TEXTO: NEWTON FERREIRA DA SILVA MACIEL
O episódio aqui relacionado ocorreu na terceira década do século XX, em nossa cidade de Patos. É verdadeiro, mas, por motivos óbvios, omitirei os nomes das pessoas citadas. A educação, quando se tratava de curso mais elevado do que o primário, era privilégio das famílias de classe mais abastada. Pode-se afirmar, com segurança, que nesta ocasião não havia mais do que dez pessoas formadas em curso superior no município. Exatamente neste período apareceu em nossa cidade, proveniente do oeste de Minas Gerais, um professor para o único grupo escolar então existente. O mestre mencionado possuía o verbo fácil, o indispensável conhecimento da matéria que lecionava e muito boa aparência. Durante poucos meses que aqui exercia a sua profissão, conquistou a todos ao demonstrar habilidade e sabedoria. Como eram escassos os habitantes, o professor ficou conhecido pela sua desenvoltura profissional. Solteiro, ao frequentar a missa na igrejinha da cidade viu, pela primeira vez, uma adolescente que o encantou. Alta, corpo esguio, olhos claros e, além de tudo, muito expansiva, a moça, descendente de famílias tradicionais patenses causou-lhe um enorme frisson. Foi paixão à primeira vista e, devidamente correspondida. Decorrido um ano de namoro à distância teve o professor a coragem suficiente para solicitar ao pai da garota a devida autorização para iniciar o namoro, oficialmente. Não obstante o seu notório desembaraço perante os alunos e colegas, o mestre escolar não se sentiu à vontade ao conversar com o progenitor da namorada. A resposta do pai foi categórica:
– Só autorizo o namoro de minhas filhas se os pretendentes forem doutores (formados em curso superior).
Humilhado, o docente abaixou a cabeça e se retirou em seguida, em silêncio sepulcral. Pensou mesmo em desistir de sua intenção. Passou dias matutando sobre a providência a tomar, pois a sua paixão era contumaz. Enfim, teve uma ideia que lhe pareceu conveniente: pedir o auxílio de uma pessoa que fosse amiga do pai da namorada com a finalidade de convencê-lo de que o aspirante possuía ótimas qualidades, apesar de não ter concluído todos os estudos.
Se bem pensou, melhor agiu. Procurou o educador um advogado, seu amigo, muito conhecido na cidade e de excelente comunicação oral. Tão logo houve possibilidade, o advogado conversou com o pai da pretendente e, com o uso de muitos argumentos persuasivos conseguiu o intento. O assunto principal foi que, na realidade, o pretenso namorado era doutor. Sim, Doutor em latim, matéria então usada no currículo escolar, que proporcionava a fama do professor por seus conhecimentos. Na realidade, eu conheci todas as personagens de tais acontecimentos e sei que houve o casamento, formou-se uma grande família e, como em um conto de fadas, foi um consórcio muito feliz…
* Foto: Portal.fenam2.org.br.