagem da Associação Médica, que era presidida pelo Dr. Paulo Amorim, que me alegrou muito. Ofereceram-me uma festa muito bonita e os filhos do Dr. Paulo me entregaram um lindo bouquê de flores. Recebi esta placa que tem os seguintes dizeres:
“À Dona Madalena, modelo de professora, com o respeito e a admiração da Associação Médica de Patos de Minas”.
Outubro – 1973”
A senhora poderia mencionar os nomes dos alunos das últimas turmas da Escola, em 1973?
Da ata de promoção de 28 de dezembro de 1973, constam os seguintes nomes dos alunos promovidos:
Do 1.º para o 2.º ano: Sueli Tavares Gontijo, Kennedy José de Lima, Carlos Antônio Batista, José Roberto da Silva, Geraldo Rodrigues Lacerda, Helder Caixeta Borges e João Batista da Fonseca.
O 2.º ano não funcionou em 1973.
Do 3.º para o 4.º ano: Flávia Oliveira Caixeta, Sônia Tavares Gontijo, Maria Lúcia Caixeta, Braulinia Bontempo, Rogério Sieira Boaventura.
Concluintes do 4.º ano: Maria Cristina Caixeta, Ana Maria Oliveira Caixeta, Raquel Borges Nascentes, Márcia Peres Fagundes, Tânia Maria Caixeta, Ricardo de Souza Silveira, João Luiz Brandão de Morais, Tarcísio Caixeta de Melo Ferreira, Edvaldo Pereira Saldanha, Meyer Flávio Fernandes.
A senhora acha que valeu a pena?
Valeu, principalmente pela estima que os ex-alunos me dedicam.
A senhora acha que havia maior interesse dos alunos pelas aulas nos anos anteriores?
Sem dúvida nenhuma. Eles se interessavam muito mais do que os últimos, que eram muito afetados pela influência do futebol, da televisão e de outras coisas.
E a disciplina e o respeito caiu muito nos últimos anos?
A educação vindo do lar era muito patente até lá pelo ano de 1966 mais ou menos. Depois a meninada foi ficando impossível, talvez pela influência da televisão e pelo desinteresse dos pais, na educação dos próprios filhos.
A senhora é professora do tempo da palmatória. A senhora chegou a usá-la?
Palmatória não; mas eu era brava mesmo e impunha respeito, pela minha energia.
A senhora poderia mencionar algum fato pitoresco, que tenha marcado sua carreira?
Uma senhora trouxe um filho dela para cá, que estava no “Marcolino” há cinco anos e não lia nada. Ela me disse: “coisa triste é a gente ter dinheiro e ter um filho que não sabe ler”, e concluiu “eu lhe dou um presente se a senhora conseguir fazer com que ele leia”. Eu disse que não queria presente, pois isto era o meu dever e passei a trabalhar com ele individualmente, em uma sala separada, durante uma hora, todos os dias. No fim do ano ele lia corretamente e passou para o 2.º ano. A mãe veio e me disse: “graças ao Tadeu e a mim também que dei ‘um murro’ este ano e a São Geraldo com quem eu me peguei, ele aprendeu a ler”. E eu disse: “você deveria ter pego há mais tempo”.
Se a senhora desejar valer-se da oportunidade para enviar uma mensagem aos seus inúmeros ex-alunos, que por certo, irão ler esta entrevista, é com prazer que nós a registraremos.
Vislumbrando os meus tempos idos na velha Escola “Madalena Maria”, rendo a você, querido ex-aluno numa aquiescência toda gentil dos editores da Revista “A Debulha”, a minha simples, porém, sincera homenagem.
Com saudades envio-lhe a minha saudação e a minha homenagem de otimismo e fé.
Onde quer que você esteja, ocupando posições humildes ou altos postos, ganhando pequenos salários ou altos vencimentos, não importa. O que importa saber é que você ainda se recorda de sua velha mestra, de sua antiga escola, de sua primeira professora, pois ela ainda o acompanha, cheia de orgulho e de entusiasmo, pela vida afora. Ela ainda se recorda com carinho de você, de sua fisionomia jovem e alegre, na sua pequenês, na sua inocência de criança.
Ela se recorda de você, e quando o vê de cabelos já grisalhos e rugas no rosto ela o transforma na criança levada e irrequieta de suas primeiras lições. Você foi o enfeite da minha vida…
E ao longo dos meus 40 anos de magistério, revejo, emocionada, horizontes pontilhados de suas traquinices no horário do recreio, de suas espertezas na hora das provas, de seus embaraços nas leituras, de seus “apertos” na hora das tabuadas e conjugação de verbos.
Embargo-me a voz ao relembrar-me de você, querido ex-aluno, que nos precedeu na eternidade. Junto do Eterno Pai, interceda pela sua ex-diretora, ex-professora e por seus ex-colegas.
Envio a você, meu caro ex-aluno, que está lendo as páginas da nossa magnífica “A Debulha”, o meu abraço, cheio de carinho, de entusiasmo e de imorredoura saudade.
A senhora tem qualquer coisa mais a dizer?
Fiquei muito satisfeita com a visita e a atenção de vocês em terem se lembrado de mim. Isto foi para mim uma honra muito grande. Faço votos de que A DEBULHA faça muito sucesso e que vocês sejam muito felizes em seu trabalho.
NOTA: Magdalena Maria de Mello (grafia correta) faleceu em 16 de novembro de 1992.
* Fonte: Entrevista de Dirceu Deocleciano Pacheco e João Marcos Pacheco publicada na coluna Os Que Fazem a Nossa Terra da edição n.º 70 de 15 de junho de 1983 da revista A Debulha, do arquivo do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPH) do Unipam.
* Foto 1: Arquivo de Sebastião Cordeiro de Queiroz.
* Fotos 2 e 3: A Debulha.