SUPERSTIÇÃO DO PLÍNIO, A

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O jogo era esperado com ansiedade pelos atletas e pela torcida. Acostumado a vencer facilmente seus adversários, o escrete azul da URT vinha de três empates seguidos. Quando adentraram ao gramado do Estádio Zama Maciel naquela tarde de 28 de março de 1960 para enfrentarem o Araxá pelo Campeonato do Triângulo Mineiro/Alto Paranaíba, os jogadores estavam tranquilos, mas a torcida, por causa de alguns desfalques, estava ansiosa. O primeiro tempo foi duríssimo, um 0 x 0 de mexer com os nervos do mais calmo torcedor.

Como teve a camisa rasgada, e como naquele tempo uniforme era único, o goleiro Plínio encontrou num canto do vestiário uma esgarçada e fedorenta camisa há muito tempo esquecida no local. Voltou para o segundo tempo com ela mesma. E que show do time. O resultado final de 3 x 0 não exprimiu a realidade do jogo, que era para ser uma estrondosa goleada. Com sua característica superstição, Plínio era todo alegria:

– Essa camisa fedorenta não deixou a gente perder a invencibilidade, é um sinal. A partir de hoje, só vou usar essa camisa e nunca vou lavá-la para que a gente não perca uma única partida esse ano.

E assim foi e, se foi por causa da interferência da camisa ou não, o fato é que a URT manteve a invencibilidade, chegando a vencer dez jogos seguidos, com apresentações espetaculares de todo o escrete e o Plínio fazendo defesas espetaculares. Entretanto, durante essa trajetória, a bendita camisa aborreceu todos os outros jogadores por um nada pequeno detalhe: catinga. A cada jogo, quando o Plínio abria seu armário e dela retirava a fatídica camisa, um odor nauseabundo se espalhava pelo acanhado espaço, fruto da original inhaca somada aos inúmeros suores do glorioso goleiro após tantas partidas. O primeiro a chiar foi o Fernando Dannemann:

– Tem dó, Plínio, pelamordedeus, lava essa camisa.

Vinha logo o Manezinho Mendonça:

– Ô Plínio, até lá no campo nos falta ar quando estamos perto de você.

O Garrincha era mais comedido, apoiado pelo Gorila:

– Plínio, só molha ela e deixa secar.

O Vado era enfático:

– Bobice essa de ser a camisa que está fazendo a gente ganhar, pois a gente já vem ganhando há muito tempo sem essa camisa.

Mas nada, absolutamente nada fazia o Plínio lavar a camisa. A turma, mesmo na boa vontade com o amigo, porque naqueles áureos tempos do nosso futebol os jogadores eram companheiros de longas jornadas e não de aluguel como hoje, resolveu, com apoio do presidente José Carvalho, dar um basta naquela inhaca e lavaram, e muito bem lavada, a rançosa camisa. Quando o goleiro ficou sabendo, todos esperavam uma revolta odiosa do companheiro. Mas eis que não, ele simplesmente deu de ombros dizendo:

– Huuuummmm, sei não…

A primeira partida pós-lavação da camisa aconteceu em 10 de julho, um amistoso contra o Araguari para comemorar o 21.º aniversário da Veterana. O time jogou muito mal e perdeu de dois a zero¹. Não foi tão trágico assim, pois foi a única derrota da URT no ano de 1960. Mas o Plínio, que não esteve presente nesse jogo, não deu o braço a torcer:

– Se não tivessem lavado a camisa o time terminaria o ano invicto!

* 1: Veja o time desse jogo em “URT 0 x 2 Araguari – 10/07/1960”.

* Texto: Eitel Teixeira Dannemann.

* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 28/02/2013 com o título “Prefeitura em 1916”.

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