Dizem alguns entendidos no assunto que o nosso vocabulário tem mais de 382 mil palavras. Outros não chegam a tanto, e afirmam que são por volta de 370 mil. E ainda tem uns que afirmam serem 500 mil. É fácil, então, perceber que temos nomes para praticamente tudo o que faz parte de nossas vidas. Mas… é, mas o grande problema é o tal complexo de vira-lata. Complexo de vira-lata? Sim, a mania do brasileiro de substituir o português pelo inglês, naquela de que fica mais chique. Tanto que já deveríamos oficializar o nome do nosso idioma: portuglês.
Nessa, está o jovem Alberto, primo do saudoso barbeiro Joãozinho. Alberto se lembra muito do parente e de sua barbearia numa loja do térreo da antiga residência de Afonso Queiroz, na Rua Major Gote. Se foi por isso ou não, o mancebo resolveu ser barbeiro, e para tanto, com apoio da família, fez curso e recebeu diploma do SENAC. A próxima etapa foi encontrar um ponto comercial no bairro onde reside, a Vila Garcia. Deu sorte, pois outro parente, proprietário de uma loja desocupada na Rua Mata dos Fernandes, quase esquina com a sua colega Ponto Chic, lhe alugou o imóvel por um precinho camarada. E o nome do negócio? Ora, adepto do portuglês, não deu outra: Barber Shop Albert!
Com seis meses de atividade, a Barber Shop Albert havia conseguido uma boa clientela. Numa certa manhã, chega um cliente especial: um padre da Igreja Nossa Senhora da Abadia. Logo, o pároco resolveu falar de Deus. E o Alberto declara:
– Desculpe padre, mas onde está Deus? A gente anda pela cidade e vê tanta gente ruim, crianças esmolando, bêbados, doentes morrendo por não conseguirem tratamento, tanta dor, tanto sofrimento, mata-se à toa por qualquer coisa. Por que, padre, Deus permite que o mundo seja assim tão odioso uns com os outros? É muito sofrimento. Onde está Deus, padre? Esse Deus que o senhor propaga pra mim não existe!
Enquanto o Alberto terminava o corte de cabelo do padre, este pensava numa boa resposta. Na saída, a resposta veio:
– Prezado Alberto, para mim não existem barbeiros.
– Como não existem barbeiros, padre, olhe pra mim, um autêntico barbeiro bem à sua frente.
O padre apontou para um homem com barba por fazer e cabelo desgrenhado precisando de um trato e disse:
– Se existissem barbeiros, com certeza não existiriam homens como aquele.
– Ora, padre, nada a ver. Se aquele homem está daquele jeito é porque ele quer estar daquele jeito e por isso não procura um barbeiro como eu.
Com um sorriso de satisfação, o padre pousou a mão direita no ombro direito de Alberto e serenamente declarou:
– É isso mesmo Alberto, assim como muitas pessoas não te procuram, mesmo sabendo de sua existência, por opção delas, também muitas pessoas, mesmo sabendo da existência de Deus, não o procuram, por opção delas. Num bom português, dá para perceber porque acontece no mundo tudo aquilo de ruim que você destacou?
Será que o proprietário da Barber Chop Albert sacou?
Texto: Eitel Teixeira Dannemann.
* Foto: Montagem de Eitel Teixeira Dannemann sobre foto publicada em 01/02/2013 com o título “Casa do Hugo – 1”.