ABUSOS DA POLÍCIA EM 1926

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TEXTO: JORNAL DE PATOS (1926)

De um mez a esta parte, quasi que diariamente nos chega a noticia de uma tropelia praticada pela força publica, sem que, ao que se saiba, seja tomada uma providencia energica contra semelhante estado de cousas.

Faz um mez, no maximo, que nos informaram que alguns moços desta cidade, quando passeiavam pelas ruas de nossa urbs, foram, sem o menor motivo, aggredidos por soldados do destacamento local e obrigados s se recolherem a seus lares, sem que para isso dessem causa, pois conforme fomos seientes eram moços de costumes morigerados e incapases de alterarem a ordem publica.

Pouco depois, no centro desta cidade, em um estabelecimento commercial, os mesmos heroes, de façanhas tantas, depois de espancarem um infeliz rapaz, dispara diversos tiros dentro do mesmo estabelecimento, não tendo, por uma felicidade independente de sua sanha, attingido o alvo visado.

O pobre Bahianinho, rapaz inoffensivo e doente, cujo estado causa commiseração a qualquer coração de superficial cordura, foi ha pouco espancado barbaramente.

Uma creança, filha do Snr. Onofre Gonçalves, ha poucos dias, estando nas visinhanças da cadeia local foi egualmente agredida e surrada por um dos soldados da força publica. Factos como estes, de verdadeira insubordinação e de tropelia continua, são relatados constantemente, constando que diariamente se dão nos suburbios da cidade, principalmente com as infelizes mulheres, cuja posição de afastamento do meio social coloca-nas sob a immediata influencia dos mantenedores da ordem, de nova especie.

Agora, mais um facto de gravidade extraordinária acaba de ferir nossos brios de cidadãos, e representa o retôrno aos tempos de selvageria em que cada um, para se garantir, precisava trazer um trabuco e um punhal.

Não nos contemos na indignação que nos revolta e em nome da sociedade patense appellamos para as autoridades superiores, para que ponham cobro ao estado de cousas da actualidade, trazendo a tranquilidade e o socego ao lar da nossa familia sobresaltada.

Relatemos o facto que tem revoluccionado o animo do nosso povo, justamente indignado:

Na noite de 10 do corrente, alguns soldados do destacamento local conduziam para a cadeia algumas infelizes mulheres pelo unico motivo de se acharem em uma confeitaria bebendo cerveja (o que faziam àlias sem alteração da ordem e sem incommodar o socego da visinhança), quando encontraram o Sr. João Potreira; este, vendo entre as detentas pessôa de suas relações interveio solicitando para ellas alguma benevolencia e mesmo, talvez, o relaxamento de sua detenção.

Reppelido pela patrulha a tiros de garrucha e browings ficou offendido recebendo, um tiro que interessou o mamellão esquerdo indo sahir na axilla do mesmo lado. Este facto desenrolou-se na rua Desembargador Frederico a mais central e mais movimentada, e, como era natural, levou aos assistentes a justa indignação, numa revolta muito natural contra seus autores, entregues de tempos a esta parte aos seus proprios instinctos, sem a menor cohibição por parte de seus superiores locaes.  Naturalmente revoltado deante do que acabava se assistir, o que qualquer experimentaria, o Cap. Joaquim Santanna¹, cidadão que frue o melhor conceito e gosa de estima geral pelos dotes de seu coração bondoso, sempre aberto na proteção aos seus humildes patricios, num impulso de indignação contra o acto de selvageria que acabava de assistir, chamou a attenção da força, fazendo-lhe ver que era uma arbitrariedade, um crime, um absurdo o que estava praticando, tentando assassinar em plena rua da cidade um cidadão!

Foi o bastante para que visse convergida contra si a sanha canibalesca dos soldados, sendo aggredido, espancado e covardemente atirado por terra, sem poder se defender, pois estava completamente desarmado!

A sociedade patense está presa da mais justa indignação contra oa suaores e responsaveis pelas tropelias que a força publica, em seu desenfreamento, vem commettendo nesta cidade e, tanto soube do desacato de que fora victima o Cap. Joaquim Santanna acorreu à sua residencia num movimento de protesto enérgico e veemente contra a aggressão de que fora victima.

Não queremos indagar si o Cap. Joaquim José de Santanna è ou não nosso correligionário e amigo; apenas cumprimos um dever de solidariedade social, de patricios e de cidadãos, como elle sujeitos a sermos victimas, à qualquer hora, da sanha incontida dos soldados desta terra, lavrando aqui o protesto vehemente de nossa indignação contra a inqualificável e revoltante aggressão de que foi victima.

Contra os desmandos que se commetteram em nosso meio, sejam elles contra A ou contra B, a nossa voz se farà ouvir sempre; e, quando cahirmos victimas das insuflações criminosas dos instigadores profissionais, havemos de levar o consolo do dever cumprido e os nossos sobreviventes que saibam cumprir egualmente seu dever, como nós vamos cumprindo o nosso.

* 1: Joaquim José de Santana Filho.

* Fonte: Edição de 17 de janeiro de 1926 do Jornal de Patos, do Laboratório de Ensino, Pesquisa e Extensão de História (LEPEH) do Unipam.

* Foto: Blogpautaaberta.blogspot.com.

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